Segue-se a «voz» da Dra. Manuela Aguiar, jurista e ex-deputada do PSD (onde chegou a ser presidente da sub-comissão das Comunidades). Fica desde já o nosso agradecimento pela sua disponibilidade e simpatia, votos que também se estendem a um amigo do blog que nos forneceu o seu contacto.
1. Desde quando surgiu essa sua paixão pelo FC Porto?
Posso dizer que sou “portista de nascença”. Isto é, desde que me conheço. Considero-me a continuadora, em linha recta, de uma tradição de paixão clubista, que vem dos primeiros tempos de vida do FC Porto, e se transmitiu de meu Avô para meu Pai, e de ambos para mim. Não tenho outro clube, nem mesmo a Académica, apesar de ser formada em Coimbra - quando para lá fui, o meu “portismo” absoluto estava mais do que enraizado.
Com o meu Pai ia, desde os 10 anos - que coincidiram com a inauguração do estádio das Antas - ver os jogos do Porto. Devo-lhe a compreensão do que é o futebol e da felicidade que pode trazer às nossas vidas. Nos estádios passei alguns dos momentos mais fantásticos, de que me lembro, a vibrar com a suprema alegria de golos e vitórias. Não consigo imaginar-me a não saber o que isto é!
2. No período em que desempenhou funções na Assembleia da República, como eram vividas as vitórias do FC Porto pelos deputados que consigo privavam?
Às vezes, como num estádio, em júbilo colectivo no Plenário, à medida que íamos sabendo o resultado, por um ou outro dos que regressavam de uma sortida, destinada a espreitar o ecrã de tv (júbilo contido e discreto, claro…). Mas o mais importante, era o clima de solidariedade ou união, que se criava entre deputados, quanto ao resto, bastante desunidos. Num parlamento nacional, tudo o que leve a um melhor entendimento e simpatia entre pessoas, a uma visão delas e das coisas menos maniqueísta ou sectário, é saudável.
E nós, os portistas, fomos os primeiros a promover convívios, com membros de todas as bancadas, para os quais convidávamos o Presidente do clube. Um sucesso!... eram, como dizíamos, por graça, as “reuniões do grupo parlamentar do FC Porto”. Logo de seguida, os adeptos do SCP e do SLB copiaram o modelo. Entrou nos bons costumes, até hoje.
Quando começou, ao certo, não sei. Foi entre 1988 e 1991, porque me lembro de uma fulgurante intervenção de Natália Correia sobre dragões mitológicos e sobre a serpente, como símbolo da antiga Lusitânia (e ela deixou a Assembleia em 1991).
3. Como são as horas seguintes da Dra. Manuela Aguiar depois de uma derrota num jogo importante?
Deprimentes… experimentei esta semana essa sensação, saindo do estádio, como toda a gente, salvo umas dezenas de ucranianos, com “a alma em baixo”. Nestes casos, resta-nos esperar pela próxima vitória, que é o único remédio eficaz.
4. Como classifica toda esta história do «apito final» que envolveu (e ainda envolve) o FC Porto?
Vejo esta história “kafkiana” do “apito final” como o último e desesperado recurso para neutralizar a força de um Homem, que praticamente se identifica com a imparável ascensão do FC Porto. Em Portugal, ainda há muitos que não aceitam a mais do que provada superioridade de um clube de fora da capital. A argumentação, juridicamente, é fraquíssima. O espalhafato com que foi apresentado na Liga, foi próprio de uma "justiça" do "terceiro mundo".
E de qualquer modo, é, de facto, absurdo pôr em causa a “verdade desportiva” de vitórias do FC Porto, em jogos que já nem contavam para nada, numa época em que as suas vitórias maiores aconteceram fora das nossas fronteiras. Estamos a falar do FC Porto campeão europeu! Um exemplo acabado de… injustiça à portuguesa.
5. Qual a vitória do FC Porto que mais a entusiasmou? O que já fez de mais «louco» pelo nosso clube?
É difícil responder… foi, talvez, a vitória no campeonato nacional de 1955/1956, o primeiro campeonato do FC Porto no meu tempo de vida – e já tinha 13 anos! O último jogo foi nas Antas, com a Académica, e nós precisávamos de vencer. Eles passaram o tempo a fazer um muro humano na grande área. Até que derrubaram o Hernâni e ele conseguiu, de penalty, o primeiro golo. A partir daí, o muro desmoronou. Foi um delírio! Yustrich tornou-se, logo, uma lenda viva!
O que fiz de mais “louco” pelo nosso Clube? Do meu ponto de vista, nada qualifica como tal. Não assim, porventura, do ponto de vista dos outros… por exemplo: a iniciativa de apresentar, na Assembleia, um “voto de congratulação” pela vitória do FC Porto em Viena. O então Presidente da Assembleia deve ter achado a proposta, “coisa louca”, porque “vetou” a discussão do voto, com o argumento de que um acontecimento do futebol não tinha “dignidade” para justificar a homenagem do Parlamento. De pouco me serviu responder: "mas se o Presidente da República pode condecorar clubes e atletas, porque não pode a Assembleia, pelos mesmos feitos, aprovar um simples voto de saudação, que é muito menos?"
Só depois que o Porto se sagrou campeão do mundo no Japão, um voto semelhante (eu não desisto!), foi aceite e votado em plenário, com toda a “dignidade” e unanimemente… mais tarde, outro Presidente da Assembleia também achou “imprópria” a ida de deputados às finais de Sevilha e de Gelsenkirchen, a convite do FC Porto, não obstante estarem lá presentes as mais altas figuras da República. Foi a longa polémica das ”faltas injustificadas”, pelo Dr. Mota Amaral, na qual desempenhei o meu papel de oposição.
6. Escreva-nos o seu onze ideal da história do FC Porto.
Onze nomes maiores na história do FC Porto: Baía; João Pinto, Ricardo Carvalho, Aloísio, Branco; Deco, Pavão, Cubillas; Hernâni, Fernando Gomes e Madjer.
Não sei se este seria, no relvado, um “onze ideal” (sou da escola que defende a conveniência prática de dosear “génios” e “operários”…), mas com o incomparável talento de todos, e com a versatilidade de alguns, capazes de jogar em qualquer esquema táctico e em qualquer posição, do meio campo para diante, talvez conseguissem um esplendoroso futebol de ataque, com uma retaguarda de luxo. O pior é que faltam muitos outros nomes grandes, desde a dupla de centrais Fernando Couto – Jorge Costa, ao carismático Paulinho Santos, ou ao inesquecível Jardel “a voar sobre os centrais”, na nossa memória e na canção de Rui Veloso.
7. Dê-nos a sua opinião sobre: Pinto Costa, Pedroto, Artur Jorge, António Oliveira e Mourinho.
Pinto da Costa: o Presidente que transformou um clube português “de província”, no maior fenómeno de ascensão no futebol mundial dos últimos 20 anos. Um clube que excedeu as expectativas e sonhos de todos os adeptos. Já o disse muitas vezes: há um FC Porto antes e um FC Porto depois de Pinto da Costa.
Pedroto: tão grande jogador, como treinador. Um pioneiro, até na forma “profissional” de encarar a vida no mundo do futebol. Por isso, passou por muitos clubes, coleccionou contratos excepcionais e sucessivos êxitos desportivos. Historicamente teve a sorte de estar ao lado de Pinto da Costa, no início do renascimento do FC Porto.
Artur Jorge: para além de talento e do “fair play”, que o caracterizam, trouxe a aura da sua cultura para o domínio do futebol, em geral, mal visto pelas nossas “elites” intelectuais. Um grande “senhor do futebol”. O rei Artur! Mereceu bem todos os êxitos que constam do seu vasto curriculum e, em particular, o primeiro campeonato europeu do FC Porto.
António Oliveira: que saudades de o ver a jogar com a camisola azul e branca! Um jogador absolutamente genial – dos tais que poderia ter incluído no onze ideal da história do FC Porto. E um competentíssimo treinador, a quem não foi dado todo o reconhecimento devido, que se afastou, e continua a fazer falta ao desporto nacional.
Mourinho: é um caso diferente. Nunca foi portista, mas é parte integrante, pelas melhores razões, do historial do FC Porto. E, quer ele queira ou não, o FC Porto faz parte da história da sua vida e da sua meteórica carreira. Confesso que, de princípio, não acreditava nele, mas acabei por me converter à evidência: um fenómeno! Inovador. Honesto. Um líder. Um estratega. O melhor do mundo! “Torço” pelas suas equipas, onde quer que esteja – excepto se, do outro lado, se encontrar o meu clube.
8. O que antevê para mais esta temporada 2008/09? Sente que o FC Porto tem capacidade e liderança técnica para chegar ao tetracampeonato?
Este campeonato, no seu início, parece mais nivelado – e, por acaso, até mais para cima do que para baixo, e com equipas consideradas de meio da tabela… Mas eu estou optimista: o FC Porto é como os corredores de fundo – à medida que avança no percurso, vai deixando, cada vez mais, os concorrentes à distância. Vamos festejar o tetra! Só não sei se será com 20 pontos de avanço.
9. Costuma estar informada sobre as restantes modalidades do clube?
Acompanho sempre os resultados do FC Porto, em qualquer desporto, através dos media desportivos, mas só tenho comparecido no “Dragão”. Com o novo pavilhão, ali mesmo ao lado do estádio, vai ser mais fácil apoiar, com a minha presença, o FC Porto, em várias modalidades, para além do futebol. Por exemplo, no hoquéi em patins, que é o meu segundo desporto favorito.
10. Onde estava nos dias das gloriosas conquistas de 87 (Viena), 2003 (Sevilha) e 2004 (Gelsenkirchen)?
Em 1987, estava em Lisboa, a jantar em casa de amigos. Alguns acompanharam todo o jogo, numa salinha ao lado. Eu só tive coragem de assistir aos últimos minutos, já com o FC Porto a ganhar. Depois, é evidente, fui a alma da festa, porque era a única portista do grupo. Em 2003, estive em Sevilha e em 2004, em Gelsenkirchen.
Acho mais enervante ver o jogo na TV, do que no estádio, mas em Sevilha, o sofrimento, no último quarto de hora, foi quase insuportável. Nessas duas finais, cheguei a casa de madrugada, ainda a tempo de ficar, até de manhã, diante do écran de televisão, a assistir aos grandiosos e espontâneos festejos populares na cidade do Porto. Um deslumbramento!
11. Já conhecia o nosso blog? Uma palavra para os nossos leitores.
A nova geração de “dragões” da família Aguiar, já me tinha falado do Blog, mas eu só neste Verão me converti, definitivamente, à blogosfera. Sou, por isso, uma das vossas mais recentes visitantes. Quero dizer-vos que sinto aqui bem vivo o nosso FC Porto! Um clube é muito mais do que uma equipa desportiva ou um estádio, por mais fantásticos que sejam… é uma instituição, uma comunidade. Cresce com os adeptos e com a sua capacidade de ter voz e iniciativa em novos espaços. Como este! Precisamos de, mais informação, mais visibilidade, mais reconhecimento, porque este é um domínio em que temos sido, e ainda somos, altamente desfavorecidos. O blog é, assim, também, um instrumento inteligente e poderoso de reivindicar a atenção que nos é devida, de lembrar a nossa história, de reflectir sobre os nossos problemas, de denunciar injustiças e de celebrar vitórias. Muitas, e cada vez mais!
O meu abraço “azul e branco”.
Manuela Aguiar