FCPorto – Dragões de Azul Forte
Retalhos da história, conquistas e vitórias memoráveis, figuras e glórias do
F. C. do Porto
Capítulo 6: 1951 a 1960 – Contestação a Lisboa; a “dobradinha” (Parte XXIV)
Época 1955-1956 (continuação)
2 Mai. 1956 – 1.ª eliminatória: o novo Campeão Nacional iniciou a participação na Taça de Portugal com uma retumbante vitória sobre a equipa de Portimão. António Teixeira apontou, à sua conta, mais de metade dos golos portistas – 7 (sete)! Jaburu marcou 4!
FC Porto 13 – Portimonense 1
Estádio das Antas (Porto)
Árbitro: Eduardo Gouveia (Lisboa)
FCP – Acúrsio; Virgílio, Miguel Arcanjo e Sarmento I; Eleutério e Monteiro da Costa; Hernâni, José Maria, Jaburu, António Teixeira e Perdigão.
Treinador: Yustrich (brasileiro)
Marcadores: 1-0 António Teixeira (10’); 2-0 Jaburu (17’); 3-0 António Teixeira (40’); 4-0 António Teixeira (44’); 5-0 António Teixeira (46’); 6-0 José Maria (49’); 7-0 António Teixeira (56’); 8-0 Perdigão (57’); 9-0 António Teixeira (59’); 10-0 Jaburu (60’); 11-0 António Teixeira (62’); 12-0 Jaburu (70’ gp); 13-0 Jaburu (75’); 13-1 Luz (78’ gp).
6 Mai. – Oitavos-de-final: foi difícil ganhar aos estudantes, mas só após o golo da Académica os adeptos portistas se lembraram do último jogo do Campeonato com os mesmos protagonistas…
FC Porto 2 – Académica 1
Estádio das Antas (Porto)
Árbitro: Manuel Lousada (Santarém)
FCP – Pinho; Virgílio, Miguel Arcanjo e Sarmento I; Eleutério e Monteiro da Costa; Hernâni, Gastão, Jaburu, António Teixeira e Perdigão.
Treinador: Yustrich (brasileiro)
Marcadores: 1-0 Jaburu (17’); 2-0 Jaburu (46’); 2-1 Gil (58’).
13 Mai. – Quartos-de-final: vitória fácil ante “leões” com garra mas sem força para ameaçar os Campeões Nacionais.
FC Porto 5 – Leões de Santarém 1
Estádio das Antas (Porto)
Árbitro: António Calheiros (Lisboa)
FCP – Pinho; Virgílio, Correia e Osvaldo Cambalacho; Eleutério e Monteiro da Costa; Hernâni, Gastão, Jaburu, António Teixeira e Perdigão.
Treinador: Yustrich (brasileiro)
Marcadores: 1-0 António Teixeira (25’); 2-0 António Teixeira (30’); 3-0 Hernâni (44’); 4-0 Jaburu (50’); 5-0 Monteiro da Costa (78’); 5-1 Balugas (82’).
20 Mai. – Meias-finais: jogo em Lisboa perante uma equipa madeirense que, apesar de militar na 2.ª divisão, lutou bravamente com o FC Porto valorizando o triunfo do Campeão. Com esta vitória os portistas chegavam à final da Taça de Portugal pela segunda vez na sua história. Seria desta que o troféu vinha para o Porto? A outra equipa apurada para o encontro no Jamor era o Torreense.
Marítimo 0 – FC Porto 1
Estádio Pina Manique (Lisboa)
Árbitro: Paulo de Oliveira (Santarém)
FCP – Pinho; Virgílio, Miguel Arcanjo e Osvaldo Cambalacho; Pedroto e Monteiro da Costa; Hernâni, Gastão, Jaburu, António Teixeira e José Maria.
Treinador: Yustrich (brasileiro)
Marcadores: 1-0 Hernâni (13’).
Virgílio, Pinho e Osvaldo Cambalacho, esteios da defesa portista, e Jaburu, poderoso avançado, prepararam-se afincadamente para a Final da Taça de Portugal
27 Mai. – FINAL: uma final diferente, com dois clubes da “Província”. Pela primeira vez no historial da Taça nenhuma das equipas finalistas era da “capital do império”. O Torreense chegou ao Jamor depois de eliminar sucessivamente o Desportivo de Beja, o Sporting, o SC Braga e o Belenenses. O Campeão Nacional, o FC Porto, tinha a oportunidade de ganhar o troféu depois de o perder na sua primeira participação numa final, em 1952-53.
Muitos milhares de portistas e portuenses “desceram” a Oeiras. A equipa de Torres Vedras trouxe cerca de 3.000 adeptos para a festa do futebol. Festa que, logo aos 3 minutos, começou a fazer-se com cores azul-e-branco – Hernâni marcou e repetiu a proeza aos 57 minutos na cobrança de uma grande penalidade. A Taça ia para o Porto!
A grande equipa do FC Porto acabava de conseguir dois feitos inéditos: conquistar a Taça de Portugal e fazer a “dobradinha” (Campeonato e Taça). A alegria dos adeptos portistas extravasou do Jamor para o Porto, Norte e País. BIBÓ PORTO!
Pedroto, Gastão, Jaburu e Hernâni (dois golos) foram preponderantes na primeira conquista da Taça de Portugal pelo FC Porto
CAMPEÕES! OS INVENCÍVEIS HOMENS DE YUSTRICH, UMA EQUIPA DE SONHO!
A "dobradinha" e uma equipa extraordinária, treinada por Yustrich, uma das melhores de sempre, vencedora do Campeonato e Taça, em 1955-56. De pé: Manuel Pinho, Pedroto, Monteiro da Costa, Miguel Arcanjo, Osvaldo Cambalacho e Virgílio; em baixo: Hernâni, Gastão, Jaburu, Carlos Duarte e Perdigão.
Dorival Yustrich, o grande obreiro da “dobradinha” de 1955-56, a primeira na história do futebol no Clube
No rescaldo do primeiro título na Taça de Portugal, dois jogadores do FC Porto falaram não contendo o regozijo
Pedroto, bem ao seu estilo, afirmou: “Vencemos com toda a justiça. Gostei bastante do Torreense, que praticou um futebol alegre, rápido e pensado... não precisando sequer de inventar essas desculpas de mau pagador, que são sempre o trunfo dos fracos”.
Por seu turno, Hernâni, o herói do jogo, declarou: “Foi um grande triunfo, importante para nós e para o Clube. O FC Porto não brilhou porque os jogadores estavam já desgastados pelo Campeonato. Daí as dificuldades que sentimos para chegar à vitória”.
Um vencedor – Dorival Yustrich, o controverso treinador, era um grande líder de homens e muito querido entre os adeptos. Uma equipa com talento e bem comandada foi a receita para quebrar o prolongado jejum
Primeira Taça – Na Sede do FC Porto, o capitão Virgílio fala da sua satisfação pela conquista da primeira Taça de Portugal
Troféu Martini – Virgílio Mendes, prestigiado internacional e capitão da equipa do FC Porto, ergue nas Antas o troféu instituído na época 1955-1956 para a equipa com melhor "goal-average" no campeonato: FC Porto, 77 golos marcados e 20 sofridos. O melhor ataque e a melhor defesa.
Após as vitórias no Campeonato e na Taça, uma numerosa comitiva do FC Porto partiu para o Brasil e Venezuela. A viagem haveria de ficar marcada pelo mau génio de Yustrich. Uma autêntica novela...
Digressão ao Brasil e à Venezuela
18 Jun. 1956 — No jogo de estreia da digressão ao Brasil, o FC Porto perdeu com o Fluminense, por 3-0. Yustrich causou problemas ao tratar a Imprensa carioca como já tratara a portuguesa. “O moço mau, dono do Porto, ofendeu e expulsou a crónica do Rio” — escreveu-se num dos jornais locais. Neste encontro com o “Flu”, Pinho (guarda-redes portista) ficou conhecido pelo epíteto de “Rato do Maracanã” por causa das sensacionais defesas que efectuou!
Pinho, guardião e herói portista no “imenso” Maracanã!
Por cada um dos quatro jogos a realizar por Terras de Vera Cruz, os portistas receberam 450 contos. E, à chegada ao Rio, já o empresário José da Gama tinha depositado, num banco local, à sua ordem, 950 contos. A partida com o Fluminense levou mais de 100 mil pessoas ao Maracanã e gerou a maior receita de bilheteira até então registada em campos brasileiros em jogo entre clubes: 2.900.000 cruzeiros, quase 3000 contos!
Ainda no Rio, o Vasco da Gama venceu o FC Porto, por 2-1. E com o Corinthians, novo desaire (2-5). Três dias depois, em Minas Gerais, finalmente uma vitória: 2-1 ao América Mineiro! Razão para Yustrich dar um inesperado ar de simpatia, oferecendo um jantar à equipa, em sua casa, andando ele próprio, vestido de… cozinheiro, a servir à mesa!
[Digressão ao Brasil e à Venezuela - In “História de 50 Anos do Desporto Português” - Adaptação]
“V Pequena Copa do Mundo”, na Venezuela
Em Junho e Julho de 1956 foi disputada em Caracas, Venezuela, a “V Pequena Copa do Mundo”, com a participação do FC Porto, AS Roma (Itália), Vasco da Gama (Brasil) e Real Madrid (Espanha). Saiu vencedor da competição o “colosso” espanhol.
Mas durante o torneio despontou uma estrela: o guarda-redes portista Acúrsio, que, de parceria com Di Stéfano, foi considerado um dos dois indiscutíveis na selecção da “Pequena Taça do Mundo”!
Resultados de todos os jogos:
FC PORTO (POR) 1 - 1 AS ROMA (ITA)
30/06/1956
Golos: António Teixeira, Nyers (penalti).
FC Porto: Acúrsio; Virgílio, Miguel Arcanjo, Osvaldo Cambalacho; Pedroto, Monteiro da Costa; Hernâni, Gastão, Jaburu, António Teixeira, Jose María.
AS Roma: Panetto; Cardoni, Losi, Allioni; Stucchi, Giuliano; Ghiggia, Pristini, Dino da Costa, Barbolini, Lojodice.
VASCO DA GAMA (BRA) 2 - 5 REAL MADRID (ESP)
01/07/1956
VASCO DA GAMA (BRA) 3 - 0 FC PORTO (POR)
03/07/1956
Árbitro: Hector Osório
Golos: Sabara 03’, Vavá 28’, Vavá 65’.
Vasco da Gama: Carlos Alberto; Darío, Belini; Orlando, Learte e Coronel; Sabara, Vavá, Pinga, Walter e Djair.
FC Porto: Acúrsio, Virgílio e Miguel Arcanjo (Sarmento), Osvaldo Cambalacho, Pedroto, Monteiro da Costa, Hernâni, Gastão (Eleutério), Jaburu, António Teixeira, José Maria.
REAL MADRID (ESP) 1 - 2 AS ROMA (ITA)
04/07/1956
VASCO DA GAMA (BRA) 3 - 1 AS ROMA (ITA)
07/07/1956
REAL MADRID (ESP) 2 - 1 FC PORTO (POR)
08/07/1956
Golos: Jaburu 27’, Rial 34’, Joseito 80’.
Árbitro: Lires López (ARG)
Real Madrid : Alonso; Atienza, Marquitos, Lesmes; Muñoz (Manolin 69´), Zarraga; Joseito, Marsal (Molowny 71´), Di Stefano, Rial, Gento (Casado).
FC Porto: Acursio; Virgílio, Miguel Arcanjo, Osvaldo Cambalacho; Eleutério, Monteiro da Costa; Hernâni, José Maria, Jaburu, António Teixeira, Perdigão.
VASCO DA GAMA (BRA) 0 - 1 FC PORTO (POR)
10/07/1956
Golos: Monteiro da Costa 42’
Vasco da Gama: Carlos Alberto, Dario, Bellini, Coronel; Laerte, Orlando; Sabara, Vavá, Pinga, Walter, Djair.
FC Porto: Acursio; Sarmento, Miguel Arcanjo, Osvaldo Cambalacho; Eleutério, Hernâni; Monteiro da Costa, Gastâo, Jaburu, Perdigão, José Maria.
AS ROMA (ITA) 1 - 2 REAL MADRID (ESP)
12/07/1956
VASCO DA GAMA (BRA) 2 - 1 AS ROMA (ITA)
14/07/1956
FC PORTO (POR) 1 - 2 REAL MADRID (ESP)
15/07/1956
Árbitro: Lires López (ARG)
Golos: Rial 10’, Hernâni 36’, Marsal 50’
FC Porto: Acursio; Virgílio, Miguel Arcanjo (Sarmento), Osvaldo Cambalacho; Eleutério, Monteiro da Costa; Hernâni, José María, Jaburu, Nelson, Perdigão.
Real Madrid: Alonso; Atienza, Marquitos, Lesmes; Muñoz, Zarraga; Joseito, Marsal, Di Stefano (Olsen), Rial (Molowny), Gento.
AS ROMA (ITA) 0 - 1 FC PORTO (POR)
17/07/1956
Golos: Jaburu 49’
AS Roma: Tesari; Giuliano, Detoni, Alloni; Eliani, Guarnacci; Lojodice, Pistrin, Pregna, Barbolini, Dino da Costa.
FC Porto: Acursio; Virgílio, Osvaldo Cambalacho, Eleutério; Sarmento, Monteiro da Costa; Hernâni, Gastão, Jaburu, Perdigão, Nelson.
VASCO DA GAMA (BRA) 2 - 2 REAL MADRID (ESP)
19/07/1956
Classificação final da “V Pequena Copa do Mundo”
1 - Real Madrid: 6 jogos– 4V 1E 1D – Golos 14-9 – 9 pontos
2 - Vasco da Gama: 6 jogos – 3V 1E 2D – Golos 12-10 – 7 pontos
3 - FC Porto: 6 jogos – 2V 1E 3D – Golos 5-8 – 5 pontos
4 - AS Roma: 6 jogos – 1V 1E 4D – Golos 6-10 – 3 pontos
O mau génio de Yustrich e o seu despedimento
A digressão do FC Porto ao Brasil e à Venezuela rendeu bom dinheiro. A tesouraria ficou mais desafogada. Mas a viagem, que se previra fosse de apoteose para os campeões de Portugal, acabou toldada por cenas lamentáveis protagonizadas pelo treinador Dorival Yustrich, fruto do seu temperamento difícil, irascível e conflituoso. Tesoureiro portista ameaçado, presidente insultado e outras coisas mais. Tudo tendo como “autor e actor” o “Homão”!
À chegada ao Brasil, ainda no Aeroporto do Galeão, o primeiro incidente envolvendo Yustrich: Pedroto ficara a conversar com seu irmão, residente no Rio, e o técnico mandou que o autocarro partisse sem ele. Cesário Bonito, o presidente, solicitou ao treinador que não fosse tão intransigente, que percebesse que há alturas em que os sentimentos não se podem refrear…
Mais pólvora para a fogueira, a 18 de Junho, no jogo de estreia. Os portistas perderam por 0-3, com o Fluminense, Yustrich hostilizou a imprensa brasileira, pondo fora do autocarro do clube dois jornalistas cariocas que o presidente autorizara viajassem com a equipa, bradando que quem mandava ali era ele. “O moço mau, dono do Porto, ofendeu e expulsou a crónica do Rio” — escrever-se-ia, no dia seguinte, num dos mais populares jornais do Rio.
Do Brasil seguiram os portistas para a Venezuela. Empate com o Roma (1-1), derrota com o Vasco da Gama (0-3) e Yustrich outra vez embrulhado em tortuosas linhas de polémica. E de desacerto! Quando o presidente explicava a um jogador que não estava a ser justo ao criticar a qualidade do hotel, Yustrich, saindo do quarto, dirigiu-se-lhe em modo crispado e agressivo: “O senhor não tem o direito de se dirigir aos jogadores. Está a exorbitar das suas funções. Procedeu como qualquer moleque.” E quando Cesário Bonito lhe pediu que se calasse, para não agravar mais a sua situação, Yustrich retorquiu, aos gritos: “Não tenho nada que lhe obedecer, não sou seu filho, nem sou seu empregado...”
Ainda em Caracas, antes do seu regresso a Minas Gerais (Brasil), para férias, Yustrich, envolveu-se em discussão com Zagalo de Lima, chamando-lhe... “cavalo”. E, depois, completamente fora de si, segurando-o pelos colarinhos da camisa de seda, disparou, furibundo: “Se fosse mais homem atirava-o pela janela abaixo.” Mais se irritou quando o tesoureiro lhe recusou os 250 contos de luvas pelo contrato para a época seguinte. Por essa altura, era já acusado de se ter apoderado de 17 contos de bilhetes vendidos para um jogo de “solteiros e casados” organizado, como festa de fim de temporada, pelos jogadores do FC Porto!
Perante tal, foi sem surpresa que a Direcção de Cesário Bonito mal chegou a Portugal decidiu rescindir, unilateralmente, o contrato com Dorival Knippel, substituindo-o por Flávio Costa que, desse modo, trocava o cargo de seleccionador brasileiro pelo de treinador do FC Porto na próxima época (1956-1957). Exigia 250 contos de luvas e um ordenado mensal de 40 contos. Mas, em longa negociação por telefone, em linha directa Porto/Rio de Janeiro, acabou por aceitar a última proposta de Cesário Bonito: 200 contos de luvas e 23 contos por mês.
Simultaneamente abriu-se um complexo processo judicial: Yustrich exigiu ao clube a exorbitante verba de 650 contos de indemnização por danos morais e materiais causados!
- No próximo post.: Capítulo 6, 1951 a 1960 – Contestação a Lisboa; a “dobradinha” (Parte XXV) – Época 1955-56 (continuação); um treinador que revolucionou o futebol portista; biografia de Yustrich.
Caros leitores: por escassez de tempo e imperativos com a rubrica de que sou co-autor (“Manto Azul e Branco”), a publicação da história do “FC Porto – Dragões de Azul Forte” é suspensa temporariamente. Obrigado pela V/compreensão. Até “ao regresso”, um abraço.
Fernando Moreira (Dragão Azul Forte)