Caro Iker,
Tu, que já ganhaste tudo o que havia para ganhar, que és um dos guarda-redes mais emblemáticos e históricos do futebol, que já foste campeão do mundo, que foste campeão europeu mais do que uma vez, és hoje atleta, embaixador, cidadão e adepto do Porto. Da cidade e do clube. És um dos nossos, dragão.
Vieste sem grandes vedetismos, caprichos, manias. Tiveste várias contribuições e defesas decisivas, grandes exibições, e só é pena teres começado com planteis e equipas menos vitoriosas. Vieste para um clube ganhador numa das suas fases menos vitoriosas e mais difíceis dos últimos trinta anos. E mesmo assim persististe, continuaste, demonstraste sempre gratidão, vontade, orgulho. Mantiveste sempre uma relação saudável e exemplar com o clube e a cidade, e tornaste-te um dos maiores e melhores embaixadores que já tivemos por cá. Além disso, continuas a demonstrar algo que me fascina, algo em que a maior parte de nós se revê: odeias perder, fazes tudo para vencer, ages como se estivesses no inicio da carreira, como se tivesses ainda muito a provar. És um campeão, no campo e na vida. E és também um senhor, dentro e fora e dele. Desenganem-se todos aqueles que acham que isso é só um pormenor.
Porém, há uns dias levámos todos um grande susto. Tu e os teus mais próximos, acredito, ainda mais. Acredito que todos, mesmo todos, tu, família, amigos, adeptos, Nação Portista, e até comunidade do desporto em geral, percebemos que há vitórias muito mais importantes do que aquelas que se jogam dentro das quatro linhas. Sempre houve. É pena é que tenha de ser um susto destes a lembrar-nos disto, mas ao menos louvemos o facto de existirem valores superiores que permanecem. Em todo o lado, sublinhe-se.
Enfarte do miocárdio. Hein? Num atleta como tu, desportista, saudável, regularmente seguido e vigiado, em plena atividade? Pois, pode mesmo acontecer a qualquer um. Por menos sentido que isso faça. Valha-nos o desfecho do episódio: a boa notícia de que poderás ter uma vida (leia-se, junto dos teus mais próximos pelo menos) normal. Mereces, mereces muito poder também desfrutar de todo o teu percurso até aqui, e de tudo aquilo que quiseres mais – da cidade (do Porto, e de Madrid se quiseres muito), e do clube (do nosso Futebol Clube do Porto, e do teu de sempre Real Madrid, vá que não somos tão invejosos assim), e de tudo o que fizer mais sentido na vida.
Aquele minuto 1 do jogo em casa com o Aves em que o estádio se levanta a gritar por ti é emocionante. É emocionante porque ali ninguém estava preocupado na vertente desportiva da coisa, mas na tua vida e naquilo que ela representa para o clube e para este desporto em geral. Ali, existia algo acima do futebol, da rivalidade, do fanatismo. Foi uma espécie de celebração da vida, de confirmação de que estamos todos contigo, e de gratidão por teres escolhido a maravilhosa cidade do Porto e o mágico clube do Porto para prosseguir a tua carreira, e de celebração também por continuares por perto.
Sim, eu acredito que vais continuar por perto. Não faço ideia se a tua carreira “acabou” naquele treino, mas não é isso que nos interessa nesta altura. Interessa-nos muito mais que continues bem, saudável e feliz, por perto. Nem que seja na bancada a ver o jogo e a meter umas stories no Instagram a gozares com o Oliver ou outro que o mereça. E a torceres por nós, sempre.
Não deveria também ser preciso um susto deste tamanho para nos lembrarmos todos da dimensão do teu percurso, da tua figura. Aquele manancial de homenagens, palavras e votos, de clubes e seleções, treinadores e jogadores, presidentes e outros dirigentes, de ex-rivais, de ex-colegas, de adeptos, adolescentes, adultos e idosos, de atletas de outros desportos, de personalidades de outras indústrias, do “mundo em geral”, esmagou-nos. E deixou-nos também muito orgulho (desculpa o egoísmo, aqui), orgulho de seres um de nós!
Força, Iker! Vemo-nos por aí, em qualquer lado, em qualquer estádio. Sim, porque mesmo que o mais sensato venha a ser terminares a carreira, não te livrarás de ir à baliza mais uma vez (nem que seja mesmo só mais uma)… para in loco comprovares a gratidão e o orgulho que todos temos por ti. Nem que dês uma daquelas casas com que também já nos brindaste. Olha, e já agora… se puderes pedir alguma coisa à malta do balneário, pede-lhes para te agradecerem em campo nos três jogos que faltam. Não com três vitórias, mas com três valentes demonstrações de personalidade, determinação e carácter. Se lhe somarmos qualidade, ainda melhor. Isso sempre nos levou a bom Porto…
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