09 dezembro, 2007

Futebol e Superstição

Antes do jogo Marselha - FC Porto, eu andava mesmo atribulado e encontrei uma Senhora com S Maiúsculo porque gosto muito dela, já é avó e percebe de futebol, que me disse que o Marselha ganharia ao Porto e logo respondi que "não" porque o Marselha é inferior ao Porto e que ademais estavam em plena mudança de treinador, pelo que não havia comparação possível entre o Porto e o Marselha.

Voltou responder-me que isso não tinha importância porque todas e todos estavam a rezar por Nossa Senhora das Graças que está bem lá em cima do rochedo bem em frente do velho Porto de Marselha... respondi-lhe que hoje em dia, o futebol era científico e que o se o FC Porto foi campeão em Viena em 1986, foi porque tinha tido um treinador, o Artur Jorge, que foi uns dos primeiros a utilizar as estatisticas e as matemáticas para elaborar um jogo e quando a ciência avança, a superstição recua e por aí adiante.

Como senti que não nos íamos entender, decidi falar de outra coisa porque sempre me ensinaram a respeitar as avós, mas só que durante o jogo não pude deixar de pensar na conversa da tarde com a avó porque vi a bola duas vezes seguidas bater no poste e perguntei-me se ali não havia protecção mais que desleal às redes do Marselha e se calhar, pensas tu que eu estou xê-xê ou que matutei demais para estar a escrever tamanha literatura.

Olha que não, olha que não, porque o Mais Velho lá da rua grande do meu bairro no coração do Porto não parava de contar histórias sobre as Antas, e que se o Nóbrega tinha falhado um penálti contra a Académica num jogo decisivo, era porque as Antas são Antas e um estádio construido em cima de sepulturas pré históricas sem contar com as almas vindas do fim do mundo que não gostam de ser pisadas e porque aspiram ao conforto após tantos anos de sossego não dá, porque não se pode correr em cima das almas, mesmo se o relvaldo é fofo.

Mas felizmente que o Mais Meio Velho lá da rua grande do meu bairro no coração do Porto contava que não era bem assim que e que haveria um dia de vir um sábio que saberia seduzir as almas das Antas e encontrara a boa música e o bom futebol porque nós éramos do Porto de Portogal, que descobriu almas e mundos, e que a História estava escrita.

E, como continuas a pensar que estou mesmo xê-xê, então lê bem o que te vou dar a ler. É um grande privilégio e que te sirva de lição:

“Recebi na antevéspera do jogo de quarta-feira entre brasileiros e chilenos uma telefonada, que era, vejam só, de uma freira, minha conhecida, e, quando pensei que ela ia falar-me de religião, falou-me foi de futebol, é verdade, mas misturado com religião. Em suma, o que ela queria é que eu escrevesse uma espécie de oração em verso a “Nossa Senhora das Graças” para que ajudasse os jogadores da selecção brasileira a derrotar os chilenos. “Nossa Senhora das Graças”, explicou-me ela, “é representada com os pés postos sobre uma bola que é o mundo. Esse detalhe, pode fornecer-lhe a imagem para escrever uma bela prece” – grande freira, que já foi missionária na China! – prometi à freira fazê-lo. Cheguei até a pôr a folha de papel na máquina, cheguei até a começar o poema-prece: “Nossa Senhora das Graças, Que tendes os pés sobre a bola do mundo, Eu, pecador, pobre de mim, Peço que os ponhas também na bola do campeonato, Quando os brasileiros avançarem com ela contra os chilenos...” Mas nesse momento a consciência me doeu : não era fair-play invocar o auxílio da Santa para o nosso quadro. Seria dopagem. Antes perder com honra do que vencer por graça da Senhora das Graças. Ganhar no esforço, ganhar no sangue, na fibra, na raça. Não rezei, e ganhamos aos chilenos, como espero que ganhemos dos checos. Com Pelé, ou sem Pelé! Com Garrincha, ou sem Garrincha!”. (1)

(1) : Este texto, praticamente desconhecido, é da autoria dum dos maiores vultos de sempre da literatura de expressão Portuguesa : Manuel Bandeira , in Música e Futebol.

Pois é !
E Viva o Porto !
PortoMaravilha

6 comentários:

  1. boas,

    nao acredito em Superstição no futebol e falo por expreencia propria, existe é trabalho e muito querer em conquitar algo....


    ps: a gravata vermelha......

    abraço

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  2. Grande Porto Maravilha,

    Belo texto (mais um) que é antes de mais uma revisitação do clássico tema da superstição no futebol, as crenças e mitos que se foram criando com o passar dos anos, numa prova intemporal de que, mesmo que a ciência avance, como dizes, também os rituais pagãos continuam de pedra e cal...

    Como dizem os espanhóis, "eu não acredito em bruxas, mas que as há, há!". Pode ser a gravata predilecta, como diz o Caxana, ou o entrar no Estádio sempre com o pé direito, ou as sapatilhas calçadas sempre que o clube do coração joga, mas todos nós (ou quase todos) temos as nossas superstições, numa esperança vã que os deuses da fortuna acompanhem as nossas preces, bafejando de sorte as nossas cores.

    Manuel Bandeira acha que isso é vencer com recursos a "substâncias proibidas". Que seja. Não abdico dos meus misticismos:)

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  3. Essa história do Nóbrega lembra-me que não vi esse jogo pois estava de ... castigo. O estudo não era muito, era só futebol e assim o pior que me podiam fazer era suspender-me de ver os jogos.
    Má nota a Matemática? 2 jogos sem ir às Antas... Terrível ...
    E nesse todos foram para o Estádio e lá fiquei com equações para fazer mas com o rádio ligado. E lembro-me bem da frustração desse momento em que o Nóbrega, dos melhores extremos que vi jogar e o favorito do meu avô, falhou.
    Quanto a superstições tenho algumas poucas, tinha mais quando era atleta e nos Nacionais corria sempre com o mesmo equipamento, guardado para essas ocasiões expressamente.Manias...

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  4. Viva !

    Jorge Aragão, obrigado pela memória.

    Eu fui ver esse jogo às Antas. Era bem criança. Mas já era sócio. O cobrador passava sempre lá em casa. Lembro que o sol estava quente. Estava numa das superiores. O Sol estava por detrás de nós. Mesmo que me fizeram um chapéu com um lenço para me protegerem a cabeça o que me desagradou porque me deram a entender que era ainda meninice. Só agora compreendo esse gesto bonito e humano. O que vi foi o remate do Nóbrega ir para um lado e o guardião ir para o outro lado. E a bola a não acertar nas redes. Como se tudo fosse ao relanti. O que é extraordinário é que ninguém o assobiou. Isso marcou-me muito !
    Todos falavam da maldição. E só falavam das Antas e porquê um estádio em cima das almas ?!

    Jorge Aragão, o teu avô tinha razão. Desde então nunca vi um extremo tão ágil e senhor de si como o Nóbrega. Mas talvez esteja a ser parcial !

    E Viva o Porto !

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  5. PortoMaravilha, eu sou como São Tomé: "só vendo, acredito", ate lá, tudo para mim é obra do acaso... pois caso contrário, não consigo entender como esses 'sábios da visão futura', não há forma de acertarem todas as semanas no totoloto.

    Por isso, tudo tem um explicação real... o resto, são fait-divers para entreter.

    aKeLe aBrAçO,

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  6. Viva !

    Tá Feito com ou sem superstição !

    O Porto ganhou 2-0 !

    E Viva o Porto !

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