10 abril, 2008

O futuro é nosso...

Existem momentos ansiados ao longo da semana de trabalho. Momentos de pausa. De descompressão. Sentado no alpendre de casa, vendo os miúdos a brincarem, com as tropelias próprias da idade, no jardim, observo-os ternamente. Faço alguns exercícios mentais, abstraindo-me dos gritos felizes, dos risos doces…

Qualquer pai, em algum momento, já terá feito o mesmo. Fechado os olhos e sonhado. Com futuros risonhos para os seus rebentos. Amiúde dou por mim a imaginar como será…

Aquele dia, pelo qual anseio há tanto tempo, em que descerei a alameda, de mão dada à Filipa e ao Tomás. O Estádio do Dragão erguendo-se, imponente, com as suas linhas de enorme impacto arquitectónico. Quase consigo imaginar o deleite e o assombro a surgirem nos olhos deles. A boca da Filipa abrindo-se de espanto, ao ver ao vivo o templo que o pai já lhe mostrou, centenas de vezes, pelo ecrã da televisão. O Tomás, mais novo, apontando com o gesto do costume para aquela montanha de cimento e associando-a de imediato ao “Po’to”…

Fico arrepiado com estes sonhos premonitórios. É uma tarefa hercúlea, educar um filho. Quero ter sucesso. Conseguir ministrar-lhes os mandamentos éticos pelos quais se regerão, nas suas vidas…

Mas quero, acima de tudo, conseguir dizer-lhes o que me vai na alma. Mostrar-lhes o que significa pertencer a este clã. Ao Porto. E são tantas as coisas que lhes quero contar. Vitórias importantes, jogadores preciosos, datas históricas, emoções únicas, treinadores ímpares…

Mostrar-lhes que ser do Porto não é só vencer. É algo mais. Algo que nos faz suportar, por exemplo, penosos e sofridos 19 anos, sem soltar o grito que as novas gerações agora facilmente, num ritual anual, soltam: CAMPEÕES!

Sou um adepto de transição. Nascido para a paixão futebolística coincidente com o fim do enorme jejum de títulos, passei pelo ensino, habituado a ser um dos poucos que professava aquela religião. Outros tempos, onde se sentia na pele a raridade de ser portista, como se esta, em vez de uma bênção, fosse antes um estigma com o qual tivéssemos que viver eternamente…

Por isso sinto que este momento é especial. O Porto tem o futuro na mão. As novas gerações, ávidas de emoções fortes e vitórias sistemáticas, aparecem em massa nas imediações do Estádio. Miúdos franzinos, de passos titubeantes, mas já de personalidades vincadas, puxando os progenitores pelas mãos, sentindo que é ali, naquele Mundo, que eles pertencem. É uma mudança subtil, mas já visível. Cada vez mais os Dragões aumentam a sua força pelo País, ajudando a mudar mentalidades, subvertendo o status quo vigente…

Não me preocupa muito o futuro desportivo dos meus filhos. Nascido numa família de portistas convictos, assisti a todas as etapas evolutivas do clube. Sei que o ADN deles já tem esta marca. Serão portistas. Mais do que contar-lhes histórias, com protagonistas heróicos vestidos de azul e branco, desfiando proezas conseguidas em terras longínquas, resolvi adiar as lições por mais algum tempo…

Abri os cordões à bolsa. Antecipei a festa. E preparei a surpresa. No Sábado, acordando ansioso, sentindo já por antecipação a excitação de mais uma conquista, preparei meticulosamente os novos equipamentos, com os nomes deles estampados nas costas. Escondidos até à hora da verdade. E depois das explosões de alegria, já partilhadas com a Filipa, do irresistível poder de fogo que coloriu os céus do País de azul forte, chegou a hora. Do tirocínio. Cintos apertados, carro aprumado de azul e branco, bandeira desfraldada ao vento e uma imersão na loucura. A festa, insana por momentos, naquela glorificação da supremacia esmagadora de uma época, contagiou os sonolentos passageiros do banco de trás…

Foi como o despertar para um novo Mundo. A Filipa, olhos esbugalhados, procurando não perder pitada do que se passava, rosto branco colado ao vidro, acenava a todos os que no passeio vitoriavam a caravana. O Tomás, desperto por instantes do torpor causado pelo cansaço, teve o primeiro impacto do que acontece quando o coração não obedece a regras. Porque, por mais êxitos que o Porto coleccione, cada festa é um exemplar único de rara unidade. Merecem ser guardadas. Na memória. E foi vê-los, ávidos, olhando espantados para a folia que tomou conta de Aveiro, numa ruidosa mistura de buzinas, gritos de júbilo e alegria incontida.

E depois, o regresso a casa, com o trautear a sair constante dos lábios da minha filha. “Campeões, campeões, nós somos tri campeões…”

Cumpri mais uma etapa na educação deles. Fi-los sentir que somos únicos. Pertencemos a um grupo restrito de pessoas. A um clube GRANDE.

Alguém disse uma vez que os elogios, como todas as coisas verdadeiramente preciosas, devem o respectivo valor à sua escassez. Devem, por isso, ser guardados para ocasiões especiais. Esta é uma delas. Basta um singelo OBRIGADO. A todos os que contribuíram para mais esta imensa alegria. Jogadores, equipa técnica e Direcção. Os obreiros de um ano de glória.

ps - Passou como um meteoro pelo futebol português, mas deixou marca. Saído do jet-set, passeava-se pomposamente nas imediações de qualquer máquina fotográfica ou câmara de televisão. Fatos de fino corte, gravatas de seda e cabelo meticulosamente aparado, fizeram de Manuel Damásio uma espécie de nobre junto da imensa plebe que constituía a sua corte. Sem nada de marcante para figurar nas páginas da história, é lembrado nos tempos que correm por uma frase proferida, numa daquelas tiradas apologéticas habituais por aquelas bandas. “Somos a locomotiva da transparência do futebol português”. Lembrei-me dela quando vi Jorge Ribeiro avançar para marcar a grande penalidade, no recente Boavista-Benfica. A locomotiva voltou a apitar…

Depois de Makukula, o rapaz-nascido-no-Congo-e-que-não-queria-jogar-na-Selecção-mas-que-depois-mudou-de-ideias, ter intempestivamente desobedecido às ordens do treinador do Marítimo e resolvido marcar [e falhar] o penalty contra os encarnados, chegou a vez do irmão de Maniche. Entre ambos, imensos pontos em comum. Desde logo o facto de estarem nos planos de contratação do Benfica. Makukula teve o merecido prémio, semanas depois. Um contrato chorudo à sua espera. Jorge Ribeiro não deve fugir à regra. Claro que ambas as coisas não estão ligadas. Os falhanços de grandes penalidades cruciais não estão intrinsecamente unidos às suas contratações. Não. Como poderiam estar? Eles são a locomotiva da transparência do futebol português…

15 comentários:

  1. Eu sou um privilegiado: abro o computador venho aqui e enconto este belo naco de prosa, escrita com amor e paixão.
    O dia vai correr melhor!
    Um abraço e parabéns

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  2. A nossa vida enquanto adeptos do Futebol Clube do Porto é feita de momentos mágicos e únicos como estes. Eu já tive oportunidade de levar as minhas ao Dragão, e apesar de o resultado não ter sido a nosso favor (que pontaria a minha...) elas ADORARAM.
    Adoraram a envolvência do Estádio, a delicadeza de nos terem deixado passar à frente na fila para os bilhetes, os "mimos" para a mais pequena por ter ido de chupeta, o espanto de ambas quando os nossos vinham marcar canto e parecia quase que por magia que nos fitavam antes de colocar a bola, o Quaresma ter falhado um penaltie e de termos perdido, mas a satisfação de ouvir delas: "Mamã, o teu estádio é o mais lindo do Mundo!"
    E não estamos a falar de arquitectura, mas sim do ser-se Portista.
    A partir dai a eliminação passou para segundo plano, porque nada se compara a estar no Dragão de mão dada com a nossa razão de viver.

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  3. O que dizer desta crónica?

    SIMPLESMENTE MAGISTRAL.

    Paixão, amor, dedicação, ternura, está tudo nestas palavras ultilizadas pelo NOSSO Paulo Pereira.

    Não vou esconder q tive q limpar uma lágrima da cara.

    É um orgulho para mim escrever neste mesmo espaço onde nos presenteias com estas prosas únicas, sublimes e de total adoração ao Porto, desta vez complementada pelo teu amor paternal.

    Um abraço, grande Paulo.

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  4. Paulo, em duas palavras: SIMPLESMENTE FANTÁSTICA!

    E o ps, mordaz e objectivo. Aposto que se fosse no Porto, já estávamos a ser investigados por isso, mas felizmente nós não contratamos makukulas e como também não temos assim tantos penalties quanto isso pa desperdiçar...tss tss :P

    Beijinhos azuis e brancos da Ta_8

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  5. Boa tarde pessoal

    Foi algum de voces que almoçou com o Herminio, bem no centro da capital, num hotel famoso?

    Abraço a todos

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  6. Paulo, já todos por aqui há muito que sabiamos que tens «arte» pá escrita, o que ainda não sabiamos, é que tens um baita d'um jardim pá pequenada brincar lá em casa... olha a tua sorte ;)

    De facto, ao ler mais este teu testemunho de Pai para herdeiros, revi-me em cada bocadinho dessa história d'encantar... não vejo a hora de colocar a minha Leonor à prova e de traje à TRI-CAMPEÃO!! É que a dona lá de casa, ainda não me deixa, pq diz que tá muito frio lá fora ;)

    Ainda esta semana, com ela ao colo em frente ao portátil, ao rolar o vídeo do MrCosmos, ela estava assim que meio petrificada a olhar para o video, para o som que dali saia e olhava insistentemente para mim e para o portátil na procura de respostas?

    Eu? limitava-me a sorrir e a cantarolar as musicas que dali saiam e sempre a repetir a palavra mágica: POOOOOOORTO POOOOOORTO!!

    Como batias palmas com insistência a cada POOOORTO, percebi que a educação dela, está a ir no bom caminho... é só um pouco mais de AZUL E BRANCO e mai'nada!!

    Paulo, mais uma vez, parabéns!!!

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  7. Blue, que pai exemplar e babado, aposto que era assim que o meu pai ficava cada vez que os jogos do Porto passavam na tv em outros tempos!

    Por isso é que eu sou uma pessoa tão bem educadinha oube lá!:)

    ps. ja leram o Jogo? Vejam bem a nota que o Lucilinho levou pelo jogo de Domingo, quando o orelhas souber vai mas é chamar o FBI. ca ca ca XD

    Beijinhos azuis e brancos da Ta_8

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  8. Boa tarde pessoal

    Foi algum de voces que empurrou um jornalista da rtp????

    E que pegou no microfone e o atirou po chao????

    Sim... na mesma unidade hoteleira...

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  9. Mitico, acho que daqui ninguem, mas ouvi dizer que um tal de rui bosta passou de bosta a besta e decidiu começar a experimentar o seu poder de director desportivo antes de pendurar a chuteira. tss tss, ele devia era estar no box mes amis!

    Beijinhos azuis e brancos da Ta_8

    http://www.bullet-blue-sky.blogspot.com

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  10. Meus amigos, aquilo la por baixo esta mesmo mesmo mal...

    Estava eu ao telefone com uma amiga que mora em benfica e ela deu.me uma novidade das grandes!

    Entao como a casa dos fundidinhos agora parece que nunca enche, e os que la vao sao na sua maioria os senhores saudosistas, para ver se convenciam gente nova a ir à fossa da 2 ciurcular, andam a dar, e sim é mesmo DAR nao é vender a preço reduzido nem DAR na compra de kit, é DAR bilhetes de graça a pessoas com menos de 18 anos mediante mostra de BI.

    Ha quem seja desesperado, mas isto é o cumulo dos cumulos... Aquilo anda mesmo mal!

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  11. Viva !

    Bonito Texto .

    Agora, em tom de provocação mas também em tom de questionamento ( da minha parte sabes que não há ofensa ).

    Paulo Pereira, já que conseguiste le " Coup du Roi", como se dizia lá na corte de Luís XIV, não te esqueças também de mostrar à tua menina e menino a Avenida dos Aliados. E depois é levá-los até à Praça Central da cidade de Praga ( no meu tempo não era caro agora não sei )

    Eles sentir-se-ão em casa. Num universo totalmente Barroco.

    Melhor compreenderão porque a Invicta é universal !

    E Viva o Porto !

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  12. Para alguém que, como eu, adora ler, ama o FCPorto e é uma sonhadora :')
    uma palavra para este textão: FANTÁSTICO!

    à parte de feminismos, vem a lagriminha ao canto do olho * é sentido, é muito bem idealizado e até por isso, o próprio texto, tem alma. Alma draconiana.

    Perfeito *

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  13. Viva !

    Estilhaço, vai fazer em Julho três anos que não estive no Porto.

    Na altura ficámos duas semanas no centrum como dizem os Flamengos. Duas semanas culturais em que a minha filha andou pela primeira vez de táxi. Só para ver como andou o paternal a explicar isto e aquilo e o que ficou foi a viagem de táxi.

    Na altura já a Avenida andava em obras. Após a tua pergunta, fiquei questionado. Fui ver as fotos e acho que nada, fundamentalmente, mudou.

    Concordo com o projecto do Siza Vieira. Tinha razão de ser o calcário numa cidade por essência granítica ? Agora que a autarquia não saiba dar vida à sua sala de visitas isso é outra coisa.

    Mas continuo a pensar, assim o senti, que entre a Avenida ( agora ainda mais )e a praça central de Praga há realmente muito Barroco em comum !

    Ok ! Não falo mais de arquitectura !

    Para o ano, iremos, novamente, ao Porto !

    E Viva o Porto !

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  14. Mais uma obra do Paulo com inteligência e sentir .

    Em cheio !

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  15. Viva !

    Estilhaço obrigadão pelo link. Já conhecia algumas fotos outras não.

    Temos ( eu e família ) que voltar ao Porto, para o ano será, e espero que haja tempo para nos vermos. Seria uma prazer para mim.

    Continuo a pensar que o granítico não fica mal.

    Penso, segundo as fotos que vi, mas tenho que cheirar de perto a transformação, que nada impede à Câmara do Porto de pôr lá bancos de jardim, esplanadas, animações, etc. para que seja mais animado.

    A mim não me choca ver o granito presente. Não é a sina do Porto esse graníto com os seus sete rios subterraneos ?

    E olha que tal como está fica ainda bem mais parecida com a Praça de Praga. Quanto a mim !

    Sim aquela Avenida com as suas fachadas e o seu diambulatório é um hino ao Barroco ! Há que não a deixar morrer. Mas isso pertence, creio eu, à autarquia.

    Bom páro aqui porque se calhar ainda vais pensar que estou louquinho pela cidade em que nasci.

    Por exemplo, Lisboa, infelizmente devido ao tsunami do século XVIII, contrariamente à maioria das cidades Portuguesas deixou de ser Barroca.

    Ok : Não falo mais de arquitectura !

    Estilhaço, mais uma vez, Obrigadão !

    E Viva o Porto !

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