22 outubro, 2014

DESTRUIÇÃO DE VALOR.

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Finalmente publicado o Relatório & Contas do exercício fiscal de 2013/14, temos agora a visão real daquilo que já se previa, ou seja, um enorme prejuízo contabilístico, o maior de sempre da história da SAD – 40,7M de euros. O desastre desportivo da época passada já era conhecido e dele nem vale a pena falar. Já era dose suficiente para pôr qualquer portista de cabelos em pé, mas a dose acaba por ser dupla com a apresentação destes resultados financeiros.

Dir-se-á que não vale a pena chorar sobre o leite derramado e que há que olhar para o futuro (“há que levantar a cabeça” diria um qualquer jogador após uma derrota pesada). Certo. Mas, não menos certo, é a obrigação de analisar o que correu mal, corrigir, e tomar medidas para que tal não se volte a repetir. Se isso já está a ser feito na área desportiva (quero acreditar que a eliminação da taça de Portugal foi só um mero percalço), como é bem visível, embora em desporto ninguém possa garantir o sucesso, na área financeira ainda estamos para ver o que irá ser feito, se é que alguma coisa se planeia fazer tal é a pressão de toda a gente para alcançar os resultados desportivos, que são como é evidente o verdadeiro “core business” do FC Porto.

Posto isto, e indo à parte das contas que é o que aqui me traz, usando a linguagem do “economês”, diria que assistimos a uma enorme destruição de valor. Para suprir este colapso nos capitais próprios já se conhece a solução encontrada: a passagem de 47% do Estádio do Dragão da esfera do Clube para a esfera da SAD que, de caminho, deu uma enorme ajuda para resolver o bicudo problema que o fair-play financeiro da UEFA veio criar ao não permitir que a média do somatório dos resultados dos três últimos anos não ultrapasse os 5M € de prejuízo. Assim, podemos dizer que de uma cajadada se resolveram dois graves problemas. Resolveram, quer dizer, resolveram no curto prazo, resta saber como tudo se irá comportar no médio/longo prazo, e, como sabemos, o que se passará no longo prazo muito vai depender das medidas que entretanto se vão tomando, concretamente, medidas de contenção de custos/aumento de proveitos para atingir o equilíbrio operacional, ou seja o tal princípio do “break-even” (equilíbrio entre gastos e rendimentos) imposto pela UEFA no fair-play financeiro.

Equilíbrio que está longe de ser atingido como o demonstra as presentes contas.

Assim, depois de um resultado líquido consolidado negativo (prejuízo) de 35.734M € em 2012, e um igual resultado positivo (lucro) de 20.356M € em 2013, temos agora em 2014 este prejuízo de 40.701M €. Ou seja, a média destes 3 anos é de (-35,734 +20,356 -40,701) /3 = -18,693M €, isto é bem acima do tal máximo de 5M € permitido no regulamento da UEFA (mesmo considerando a possibilidade de abater os gastos com a formação e infra-estruturas), média considerada na avaliação da UEFA para este ano. Quem quiser projectar desde já a avaliação para o próximo ano, basta excluir da equação o ano de 2012 e incluir o ano de 2015 (previsão), podendo, porém, adiantar-se que o corrente exercício terá obrigatoriamente que terminar com um lucro, sob pena de cairmos novamente sob a alçada da UEFA, e, lá está, fazer novo aumento de capital para compensar o desequilíbrio entre rendimentos obtidos e gastos incorridos.

Analisando agora as linhas gerais das contas deste ano, o que será mais de salientar, do meu ponto de vista, é o seguinte:
    a) A cada ano que passa, cada vez mais se nota a extrema dependência da realização de mais-valias na transacção de passes de jogadores. Como este ano “apenas” se obteve nesta rubrica o montante de 23.907M €, o que representa uma diminuição de 52.538M € relativamente ao ano anterior, temos aqui a explicação para o descalabro das contas. Por isso falo em extrema dependência, porque uma coisa é depender 10% ou até 20% desta componente dos proveitos e que seria bem acomodada na estrutura dos proveitos, outra coisa totalmente diferente é quando se depende em 50%, ou mais, desta componente. Depender de mais-valias, sim, mas com limites. Infelizmente, no caso da SAD há muito que se ultrapassaram esses limites, e cada vez mais, como se constata este ano com os resultados que se conhecem. Este é um caminho que tem necessariamente de ser invertido, nunca devia ter chegado tão longe, sob pena de um dia destes já não haver salvação possível. E os responsáveis do clube sabem disso, portanto espero que esta loucura termine e as boas contas regressem. Sabemos, pelo que é dito publicamente (ainda muito recentemente pelo administrador financeiro) que intenções há (mas também havia no passado...), resta saber se serão, e como, levadas à prática.
    b) Os custos com o pessoal, naturalmente a principal rubrica dos gastos, diminuíram 5.180M € relativamente ao ano anterior, o que aparentemente é bom. Digo aparentemente porque, de facto, esta diminuição ficou a dever-se a maus motivos. Esses maus motivos referem-se à não atribuição de prémios em virtude da ausência de títulos. De resto, em termos remuneratórios, nada se alterou.
    c) Os custos e perdas financeiras, fundamentalmente juros pagos dos empréstimos bancários e obrigacionistas, estabilizaram perto dos 13M €/ano (12.734M € contra 12.893M € no ano anterior). É bom que o ciclo ascensional que se vinha verificando tenha terminado, mesmo assim continua a ser um valor demasiado elevado e bem revelador do excessivo grau de endividamento. Para se ter uma ideia da relatividade destes números, basta dizer que estes encargos representam cerca de 15% dos proveitos totais quando, idealmente, não deviam ir muito além dos 5%.
    d) Activo a descer 12% e passivo a subir 6% é sinal de alarme. Resultado: capitais próprios negativos e daí, também, toda a operação que se desenvolverá até final do ano para aumento do capital social. Resolverá o problema, mas não o resolverá de forma definitiva, para isso será necessário regressar aos lucros de forma consistente e sustentada. Dito doutra forma: é fundamental parar de destruir valor e passar a criar valor.
    e) As dificuldades de tesouraria e liquidez continuam e não dão sinais de abrandar, o que fica bem expresso no sistemático, ano após ano, fundo de maneio negativo. E não se vislumbram melhorias num futuro próximo.
Estes são, na minha opinião, os pontos mais relevantes e estruturantes das contas publicadas. O importante a reter e a monitorizar constantemente. Depois, há a análise mais minuciosa, rubrica a rubrica, proveito a proveito, custo a custo, e que já não cabe no âmbito do pretendido neste artigo.


nota: o blog BPc agradece ao JCHS a elaboração deste artigo.

1 comentário:

  1. já é preocupante à muito tempo.

    a diferença este ano foi mesmo a quebra de receita obtida através da venda de jogadores, diferença essa justificada com o Mundial.

    basicamente temos de mudar a política.
    apostar mais na prata da casa ou em mercados mais baratos.

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