Publicado em 2006 , “Football et Mondialisation” (1), é uma obra indispensável para quem gosta e quer pensar o futebol actual. Este livro, escrito por Pascal Boniface, permite uma reflexão importante. O autor é director do “Institut de Relations Internationales et Stratégiques”.
Este eminente especialista de relações internacionais defende o futebol. A publicação do seu livro, conseguida não sem custo, desencadeou a fúria teórica daquelas e daqueles que pregam que “o futebol é o ópio do povo”. Ao que Pascal Boniface responde: “É melhor um Mundial que uma guerra mundial!“.
O nosso autor parte do seguinte postulado: é possível aplicar ao futebol as mesmas grelhas de leitura que aquelas que, habitualmente, são utilizadas no estudo das relações internacionais?
Uma vez esta premissa levantada, Pascal Boniface coloca o dedo na ferida: o futebol favoriza a paz, a fraternidade ou, ao contrário, concorre para a guerra, a violência?
Há quem escreva, diariamente, que o futebol alimenta os nacionalismos, o ódio racial, o sexismo, etc. Pascal Boniface propõe uma leitura diferente. O futebol , só por si, não é um desporto racista. Acolhe racistas, não por essência, mas porque é um desporto que reune e federa. O futebol não mais faz que espelhar a sociedade. Por exemplo, aquando do último Mundial, abriu-se, em Berlim, uma enorme “casa de prostituição”. E, logo, acusou-se o futebol de favorecer a prostituição. Foi um debate mal orientado. Esse tipo de casas já existia muito antes do Mundial. Ou seja, não é o lenço quem faz as lágrimas!
O futebol é um fenómeno planetário. Todavia, neste âmbito, apresenta um paradoxo. A mundialização ocasiona a perda de referências identitárias. Em contrapartida, o futebol assegura a continuidade e a transmissão dessas mesmas referências. A lista das trinta e duas selecções, presentes no último Mundial, não foram representativas da situação do Mundo. Como explicar a ausência de gigantes como a China ou a Índia? Como explicar a falta de peso dos Estados Unidos na competição?
A FIFA tem mais membros que a ONU (207 e 191, respectivamente, salvo erro meu ). A Grande Bretanha só tem um representante na ONU , mas tem quatro na FIFA. Tal como a ONU, a FIFA não pode impor os seus pontos de vista. Em contrapartida, tem maiores poderes. Isto é, o poder de proibir ou não a participação nas suas competições. Veja-se o exemplo da África do Sul durante a apartheid.
Condenar o futebol em bloco por causa dos seus execessos é autorizar , por analogia, a condenar a medicina por causa de excessos de maus diagnósticos. Mas precisamos todas e todos de médicas e de médicos. Mesmo se, daqui a um século, viermos a saber que a receita era contra-indicada. Com efeito, há dois séculos o café era indicado para as doenças do coração. Condenar o futebol é, principalmente, ostentar desprezo pela cultura popular! É desprezar as formas de sociabilidade popular! É desprezar a festa! É desprezar e ignorar as emoções colectivas que desentronizam o rei e o peso do quotidiano. Que programa tão sinistro!
A visão reductora de muitos analistas (conheço alguns de boa fé) assenta num profundo desconhecimento profundo das claques e do público desportivo. Pensar que um amante ou uma amante de futebol não tem espírito crítico, é um absurdo. Quantas vezes o apoio a um clube não se desdobrou e não se desdobra em reinvindicações socias e económicas extra-desportivas?
Se é verdade que no mundo do futebol nem tudo é branco como neve, não deixa de ser indiscutível que o futebol gera fraternidade. O futebol é o melhor assunto que permite criar relações, com homem ou mulher, por esse mundo fora. Quem não conhece Pelé, Zidane, Cristiano Ronaldo ou Madjer?
Graças ao futebol, aprendemos que outrém existe e que, esse mesmo outrém, pode ser simpático e interessante. É mais fácil organizar um jogo de futebol entre o Irão e os Estados Unidos (1998) que um encontro entre chefes de estado. O futebol promoveu mais a cooperação entre a Coreia e o Japão que qualquer outra iniciativa. Existem bem mais exemplos.
As Grandes Descobertas autorizaram o Homem a se pensar no Mundo. As caravelas, impulsadas pela escola de Sagres, permitiram o contacto entre mundos e civilizações diferentes. Foi o prenúncio da mundialização!
Não creio que seja errado, seguindo a grelha de leitura de Pascal Boniface, pensar que a vitória do FC Porto em Viena, em 1987, anunciou e simbolizou o nascimento duma nova era no futebol. Na altura, escreveu-se muito àcerca da vitória do futebol de ataque: a vitória do 3-4-3 sobre um futebol defensivo e conservador que não autorizava golos. Havia uma década que uma final da Liga dos Campeões não conhecia tantos golos.
Em contrapartida, creio que, mas posso me enganar, ficou no esquecimento o seguinte: nessa mesma final, o FC Porto condensou o saber fazer de três continentes contra o saber fazer de um só continente. A vitória do Porto advinhou, na área desportiva e não só, o porvir da Aldeia Global. Pela primeira vez, na história do futebol europeu, um jogador Africano sagrou-se Campeão Europeu. Poderiamos também pensar nas meias-finais. A queda do Dínamo de Kiev (4-2 no total) não é mais que o anúncio da queda do muro de Berlim. Uma concepção dum mundo estático contra uma concepção dum mundo aberto e, logo, em movimento.
Tal como as Caravelas que, no passado, aproximaram homens, mulheres e continentes, o FC Porto foi, no futebol, pioneiro.
E Viva o Porto !
(1) “Football et mondialisation” , Pascal Boniface, éditions Armand Colin
Porto maravilha:
ResponderEliminarBela crónica. Estou de acordo q o fenómeno futebol tem uma importância planetária e de aproximação dos povos. Que outro fenómeno conseguiria por exemplo numa final da champions league ou dum c.mundo ter em todos os Países a audiência quase total das tvs?
E qt ao Porto de Viena iniciou uma nova era sim. A minha era de total dedicação a este clube:)
Ontem estive a ver o nosso andebol, ganhamos ao Madeira Sad por 39-27 e estamos na final four da taça a 17 E 18 MAIO em Guimarães
ResponderEliminarRESULTADOS DE ONTEM, COMPAREM:)
ANDEBOL:
PORTO-39-MADEIRA-27
ABC-25-SLBenfica-24
FUTEBOL
(INÍCIO FASE FINAL JUNIORES A)
porto-3-leixões-0
sporting-2-benfica-1
Uns sempre a ganhar e outros sempre a perder:))
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderEliminarMundializado, mesmo!
ResponderEliminarFaço minhas as palavras do Jesualdo : o Porto não se pode ficar só pela Taça e pelo Campeonato.
A analogia entre futebol e política está excelente.
Enquanto aluna de Relações Internacionais, este teria sido um excelente tema de seminário...
Para manter esta aura de grande clube Mundial, não podemos continuar a ficar pelos oitavos de final da C.League.Mesmo não tendo 60 milhões para gastar-agora tenho de me rir-temos de dar um passo maior para a Europa.É esse o desafio que se coloca ao F.C.Porto no futuro.
ResponderEliminarUm abraço
Já cá passo para opinar sobre o artigo, mas para já fica o resultado do basquetebol, acabadinho à minutos:
ResponderEliminarADV, 79 - FCP,86
Estamos na FINAL!:)
Porto Maravilha!
ResponderEliminarNem mais. O futebol, desporto-rei como o conhecemos, poderá muito bem ser a base do equilibrio civilizacional no Mundo moderno, cada ez mais crispado e intolerante...
Tal como demonstras, o pontapé na bola actual atingiu uma dimensão planetária, convergente, unindo povos e culturas díspares, enlaçando credos e raças antagónicas...
Quem sabe não poderá estar aqui, no jogo que adoramos, a semente de um Mundo mais tolerante?
PortoMaravilha, não podia estar mais de acordo... o futebol, ou se quisermos, o desporto em geral, quando de «bem», é uma coisa fantástica.
ResponderEliminarQue outra situação, permitiria uma congregação de tantos credos ou religiões, em prol d'uma côr, d'um clube, d'uma nação?
O desporto é isto mesmo... sem tirar, nem pôr!
Bom post... parabéns.
Lucho e Paulo Pereira,
ResponderEliminarObrigadaço pelas dicas das ditas amadoras... sempre na crista da onda... ou seja, de vitória em vitória até à glória final!