02 agosto, 2007

O autista

Está quase. Para os mais inconformados com a silly season, o rola-a-bola é que é. Os relvados resplandecentes – bem, nem todos, devo admitir – a bola de couro – pese as paneleirices que o marketing vai fazendo ao sonho da nossa meninice – a rolar, com os jogadores a persegui-la – uns com melhor técnica, há que dizê-lo – e aí temos aquilo porque desesperávamos. Futebol a sério. Daquele que se joga dentro das quatro linhas. Os jogos à séria estão aí, quase a bater à porta. E existe momento mais sublime do que aquele que é retratado por Miguel Sousa Tavares, no seu livro “Não te deixarei morrer, David Crockett?”

Para quem não conhece, existe um capítulo chamado "vou levar o meu filho às Antas". Com o savior faire de sempre, MST brinda-nos com "a introdução do meu filho num dos rituais machistas lusitanos. O futebol. Um dia destes, pego nele e aí vamos nós a caminho do Santuário das Antas, do ronco do Dragão. Partiremos para as Antas, o último quilómetro feito a pé, por entre um delírio de azul-e-branco, verdadeiro deboche para um portista exilado em Lisboa...aí vamos nós, o coração descompassado ao ritmo do ruído surdo dos passos da multidão no cimento do Estádio...lá em baixo, o relvado, lindo, perfeito, parece esperar para ser pisado só por deuses, não por simples mortais. De repente, ele estremecerá, excitado e assustado, os olhos fixos na boca do túnel, pelo qual saem correndo, um a um, os onze deuses de azul e branco, saudados por um grito de cinquenta mil gargantas: Po-oo-orto! Po-oo-orto! Po-oo-orto!...este é o instante mágico, o instante iniciático, que sela para sempre o amor irracional entre um homem e um clube de futebol, um amor para a vida, que ninguém, jamais, poderá alterar. Enfim, uma paixão inexplicável."

Já li muita coisa, já me senti extasiado por palavras mas, confesso, nunca, ao ler MST, fiquei assim: arrepiado. Estão lá as emoções que eu sinto, carago! Aquelas ruas calcorreadas, vibrando antecipadamente com o ambiente, fluindo numa corrente humana, irmanada como num clã. Baixos e altos, gordos e magros, pobres e ricos, todos unos, na mesma paixão. E aquela emoção, ao entrar no Estádio, palco dos nossos sonhos, sentindo uma alegria incontida, quase reverencial, como se estivessemos num palco sagrado. Não é única? O coração que ribomba no peito, acelerando ao ver os nossos guerreiros a entrar em campo, ouvindo o rugido da multidão e, quase como num transe, gritarmos. Saltamos e abraçamos, rindo e chorando, quando a bola se anicha na rede. É mesmo uma paixão inexplicável. E vai começar tudo outra vez. 15 jogos da Superliga. O mesmo palco. A mesma emoção. A mesma crença.

O que se pode esperar nesta época que se avizinha? Mais do mesmo. O futebol português, e por contraponto os seus adeptos, aderiram já há vários anos à reciclagem. Vai daí, o entusiasmo é sempre o mesmo. Quer dizer, existem uns que se distinguem mais. Este ano então, com roupagens mais metrossexuais, ninguém os segura. Já devem ter percebido que estou a falar daquele clube execrável, o Calabote FC. Todos os anos, mas sem nenhuma excepção, é sempre a mesma coisa. O início de época recebido com gáudio, os reforços endeusados face às suas características técnicas, com nomes pronunciados de forma reverente, quase temerária, como se eles fossem lendas que não convêm beliscar. A excitação cresce à medida que ganham os jogos de pré-época. Escrevem-se artigos arrebatados nos jornais, pelos cronistas do costume. Ninguém os pára. Ele vai ser o campeonato, taça e, provavelmente, a Liga dos Campeões. Se a esta onda de enorme entusiasmo se seguirem duas ou três vitórias, o ânimo atinge um pico quase inultrapassável. O estádio enche, os cânticos tecem loas aos atletas. Os adeptos enchem-se de uma fé inabalável. E o Nuno Gomes volta a ser válido. Até à primeira derrota. Aí, quase como um balão furado, o gás esvai-se num instante. E assiste-se ao inverso. Como se uma sombra sinistra se abatesse sobre eles. O estádio fica deserto, abandonado por todos, excepto por meia dúzia de indefectíveis das claques, demasiado pedrados por substâncias snifadas para realmente se aperceberem do que quer que seja. Os restantes adeptos, descrentes, começarão a colocar tudo em causa – o treinador, o departamento médico, o director-desportivo, a mulher da limpeza, o avançado dos 10 milhões, o médio que não marca, o defesa que não corre – com o desespero a aumentar à medida do descalabro da equipa.

E aqui, também como sempre, entrará em cena, numa pose messiânica, o presidente dos ditos cujos, facilmente reconhecível por possuir uns apêndices na cabeça de um tamanho descomunal, rivalizando com o Dumbo. O discurso, já conhecido de outros anos, cheira a mofo. Versará sobre a grandeza da Instituição – assim mesmo, como ele trata o clube a que preside. Não lhe peçam é para escrever a palavra – e sobre a “verdade desportiva” e a “transparência”. Sempre com algum microfone por perto, diligentemente estendido por um jornalista pressuroso, gritará, naquele tom tonitruante, a verborreia do costume. Sempre senti, e tenho que confessar, uma pontinha de piedade por pessoas destas.

Clinicamente, chama-se autismo, em que o doente vive numa realidade só sua, incapaz de reconhecer aquela onde está inserido. Se não acreditam no que eu digo, atentem nas características da doença:

É uma alteração "cerebral" / "comportamental" que afecta a capacidade da pessoa comunicar, de estabelecer relacionamentos e de responder apropriadamente ao ambiente que a rodeia;
Por vezes ataca e fere outras pessoas mesmo que não existam motivos para isso;
Mutismo ou linguagem sem intenção comunicativa efectiva;
Linguagem correcta mas pedante, estereotipada;
Comunicação não verbal;
Voz monótona, pouca expressão facial, gestos inadequados Interacção social não recíproca, com falta de empatia.

Digam lá que, depois de lerem isto, não se fez luz – fónix...passe a expressão – no vosso cérebro. O mau humor, a agressividade, os discursos incompreensíveis, a repetição da mensagem, a incapacidade de lidar com o sucesso dos outros têm agora uma explicação científica. Mais do que qualquer outra coisa, temos que sentir piedade do indivíduo.

Como podem constatar, nada de novo se passará nesta época que se avizinha. No final, até se pode aplicar à realidade portuguesa uma célebre tirada de Gary Lineker, em que o avançado inglês tentava demonstrar a força do futebol teutónico, em tempos ido. “São 11 contra 11, e no fim ganha a Alemanha”. Neste cantinho à beira-mar plantado, acontece com enorme regularidade o mesmo. São, lá dentro, 11 contra 11, e no final ganha sempre o Porto. Por isso, quando notarem um acréscimo de notícias sobre o Apito Dourado, arbitragens, SEF, passaportes e afins, é bom prenúncio. Soltem uns HURRA’s bem audíveis. É sinal de que estamos na frente do Campeonato, a incomodar muita gente. E provavelmente com as faixas já encomendadas…

ps – [actualização] 18 aliados na divulgação do [CoNtRa dOSsiEr] "o apito Bermelho" com a colocação do banner respectivo nos seus espaços de discussão: Portistas de Bancada, Estádio do Dragão, O Gil, Dragalhadas do Dragão, Mundo Azul e Branco, Sangue Azul, Dragão Nortenho, Sou Portista com Orgulho, FC Mangalhões, DragãoPentaCampeão, Blog do Dragão Azul, Bi-Campeões do Mundo, Tapirus, Anti-Lampião, Roubos de FutebolTribunal do Futebol, BlogHistórias e AlfrodoSe estás interessado em aderir a esta causa em prol da 'honra e bom nome do FC Porto', solicita-nos por e-mail o código do banner.

pps – [actualização] 7 cérebros do photoshop a trabalhar no nosso concurso de ideias. Se te sentes também um «tecni-color do photoshop», solicita-nos por e-mail mais informações... e além do mais, o tempo é cada vez mais curto..

10 comentários:

  1. mais um excelente texto, e aquele excerto do MST, é verdade que mexe...

    Quanto à doença cerebral do autismo, outra verdade, mas é um autismo agravado:AUTISMUS AZIATICUS...reconhecível por um aumento do volume da mona, e uma maior produção de ácidos gástricos...LOL. trata-se uncamente com pastilhas RENNIEs

    um abraço

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  2. Noticia do jornal A Marca:

    Lucho Gonzalez no Real MAdrid por 25M €!.

    Jorge Mendes está em Portalegre a negociar o medio volante,Carlos Eduardo, do Gremio para o FC Porto. Assim se controi uma equipa Tricampeã.

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  3. Paulo não tinhas nada q trazer esse texto do MST para aqui, carago:) De facto as emoções relatadas são as q sinto sempre q lá vou...E depois, aqui no meu local de trabalho dei por mim a ter q disfarçar umas teimosas lágrimas q me caíram... Não havia necessidade. Qt ao texto, como habitualmente, soberbo. Abraço.

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  4. Este texto é do melhor q tenho lido, parabens!

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  5. Olá a todos,

    Confesso k hoje as notícias não me animaram por aí além. Vender o Lucho, mesmo por 25 M, parece-me mau negócio. Sim, eu sei k poderão argumentar com a fraca época realizada pelo argentino, pelo desgaste k os jogos na Selecção lhe provocam, com o facto de o Porto não ser detentor da totalidade do passe, etc, etc.
    Mas, quer queiramos ou não, apesar do congestionamento de médios na equipa, Lucho trazia algo mais a um plantel algo deficitário nesse aspecto: classe!
    O "fait-divers" dos últimos dias, com a rábula costumeira de adiar a viagem não prenunciava o melhor, mas mesmo assim, apesar de precavido, senti uma pontada de desilusão. A ser verdade a notícia...

    Quanto ao resto, agradeço, mais uma vez, os vossos elogios, mas limitei-me a transcrever a verdade: o Orelhas não engana, sofre mesmo de perturbações:)

    Um abraço a todos (em especial aos sortudos k se aprestam a ir de férias)

    Lucho, é um belo capítulo este do MST, não é? O homem tem o dom de colocar por palavras aquilo que sentimos...

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  6. Paulo, tu realmente... não há condições carago.
    Mas que fantástico texto, principalmente, a 'colagem' do capítulo do MST... simplesmente, arrepiante!!
    Cá o 'je', andou assim como o Lucho, entre um arrepio e uma lágrimazita... realmente, ser Portista é uma dádiva, carago! Só quem o é, consegue perceber este estado de alma!!
    Quanto ao Big Dumbo, chamo a isso um caso do foro clinico psiquiátrico... quem quiser, que o ature... dasse lá pró cromo!
    Sobre Lucho (o argentino), pronto, escusam de me bater, mas eu acho que é já, agora, na hora!! É que este ano, a ficar, o homem ia andar a passo de caracol, com todos aqueles musculos rasgados por 3 anos de futebol sem paragens... é a minha opinião, em prol do FC Porto financeiramente, porque em termos de jogador, não é preciso dizer muito mais que é de facto um jogador de TOP, com classe mundial... só que as pernas, mesmo aos 'priveligiados', não perdoam!! A ver vamos onde está a verdade e a mentira neste anúncio jornaleiro.
    aKeLe aBrAçO,
    http://bibo-porto-carago.blogspot.com/

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  7. Paulo, depois do fantástico "Pepe - O Caçador de Águias", este sublime e genialmente cáustico "O Austista". Fico estupefacto com a qualidade dos teus textos. É uma honra que tenhas sido dos primeiros a comentar no meu blog e que continues a deixar lá sempre a tua opinião. Pessoas com o teu talento engrandecem o nosso clube. Continua com essa inspiração azul e branca.

    Sobre o Lucho, espero que não saia por dinheiro nenhum, até porque só temos 50% do seu passe. Mas, não vai ser fácil, o empresário dele anda mortinho por mais uma comissãozita. Fará muita falta à equipa. Carlos Eduardo é muito bom jogador, mas não substitui o Lucho, de forma alguma.

    Grande abraço.

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  8. O que importa é que "são 11 contra 11, e no final venceos nós". Esse é o lema que os rivais já se aperceberam. Por isso, acredito neste plantel e nesta equipa. E sinto já saudade da competição a sério. Gostei de ler essa descrição, tal como ela é, da forma como os adversários encaram, todos os anos, a competição. Euforia desmedida - basta ver como é agora, com o Adu e mais uns quantos - que aumenta quando ganham alguns jogos e depois, com uma derrota, vem por aí abaixo.
    Ah, e parabéns pelos conhecimentos médicos:)
    Descobriste a maleita do Orelhas.

    Um abraço,

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  9. OLA AMIGOS BLUES;

    PARABENS PELO POST...SOBERBO...SE FOR VERDADE A NOTICIA DA VENDA DO LUCHO!!! PARABENS FC.PORTO!!! TEM O MEU TOTAL APOIO, SO LAMENTO NAO IR O RESTO DAS "VELHAS GUARDAS"...TA MAIS QUE PROVADO QUE PRO PORTO SER CAMPEAO A NIVEL NACIONAL NAO PRECISA DE CRAQUES...NAO VEJO CLUBES COM EQUIPAS A ALTURA PRA SEREM CAMPEÃS!!!!

    AQUELE ABRAÇO AMIGOS BLUES

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  10. BibóPorto Forever.
    os cães ladram,
    a caravana passa.
    os homens passam,
    o Clube fica.
    SEMPRE.
    já agora um bocado offtópic.
    reparem bem neste "realizador"
    (marido da outra)
    João Botelho frequentou o 5º ano do Curso de Engenharia Mecânica e posteriormente a Escola Superior de Cinema do Conservatório Nacional, tendo uma grande parte da sua formação cinematográfica sido fomentada no de Porto.

    É um dos mais versáteis profissionais de cinema portugueses, tendo realizado filmes de diferentes estilos e participado noutros como, montador.

    Começou a sua actividade com os documentários O Alto do Cobre (1976), Um Projecto de Educação Popular (1976) e Alexandre e Rosa (1978). A sua primeira longa-metragem, Conversa Acabada (1981), foi feita a partir da correspondência epistolar mantida entre os poetas Fernando Pessoa e Mário de Sá-Carneiro.(todos com 6 milhões de espectadores)

    Quatro anos depois é um dos primeiros cineastas a tratar a questão da Guerra Colonial num filme de fundo. Um Adeus Português.

    Em 1988 adapta à actualidade a obra Hard Times de Charles Dickens. Filmado a preto e branco, Tempos Difíceis aborda a industrialização na sociedade moderna e revela um rigor técnico que é uma das características da obra de João Botelho, que experimentará em 1992 o território do telefilme com No Dia dos Meus Anos, integrado na série "Os Quatro Elementos" da Rádio Televisão Portuguesa.(seis milhões de espectadores)

    Aqui na Terra (1993) é uma co-produção luso-britânica sobre os medos e fantasmas dum economista na crise dos quarenta anos. A versatilidade de João Botelho começa a tornar-se mais visível a partir de Três Palmeiras (1994), um conjunto de pequenas histórias ligadas integrado no projecto "Lisboa, 24 Horas" da programação do sector de cinema de Lisboa, Capital Europeia da Cultura 94.(seis milhões de espectadores)

    Tráfico (1998) é uma incursão desconcertante no âmbito da comédia, uma crítica à sociedade de consumo dos anos 90. Para celebrar os 25 anos decorridos sobre a Revolução de 25 de Abril de 1974 realiza o documentário Se a Memória Existe..., (seis milhões de espectadores)

    Um outro documentário, Mãos na Pedra, Olhos no Céu (2001) antecede a adaptação de "Frei Luís de Sousa", a peça clássica de Almeida Garrett, a que acrescenta um prólogo sobre D. Sebastião e o mito do sebastianismo. O título será Quem És Tu? (2001).será do benfica?)

    Em 2002 regressa à comédia com o que define como um "panfleto cómico": A Mulher Que Acreditava Ser Presidente do FCPORTO uma sátira ao poder exercido de forma incompetente por mulheres e homens.

    o texto é de morrer!

    portodocrime@blogspot.com

    VIVA O FCPORTO

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