O meu coração só tem duas cores

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Não tenho um segundo clube, não sou capaz festejar um golo, uma vitória, uma conquista de qualquer outra equipa, seja ela o Progresso, o emblema maior da freguesia onde vivo, seja ela a selecção nacional, aquela que a comunicação social insiste em dizer que é de todos nós, mas que aos meus olhos tem tanta importância quanto a do estado de saúde do Eusébio. Como disse um dia o nosso eterno capitão, “o meu coração só tem duas cores, azul e branco”.

Não gosto da selecção nacional. Ponto final. Nunca fui patriótico e, confesso, o orgulho que sinto em ser portista e portuense é incomparavelmente maior do que aquele que tenho em ser português. Símbolo do centralismo repugnante que enferma este país, a selecção nunca despertou em mim, de facto, outra coisa senão indiferença. É um sentimento quase hostil, aliás, que me acompanha desde puto, desde que ficava um mês sem ver o meu pai que, por motivos profissionais, tinha que acompanhar a aquela equipa que veste de vermelho – lá está outra razão para esta minha antipatia… – no Europeu ou no Mundial.

Cresci, portanto, a ver a selecção quase com os mesmos olhos com que vejo os dois clubes da capital. Como poderia eu festejar uma defesa do Ricardo, um golo do Rui Bosta, do João Vieira Pinto ou do Cristiano Ronaldo se sempre os encarei como adversários? Como poderia eu aplaudir uma equipa que teve como treinador um execrável brasileiro que sempre hostilizou o nosso clube?

A minha relação com a selecção piorou, de facto, desde que chegou aquele tipo que um dia numa conferência de imprensa perguntou “e o burro sou eu?” e cuja resposta imediata deveria ter sido peremptoriamente afirmativa por quem lá estava presente. Sim, burro, porque conseguiu o feito de perder um Europeu em casa, contra a Grécia. Burro, sim, porque numa óbvia estratégia de afirmação pessoal, colocando os interesses pessoais acima dos interesses da equipa, decidiu não convocar para esse campeonato o melhor guarda-redes português naquele ano eleito o melhor da Europa. Burro, sim, porque só depois de perder o primeiro jogo, no Dragão, frente à Grécia, percebeu que a equipa base que acabava de ser campeã europeia de clubes tinha que ser titular. E não o condeno, porque era-me igual ao litro se ganhassem, perdesse ou empatassem. Tratava-sem apenas e só, de uma questão de justiça.

Festejar um golo de uma outra equipa trata-se, portanto, de uma violação brutal da minha consciência. Mas na final do Euro 2004, admito, abri uma excepção. É verdade, Pinto da Costa não foi mesmo o único português a saltar da cadeira quando o Caristheas marcou no galinheiro. Perdoem-me, senhores, mas, afinal, eles até são azuis e brancos…