26 outubro, 2013

O Porto não é só bola

http://bibo-porto-carago.blogspot.pt/

Quinta-feira, 24 de Outubro de 2013, Estádio do Dragão. O relógio marca 21h30 e o início de mais uma Assembleia Geral. Estão presentes na sala cerca de meia centena de pessoas, pouco mais de 20 são sócios - num universo de mais de 108 mil, segundo dados do Relatório e Contas referente ao exercício de 2012/13. Uma pobreza franciscana, como diz o povo.

Ser sócio de um clube não é só ir aos jogos da equipa de futebol e das modalidades, ir para a festa quando somos campeões e dizer, aos quatro ventos, que somos portistas com muito orgulho. Ser sócio é também participar e envolver-se na vida activa do clube, saber em que estado se encontram as contas, que despesas são contraídas ou que receitas são geradas, por muito que não percebamos patavina de economia e finanças, de activos e passivos, provisões ou diferimentos e de todos os números que pululam nas páginas do relatório.

É, portanto, mais do que um direito, um dever de cada um nós, associados, participar nas assembleias-gerais. Mas também é um direito que todos sejamos antecipadamente informados da data da reunião. Não basta anunciá-la dois dias antes no site do clube e publicar a convocatória em dois dos jornais mais lidos na cidade com uma semana de antecedência. Por que não enviar uma carta a avisar os sócios, se nos mandam tantas a pedir para regularizar as quotas, quando as temos pagas até ao final do ano? Trata-se, tão-só, de uma questão de justiça, de democracia interna, de transparência para com aqueles que, no fundo, são o clube. O que se ganha com esta desinformação? Nada, apenas um distanciamento cada vez maior entre o clube e aqueles que lhe dão o sentido de existência.

A AG de ontem não teve apenas a particularidade de ter sido uma das menos, senão a menos participada de todas a que assisti nos últimos anos. Teve também a curiosidade de, pela primeira vez em muito tempo, as contas terem apresentado um resultado positivo, mas não terem sido aprovadas, como é tradição, por unanimidade e aclamação, à custa de uma mulher sócia que se absteve em tudo o que foi votado. O espanto foi geral na sala. Quem era aquela senhora que folheava furiosamente o Relatório e Contas e levantava o braço sempre que o presidente da Mesa, eterno Sardoeira Pinto, falava em abstenção durante a votação?

No momento de dar voz aos sócios, Maria Manuela Teles Menezes, com 63 respeitosos anos de sócia, lá se explicou, num discurso longo e confuso, por duas vezes interrompido pelo toque do telemóvel, o que gerou, como devem imaginar, mais umas gargalhadas silenciosas. Explicou, então, a senhora que se tinha abstido, porque não teve tempo de ler o relatório, mas que o objectivo primeiro da sua presença visava reivindicar o direito de ela própria poder votar sem ter de pagar a quota de “sócio efectivo”. Confuso? Não. É que à luz do artigo 31.º dos estatutos do clube, o direito de voto em Assembleias Gerais está apenas consagrado aos “sócios efectivos” e exclui os “sócios auxiliares” (senhoras e menores) aqueles que gozam de regalias no pagamento das quotas.

Confesso que desconhecia tal norma e compreendo que sócios com determinados privilégios não possam ter os mesmos direitos que gozam outros. Mas numa altura em que o clube ganha cada vez mais associadas femininas, devem os estatutos continuar a contemplar uma discriminação positiva do género, mesmo que isso implique perda de alguns direitos? O assunto deve, de facto, ser objecto de uma reflexão. Porque o Porto merece, porque o Porto não é só bola.

4 comentários:

  1. Meu caro,

    Subscrevo na integra!
    O desinteresse e distanciamento inequívoco dos associados perante a vida activa do clube, é de tal forma notória que o clube não pode ficar indiferente a esta situação, devendo como tal tentar tomar medidas no sentido de inverter esta tendência.

    Mas o extraordinário é que quando passamos os olhos pela net, há tanto portista conhecedor, que depois me pergunto se são meros cobardes ou se eles próprios não acreditam nas suas ideias....é falar para não estar calado!

    Quanto á associada em questão, foi um momento de certa forma hilariante, mas que merece toda a atenção, quanto mais não seja, pelos seus honradíssimos 63 anos de associativismo.
    Confesso que desconhecia a limitação, a qual poderá fazer algum sentido: não pagam a totalidade da quota, não têm a totalidade dos direitos.
    No entanto fiquei com a ideia clara de que a revisão dos estatutos deve estar para breve, e que esta situação irá ser devidamente revista.

    Um abraço!

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  2. Desconhecia esse estatuto mas é uma autêntica vergonha!

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  3. António Santos29 outubro, 2013

    Meu caro farpas, mais um excelente post. Parabéns! O nosso clube precisa de actualizar-se aos tempos modernos.
    Um abraço!

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  4. Não tenho podido ir às AGs por motivos de trabalho, e também é verdade que só soube desta demasiado em cima da hora - se tivesse sabido mais cedo, teria eventualmente arranjado forma de ir. É lamentável que as AGs continuem a ser divulgadas quase exclusivamente nos meios arcaicos que estão consagrados no estatutos. Já não digo enviarem-me uma carta, mas porque não um email? Recebo-os todas as semanas a anunciar venda de bilhetes e merchandising...

    Quanto ao resto, na versão que tenho dos estatutos, e que está disponível aqui, já não consta a possibilidade de inscrever esposas como sócias auxiliares, diz apenas que "manterão a qualidade de sócios auxiliares as esposas de sócio que já a tenham adquirido".

    No entanto, disseram-me também recentemente que há privilégios para filhos menores de sócios que estão vedados a filhos menores de sócias, ainda que sejam sócias efectivas, por isso não sei se não haverá outros regulamentos que também precisem de ser actualizados, a par dos estatutos.

    Na AG em que se aprovou o aumento de quotas foi dito qualquer coisa sobre uma revisão estatutária para breve, mas desde então não sei em que pé está.

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