24 abril, 2008

A ASAE fecha a Luz!

Porto-Benfica. 1978. Curiosamente, há trinta anos atrás. Estádio das Antas. Repleto. Uma mistura de entusiasmo febril e ansiedade, mesclada com nervosismo, transformam o anfiteatro portista num caldeirão de emoções. Mais do que um clássico, aquele era O clássico. 19 anos de jejum separavam gerações de portistas do ansiado grito de emancipação. Numa transposição de Lei de Murphy* para o futebol, o desejo e a ânsia por um triunfo azul e branco sofreram um duro revés quando, na fase inicial da partida, Simões introduz a bola na própria baliza. O gesto de desespero do esguio defesa central portista exemplifica bem o dramatismo de que se revestia o lance. Anos de fatalismo abateram-se, como um balde de água fria, sobre os adeptos, vendo o título fugir, a poucas jornadas do fim, para o eterno rival.

Aquele lance poderia ter sido o princípio do fim. Poderia. Mas não foi. Naquele momento crucial da história, onde um passo em falso na ténue linha que separa a fronteira do sucesso e do fracasso ditaria o nosso futuro, nasceu o Porto de hoje. O Porto dominador, hegemónico, foi fermentado no sofrimento. Fortaleceu o seu carácter na dor, na transcendência, na insubmissão aos poderes vigentes. O golo de Ademir, quase no ocaso da partida, restabelecendo a igualdade, fez mais do que soltar as emoções. Celebrou uma nova Era. A “revolução azul”, como a apelidou Luís Freitas Lobo, teve ali o seu viveiro.

20 de Abril de 2008. Estádio do Dragão. 30 anos depois, a história foi diferente. O que antes era feito com esforço, lutando contra as forças das trevas, numa espécie de reedição bíblica da eterna luta entre o Bem e o Mal, agora é servido com classe. Pioneiros, os atletas portistas da década de 70 desbravaram caminhos, permitindo a passagem sistemática de testemunhos a outros rostos, mas mantendo sempre viva esta mística e a luta contra o poder centralizador. Conquistada a hegemonia, passo a passo, quase como se de uma batalha pela sobrevivência se tratasse, o azul e branco chegou pujante ao século XXI. Em crescendo, pulverizando recordes e humilhando a concorrência, com margens pontuais quase obscenas. Quinzenalmente, o Dragão celebra esse feito. Com festa. De arromba.

3 décadas depois ainda há quem discuta o mérito dos títulos conquistados pelo clube sediado na Invicta. Inicialmente, depois da aceitação nacional de que as conquistas não eram esporádicas, mas sim sucessivas e efectuadas de forma compulsiva, apareceu o “sistema”. Esse polvo que se movia na sombra, capaz de com um estalar dos seus tentáculos fazer aparecer um título na vitrina do Dragão. O “sistema” morreu. Cheirava já a bafio, na parte final da sua existência. Morreu vítima de um apito. Aliás, do Apito, assim mesmo, com direito a reverencial letra maiúscula. O processo que, esfregavam alguns as mãos de contentamento, viria a colocar a verdade nos resultados pretensamente viciados. E veio. O Porto continuou na sua caminhada solitária, expandindo fronteiras, continuando sem vacilar no trilho do sucesso.

Sílvio Cervan é um desses. Excomungado da política, encontrou no microcosmo futebolístico um território favorável a pessoas da sua estirpe. Fazendo da bajulação e adulação ao Orelhas a sua principal virtude, tem procurado com denodo e uma dose preocupante de irracionalidade desvirtuar títulos conquistados com mérito. Antes do derby do fim-de-semana, resolveu tentar umas graçolas, considerando o clássico como importante…para o Porto. Descontando a imbecilidade genética, qualquer adepto, por mais fervorosa que seja a sua paixão, sabia de antemão que o jogo era importante sim, mas para os encarnados. E nem era necessário colocar as “celulazinhas cinzentas” a trabalhar, como diria Hercule Poirot, o detective clássico de Agatha Crhistie, para chegar a essa conclusão. Afastados precocemente da fase de grupos da Champions, em 4º lugar no campeonato, obscenamente a 21 pontos de distância do líder, derrotados sem apelo na UEFA por uns desconhecidos espanhóis, seviciados duramente na Taça de Portugal pelos vizinhos do lado, era ao grupo comandado pelo mico de circo que competia provar alguma coisa. Ou pelos menos tentar. Algo que fizesse os seus adeptos acreditarem que era mesmo pela arbitragem que o Porto ganha troféus atrás de troféus. Os 90 minutos de Domingo colocaram um ponto final na discussão. De forma vexatória, o "melhor plantel dos últimos 10 anos" viveu transido de medo. Medo de ser goleado. Pânico por jogarem contra aqueles que o subconsciente lhes diz serem os melhores. E o ar de alívio no final da partida, de Chalana, contente por "não ter sido humilhado" diz tudo. Nós somos mesmo o pior pesadelo daquela gente...

Estrategicamente, o presidente da Instituição, como ele pomposamente se apresentava tempos atrás, resolveu criar uma nova manobra de diversão. Acossado internamente, pela evidente incompetência que demonstra para a função, Luís Filipe Vieira voltou a fazer uso do seu tom tonitruante, na Assembleia da Liga, bramindo contra os resultados viciados. Coerente na forma e no discurso, brandindo uma mão cheia de nada, provando coisa nenhuma, tenta uma mascarada fuga para a frente, atirando areia para os olhos de adeptos, camuflando opções estratégicas erradas e um caos futeblístico que os equipara a um clube do meio da tabela. Assistimos a um desfecho previsível, para mágoa de todos nós. O Orelhas tem os dias contados. Vai sair como entrou. Sem honra, nem glória...

*lei de Murphy: Se há duas ou mais formas de fazer alguma coisa e uma das formas resultar em catástrofe, então alguém a fará.

ps1 - E o porquê do título, perguntarão alguns? Apenas uma forma de homenagem à criatividade do Bruno Rocha, compincha de escritos no MundoAzuleBranco, que se saiu com esta tirada, após a vitória no clássico. "A ASAE devia fechar a Luz"! E não é que ele tem razão?

O organismo em causa, sempre lesto e zeloso no cumprimento de normas qualitativas, bem que podia aparecer pela Luz, fechando a cadeado o recinto, até que a equipa que por lá habita atinja os níveis mínimos de qualidade. Sempre poupava os adeptos lusos a espectáculos intragáveis, onde eles são intervenientes.

ps2 - Carolina Salgado está a escrever um segundo livro. Vamos saltar a discussão sobre se ela realmente escreveu o primeiro. Carolina contou na Imprensa que está refugiada no Alentejo a escrever. Bem, não exactamente a escrever, está a “definir parágrafos”. Cada escritor tem o seu método, mas este é inovador. Primeiro, define-se quantos parágrafos vai ter e finalmente, presumo, é só encher os espaços. É um pouco como o ponto de cruz. Pode ser um sucesso este método. Depois das casas de bebidas que não eram de dormidas, Carolina agora pode perfeitamente trabalhar numa casa de escritas.

Sérgio Sousa, in JN-Negócios, de 19.04.08

13 comentários:

  1. Obrigado Paulo por recordares esse jogo de 1978 q permitiu acabar com aquele jejum insistente. Pedroto de braços no ar festeja efusivamente o golo salvador. O Porto depois de tanto porfiar chega à igualdade. Invejo o meu Pai por ter vivido essa alegria. Eu era uma criança de 4 anos e só queria saber do Dartacão e do Misha;)

    Hoje 30 anos depois o Porto, como dizes, está diferente. Mais seguro e imponente mas nós os adeptos temos ainda essa mística. De sofrimento, de emoção, de união, de luta e coragem.

    E de talento, já agora.

    Parabéns.

    Qt à ASAE e ao Orelhas, coitado é o q digo qd alguém perante mim se afirma mouro.

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  2. Esse jogo de 1978 que eu assisti depois de grandes peripécias( andava nos Comandos e tive de desenfiar)fica para sempre marcado na minha memória.Agora tudo é diferente, mais fácil, as coisas acontecem com uma naturalidade impressionante. É bom que este estado de alerta permanente, esta cultura de exigência se mantenha. Chegar aqui,foi muito difícil,foi como subir o Evereste,mas para ir para baixo é muito mais fácil.
    Com a inveja podemos nós bem, o grande desafio é contra nós próprios.
    Um abraço

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  3. TEXTO RETIRADO DO BLOG REFLEXÃO PORTISTA PARA OS QUE QUISEREM RECORDAR ESSA CAMINHADA DE 1978:

    «E entrou-se finalmente na época de 1977/78. As coisas não começaram nada bem, diga-se, pois à 2ª jornada o FC Porto perdeu por 2-0 no Estoril, campo tão ou mais aziago para nós naquela altura como agora o é o do Estrela da Amadora. José Maria Pedroto reagiu à derrota dizendo que o FCP não voltaria a perder um jogo assim. E se bem o pensou, melhor o fez, pois na realidade aquela viria a ser a única derrota sofrida pela equipa em todo o campeonato.

    Três dias depois do desaire no Estoril "nasceu", em minha opinião, o FC Porto europeu: ao empatar 2-2 em Colónia, para a 1ª eliminatória da Taça das Taças, o FCP deu o primeiro arzinho da sua graça em provas europeias, confirmado 15 dias depois com a vitória (em Coimbra, por interdição das Antas) por 1-0.

    Com o decorrer do campeonato, o Zé do Boné, decidiu passar ao ataque. Foi aí que surgiu a sua famosa frase acerca dos "roubos de igreja no Estádio da Luz", a qual, como se calcula, teve o condão de irritar solenemente o "establishment".
    Mas a coisa não ficaria por aqui: ia já o campeonato relativamente adiantado quando, numa bela tarde de Domingo, o Zé do Boné, aproveitando o facto de o FCP não jogar nesse dia, se deslocou à Póvoa de Varzim para presenciar um Varzim-Benfica que terminaria com um empate a 1-1. Numa das suas páginas interiores "A Bola" do dia seguinte titulava: "PEDROTO NA PÓVOA: «BENFICA NÃO TEM ESTOFO DE CAMPEÃO»" O jornal noticiava em detalhe as declarações de Pedroto no final do jogo, com mais ou menos este teor: "O Benfica não tem estofo de campeão: demonstrou-o bem aqui, pois empatou tal como poderiam ter empatado o Feirense ou o Espinho, isto é, jogando à defesa. Claro que falhou um penalty, mas penalties todos os guarda-redes defendem, mexendo-se ou não" (uma alusão ao facto de Manuel Bento, o guarda-redes do Benfica, ser "especialista" em defender penalties, mexendo-se frequentemente antes de a bola partir). Foi o bom e o bonito! Desta vez o nossos rivais da Luz entraram definitivamente em parafuso, chegando ao cúmulo de enviarem um telegrama ao Dr. Américo Sá, protestanto contra "interferência vosso técnico assuntos internos nosso clube" (!).

    Entretanto, a saga europeia continuara com a histórica eliminação do Manchester United (4-0 nas Antas e 2-5 em Old Trafford), mas a equipa soçobraria nos quartos-de-final perante o - à época - poderoso Anderlecht (1-0 em casa e 0-3 em Bruxelas). Mas a semente ficara.

    Benfica e FC Porto estavam separados por 1 ponto, a favor do FCP, quando chegou o dia 27 de Maio de 1978 e o tão aguardado "jogo do título", o Porto-Benfica nas Antas, na antepenúltima jornada. O desafio da Luz na primeira volta terminara com um empate a 0-0, pelo que o empate até nos serviria, mas a vitória arrumaria praticamente a questão. Pelo meio ficara uma famosa vitória por 3-2 em Alvalade, com dois golos de Gomes e um de Duda, a mais exuberante manifestação de que o FCP estava suficientemente maduro para chegar ao título.
    Mas o jogo começou da pior maneira: aos 3 minutos, pretendendo aliviar um cruzamento inócuo, o central Simões meteu o joelho à bola e esta, passando por cima do desamparado guarda-redes João Fonseca, acabou no fundo das redes. Caía a consternação numas Antas com cerca de 80.000 espectadores (na altura o "tudo a monte" e o "cabe sempre mais um", ao estilo dos eléctricos dos STCP, eram as mais conhecidas modalidades de acolher o respeitável público). O resto da primeira parte passou-se com o FCP a dominar mas sem criar grandes jogadas de perigo. Pairava no ar um ambiente semi-fúnebre. Na 2ª parte o FCP porfiou, com um pouco mais de perigo, mas haveria de ser o Benfica, com o jogo já adiantado, a falhar escandalosamente o 2-0: Humberto Coelho, isolado, rematou, mas a bola milagrosamente bateu num pé de Fonseca e foi embater na barra. Ufa!

    O Zé do Boné abandonara o banco e passeava com ar pesaroso ao longo da pista de cinza. Já lançara todos os trunfos de que dispunha. Provavelmente, se tivesse perdido aquele jogo, teria ido para monge. O seu empenho pessoal na luta por aquele título era demasiado grande... Mas eis que, aos 82 minutos, na ressaca de um livre perto da área do Benfica, o brasileiro Ademir, um dos suplentes utilizados nesse jogo, rematou com violência: a bola passou por meio de uma floresta de pernas, como dizem os jornalistas, e só acabou a sua viagem no fundo das redes do guarda-redes Fidalgo (Bento fora expulso duas jornadas antes e estava suspenso). A angústia e ansiedade acumuladas quase desde o início do jogo explodiram fragorosamente qual paiol de munições. Daí até ao fim, o FC Porto ainda dispôs, inclusive de pelo menos mais uma ocasião de golo, mas a partida terminaria empatada.

    No final festejou-se como se o título já estivesse "no papo", mas essencialmente tratava-se de uma enorme sensação de alívio. No dia seguinte "A Bola" sacava de uma manchete irónica: "Em falta de estofo, equivaleram-se um ao outro". Em contraste, "O Comércio do Porto" mostrava o Zé do Boné sentado numa almofada com a etiqueta "Estofo de Campeão" : -)

    Oito dias depois, e com alguns sustos pelo meio (e com um estrondoso remate à barra atirado da entrada do meio-campo da Académica pelo central Freitas), o FCP empatava em Coimbra, 0-0. Como o Benfica vencera o seu desafio, as equipas entraram para a última jornada empatadas em pontos - e o Benfica não sofrera ainda qualquer derrota e terminaria o campeonato invicto! A diferença de golos era-nos, contudo, francamente favorável.

    Chegou, pois, o grande dia, 10 de junho de 1978. O adversário era o Braga. As sardinhas em lata de novo se deslocaram às Antas (mais 80.000 de assistência) e o FCP venceu categoricamente, por 4-0. Terminara a "grande travessia do deserto". A loucura foi total. Milhares de pessoas desfilaram a pé desde as Antas até à Av. Aliados. E a História, como agora sabemos, não voltaria a ser a mesma...»

    VÍDEO do portocanal da festa de 11 junho de 78 (porto-4-braga-0) qd o jejum de 19 anos foi definitivamente afastado:

    http://www.youtube.com/watch?v=C-swBjSiBso

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  4. Eu tinha mais 3 do que o Lucho... e também estava mais virada para os desenhos animados :P
    Mas, é um bom tema para o almoço de sabado. Com certeza o meu Pai terá excelente memória desse jogo :D

    O campeonato terminou frente ao Braga ?
    0-4 ?!!

    :(

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  5. heliantia 4-0 a nosso favor!!

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  6. Grandes emoções !

    Esse momento mágico que mudou o rumo da "história" foi obra de muita gente.

    Hoje , muitos mais do que ontem , continuam a fazer "história" com a mesma paixão.

    Viva o PORTO !

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  7. Como gostaria eu de me lembrar desse jogo, mas em 1978 eu ainda estava sabe.se la bem aonde, o meu pai tinha acabado de atingir a maioridade e eu nem ver. So 11 anos depois eu viria a este mundinho, ja com o Porto Campeão Europeu, Campeão do Mundo, enfim. Acho que ainda vim a tempo de aproveitar muita coisa ;) e se tudo correr como eu sei que vai correr, ainda vou ver muitas mais alegrias como estas...
    Se bem que hoje em dia facilitam tanto o trabalho que Jasus Credo! XD

    Beijinhos azuis e brancos da Ta_8

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  8. Viva !

    Paulo Pereira , eis um texto indispensável.

    Parabéns e Muito Obrigado.

    Paulo Pereira, creio que já tinha referido : O Blog vai sendo consultado. A garotada ( sem qualquer ofensa ) vai consultando.

    É importante lembrar a história !

    Sem dúvida o mais importante : A Memória !

    Continua !

    Oba, Oba : Não estou xé-xé !

    E Viva o Porto !

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  9. Este comentário foi removido pelo autor.

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  10. Quase choro de emoção ao ler o texto tirado pelo Lucho do " Reflexão Portista" ... É que ... assisti a tudo o que lá vem... já com os meus vinte aninhos ... Mas é tão bom relembrar esses momentos!!!

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  11. Eu percebi, Lucho :P

    Só lamento é ter sido o Braga e mais uma vez sofrer 4 golos :(

    Quem são os senhores na foto ?
    Um dá pela camisola (linda por sinal) ver que é nosso! Mas, o outro... aquilo não é o clube dos melões...

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  12. Heliantia,

    Se te estás a referir à 1ª foto, o outro é o Cubillas, peruano e um dos estrangeiros mais brilhantes k pisou os relvados portugueses...

    E sim, ele jogou, e bem, com as listas verticais azuis e brancas. Na foto envergava a camisola da sua Selecção...

    Tenho pena de nunca o ter visto jogar. O meu pai diz apenas que ele era BRILHANTE!

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  13. Essa mesma :)
    Engraçado que eu olhava para a foto e o Cubillas faz lembrar o Ronaldo (acho que é Ronaldo...), mas não fazia sentido. O colega do lado deve ser então o Ademir :P

    Obrigada, o nome é-me familiar.

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