24 fevereiro, 2017

TIQUINHO, O ESTRIPADOR.

Trabalho gráfico realizado por Bruno Sousa, a quem o BPc e eu próprio muito agradecemos.
Encontrava-me em Londres quando soube da contratação de Soares, também conhecido por Tiquinho. Como sempre nestas situações, tratei logo de averiguar quem era e como era o jogador, junto de um grande amigo de infância, vitoriano de gema.

Os vitorianos, diga-se de passagem porque conheço uns quantos e bons, são gente que ama o Vitória e, salvo raras excepções, não sofrem da maleita que atinge meio Portugal, isto é, não têm nenhum segundo clube. São do Vitória e ponto. Nem simpatizam com Porto, nem com benfica nem com sporting. São do Vitória e acabou. Goste-se ou não se goste, são merecedores de respeito, pois não há muitos como eles.

Relato em primeira mão o que me foi dito na altura:

“O Soares é o tosco com mais técnica que conheço. Ao lado dele, qualquer manco parece jogador, a começar pelo Marega. O gajo é um cão de fila, nunca vai ser por ele que o Porto vai deixar de ganhar algum jogo. É jogador e chega na altura certa a um grande, já casado, com 26 anos, não se vai iludir. É daqueles que não vai jogar para dar o salto, vai ficar no Porto muitos anos e, depois dos 30, faz o contrato da vida dele na Rússia. O tipo é daqueles que sozinho consegue esquartejar uma defesa, de tão bruto que é.”
Esta descrição deixou-me, naturalmente, a salivar por Soares. Isso e aquelas pequenas curiosidades/coincidências que quem acompanha o FC Porto gosta de registar: as semelhanças físicas e de atitude com Derlei ou o facto de ser original do mesmo estado brasileiro que Hulk. E, claro, o próprio nome Tiquinho, bem melhor que o (mais respeitável, mas menos gracioso) Francisco. Tiquinho remete-nos para o imaginário das telenovelas do sertão brasileiro, para os criminosos das estradas poeirentas do interior das Terras de Vera Cruz, para aqueles bandoleiros sem eira nem beira que aterrorizam populações indefesas e assaltam bancos de província, como Butch Cassidy ou Sundance Kid. Tiquinho parece nome de criança, mas mete medo, oh se mete!

Mas voltemos a Londres. Passei duas semanas em Whitechapel, que hoje pertence àquilo que se pode considerar o centro de Londres, a meio caminho de Tower Hill e da City londrina. Whitechapel transformou-se nos últimos anos numa zona trendy da cidade britânica, multiplicando-se os restaurantes indianos, turcos, tailandeses, libaneses, etc. O Brick Lane Market é hoje, por exemplo, uma grande atracção aos fins-de-semana, onde milhares de locais e de turistas se deslocam para provar as iguarias da world food. Como diria alguém: fui muito feliz por lá!

Mas isto é nos dias de hoje. Nem sempre foi assim. Por mero acaso, nas redondezas de Brick Lane, dei por mim a entrar numa livraria vintage. Entre muitos álbuns sobre o East End antigo, um pequeno livro sobre o famoso Jack, The Ripper despertou-me a atenção. Peguei no livro e comecei a folhear com interesse a história desse famoso assassino inglês dos finais do século XIX.

Mas então que Whitechapel era essa? Bem diferente da actual. Os relatos indicam uma zona bastante lamacenta, sem qualquer sistema de saneamento básico, sem iluminação pública, pejada de emigrantes recém chegados à metrópole londrina, a grande maioria sem esperanças numa vida melhor, aprisionados que estavam numa área onde o crime proliferava e a prostituição era bastante comum.

Corria o ano de 1888 quando uma série de trágicos incidentes agitaram a cidade. Vários assassinatos, do mesmo género e circunstância contra prostitutas, ocorreram pois então na nossa Whitechapel. O assassino, dizia-se, ou era talhante ou cirurgião, tal a precisão dos golpes que desferia na traqueia das vítimas o que, comentava-se, as impediria de gritar prontamente por socorro. As autópsias demonstravam também que, após as mortes, as vísceras das vítimas eram remexidas e muitas vezes retiradas, sugerindo conhecimentos anatómicos avançados ou pelo menos não ao alcance do comum mortal.

A identidade do assassino (ou dos assassinos) nunca chegou a ser descoberta, proliferando ainda hoje as mais variadas teses sobre o assunto, que continua a apaixonar os fanáticos da capital britânica. O que é certo é que uma estranha carta aterrou no escritório da Central News Agency, sendo depois reencaminhada para a Scotland Yard, escrita por alguém que reclamava ser o autor dos assassinatos e que assinava como Jack The Ripper. É nesse momento que termina a realidade e começa a lenda.

Ainda antes do jogo do Sporting, veio-me à cabeça um bom nome para Soares. Podia ser Presidente Soares, claro está, mas atendendo à descrição do meu grande amigo vitoriano (um abraço com saudades para ti, Zé Guilherme, e boa sorte para o teu Vitória!), ficou para mim claro que teria que ser Tiquinho The Ripper, ou melhor ainda, em português açucarado: Tiquinho, O Estripador.

Ora esta ideia foi claramente reforçada pela explosiva estreia de Tiquinho com as nossas cores, seguida do golo em Guimarães e do fantástico golo frente ao Tondela. Todos sabemos que Soares É Fixe, mas o que gostamos mesmo é que ele rasgue, esventre e dilacere defesas, tal como fez perante os pobres Schelotto, Coates e Ruben Semedo, que foram completamente esquartejados pela desmarcação explosiva do homem de Paraíba, que atacou directo às vísceras da defensiva sportinguista.

O contorno a Rui Patrício fez lembrar as célebres incisões do homem que atacava em Whitechapel nos finais do século XIX: uma degolação perfeita, rápida e agressiva, sem dar hipótese sequer para um ai ou para um ui.

Já temos, pois, alcunha para o homem:

Tiquinho, o Estripador.
Um agradecimento especial, em meu nome e do BPc ao designer Bruno Sousa, cujo magnífico trabalho vem sendo cada vez mais reconhecido no seio do universo portista. Tê-lo a colaborar connosco, como nesta crónica, enche-nos necessariamente de orgulho. Esperemos que, depois da arte gráfica realizada para o Rei Bakar, tenhamos mais sorte com o Tiquinho O Estripador! OBRIGADO!

Rodrigo de Almada Martins

1 comentário:

  1. Gostaria só de felicitar o autor por mais um artigo que liga jogadores do FCPorto a figuras históricas ou literárias. Poucos jornalistas pagos conseguiriam escrever uma conteúdo tão original e interessante. Que Soares tenha muito sucesso e fique por muitos anos !

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