12 março, 2017

FOTO MÍSTICA #4 - Futre [1987]


O FOTO-MÍSTICA é um espaço de registo e divulgação da história do FUTEBOL CLUBE DO PORTO. O objectivo é recordar os seus momentos, os seus valores, os seus princípios, a sua cultura, a sua marca, a sua dimensão, as suas gentes. Numa palavra: a sua MÍSTICA. Todos são convidados a participar nesta viagem. Se pretenderem ver divulgada uma fotografia em especial, podem enviar e-mail para rodalma@hotmail.com.


Época: 1986/1987.
Local: Estádio das Antas.
Data: 08.04.1987.
Resultado: FC Porto 2x1 Dínamo Kiev.
Aparecem na fotografia: Paulo Futre e Adeptos do Futebol Clube do Porto.
Meio génio, meio louco, na foto está o português que mais se assemelhou a Diego Armando Maradona. Esqueçam Cristiano Ronaldo, esqueçam Luís Figo. Paulo Futre pode não ser certamente o melhor jogador português de todos os tempos, mas é possuidor de qualquer coisa que parece faltar aos demais: a incrível empatia com as bancadas, a paixão irascível pelo jogo, o festejo do golo em comunhão com os adeptos, o mau génio e a piada fácil, a ingenuidade malandra, os modos simples, o bom coração, a dimensão estratosférica de vedeta do futebol, o futebol como parte da própria vida, a loucura de mãos dadas à genialidade, dentro e fora dos relvados. Olhando e ouvindo Futre, vemos um sul-americano nascido por engano na margem sul do Tejo.

Poucos são aqueles que poderão um dia mostrar uma fotografia destas aos filhos, agarrados às vedações para celebrar com os apoiantes, numa total e plena identificação entre jogador, clube e adepto.

Nesta eliminatória que daria acesso a Viena, os soviéticos nunca provaram ser aquilo que se temia: uma máquina cerebral e atlética, fria e racional, o arquétipo do novo modelo totalitário de futebol. Aquela que diziam ser a melhor equipa do mundo da altura acabou por ser vulgarizada pela maior capacidade técnica e união dos azuis-e-brancos. O 2x1 em casa e o 1x2 em Kiev foram prova cabal da tremenda superioridade portista e abriram de par em par as portas do Prater aos Dragões. No momento que a objectiva capta, Futre acaba de marcar um golo que hoje se costuma apelidar de golo à Messi ou golo à Robben: arrancada junto à banda direita, diagonal rápida e explosiva em slalom para o meio deixando para trás os soviéticos Bal e Baltacha, antes de rematar à baliza, contando com um desvio feliz de Zavarov.

Já em Viena, o golo mais bonito de sempre de uma Final da Liga dos Campeões poderia ter sido seu, após ter ultrapassado meia equipa do Bayern, deixando a cabeça em água aos alemães. Seria a versão maradoniana do golo à Inglaterra a nível de clubes. A bola saiu a rasar o poste e o golo mais bonito de sempre ficou para o argelino Madjer.

Futre chega às Antas no decorrer da guerra sem quartel entre Pinto da Costa e João Rocha, em 1984. Os lagartos levaram Jaime Pacheco e Sousa para o Campo Grande, mas o Presidente não teve meias medidas e respondeu ao ataque lançando as garras ao prodígio esquerdino.

É recebido nas Antas sob fortes desconfianças. O balneário azul e branco, em plena década de 80, não era um melting pot como é hoje. À excepção de Inácio, o plantel é composto por homens do Norte, que não aceitam facilmente um miúdo mouro vindo do Montijo.

Acontece que o Paulinho não é um miúdo qualquer. É o mais brilhante e virtuoso esquerdino que o futebol português há-de produzir até à data. Velocidade vertiginosa, drible em progressão, explosividade, atrevimento, energia para dar e vender, tudo culminado num remate poderoso.

Quando entra no Prater, em 1987, Futre já é um dos líderes do balneário, juntamente com Fernando Gomes. Como diz na sua autobiografia: “O Gomes era o General e tinha os seus sargentos: o falecido Zé Beto, Lima Pereira, João Pinto, Frasco e Jaime Magalhães. No início da época seguinte à da minha chegada ascendi a essa condição, juntamente com o André e o Quim”.

Dele, após uma zanga, disse um dia o mítico presidente do Atlético Gil y Gil: “Se Futre fosse uma mulher, seria minha amante”. Numa relação marcada de amor e ódio, em 2004, Futre foi chamado de urgência a Madrid, pois Gil y Gil estava prestes a morrer. Quando chegou ao hospital, o médico informou-o que o histório dirigente rojiblanco havia acabado de falecer. No dia seguinte, os jornais espanhóis titulavam que Gil y Gil estava à espera do El Portugués para abandonar este mundo. No dia do funeral, Futre é um dos homens que carrega o caixão do histórico dirigente colchonero.

Considerado pelos adeptos numa votação online como o melhor jogador de sempre do Atlético de Madrid, confessou mais tarde que Artur Jorge nunca o elogiou durante a sua passagem pelo FC Porto. O Rei Artur redimiu-se assim no momento da sua partida para Espanha: “Sabes porque nunca te elogiei? Porque tudo o que faças, é pouco para ti. Vais ser o melhor jogador do mundo”.

O Rei Artur esteve perto, mas não acertou. Futre viria a perder Bola de Ouro da FIFA em 1987 para Ruud Gullit. Tudo porque o jornalista português, o último a exercer o direito de voto, não podendo escolher o seu compatriota, em vez de votar em Butragueño (já sem hipóteses de alcançar a Bola de Ouro), atribuiu os seus pontos ao holandês, conferindo-lhe a vitória por meros 8 pontos.

Paulo Futre, que em miúdo costumava deixar os treinos do sporting à pressa para apanhar o cacilheiro para o Montijo, rezando para que o mestre do barco fosse seu conhecido para que o deixasse jantar as sobras dos marinheiros, transformou-se num globetrotter do futebol mundial: passou por Atlético de Madrid, AC Milan, West Ham, benfica, Marselha, Reggiana e Yokohama Flugels. Mas aos 30 anos, no seu primeiro adeus ao futebol devido a crónicos problemas no joelho direito, no Hotel Altis, é com umas chuteiras em cima da mesa que, de lágrimas nos olhos e visivelmente emocionado, declara:

“É a olhar para estas míticas chuteiras, com as quais fui campeão da Europa pelo Futebol Clube Porto, em Viena, que quero anunciar-vos o fim da minha carreira de futebolista profissional”
FONTES UTILIZADAS, A QUEM AGRADECEMOS:
  • Paulo Futre, El Portugués (Luís Aguilar)
  • Jornal de Notícias
  • Filhos do Dragão
Rodrigo de Almada Martins

2 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Grande Futre! A foto: eu estava ali, no topo Norte do Estádio das Antas, um pouco mais acima dos espetadores que se veem na fotografia. E no fim do jogo eu disse: vamos ganhar a Kiev. E ganhámos” como ganhámos a final da Taça dos Campeões Europeus.

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