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Assunto que passou um pouco ao lado da bluegosfera e das redes sociais portistas. Quaresma sai de fininho, pela bruma, para a Turquia, por um valor em nada condizente com a sua real valia. O adeus de um génio não pela porta pequena, mas pela porta grande dos fundos, como dizia um dia Miguel Sousa Tavares sobre os últimos dias de José Mourinho no FC Porto.
É difícil ficar do lado de Quaresma depois de tantas e tantas asneiras que o próprio sabe que cometeu. Expulsões várias, indisciplinas perante o treinador, abraços a Jorge Jesus, elogios ao homem da Reboleira em detrimento de Mourinho, comentários sobre a mística do balneário portista, auto-proclamações do que é o Ser Porto, etc. Num clube onde por hábito e vocação os jogadores devem falar pouco à comunicação social, Quaresma sempre fugiu à regra, dando entrevistas fora do óbvio e do politicamente correcto. A capa à revista Cristina é também disso maior exemplo.
E, assim mesmo, Quaresma merece uma palavra em sua defesa e valorização. E merece, acima de tudo, gratidão e não um qualquer desinteresse e alheamento face à sua saída, como se se tratasse de um qualquer ou de “mais um”.
Na Faculdade de Direito sempre ensinam a “trata igual o que é igual e diferente o que é diferente”. E Quaresma é, de facto, diferente. Especial. Único. Irrepetível. Inimitável.
Quaresma provavelmente terá conseguido dar nome a um gesto técnico. Picar a bola num penalty não é picar a bola, é antes uma Panenka, em homenagem ao génio checo. A trivela, para mim, deixou de ser um remate de 3 dedos. A trivela agora chama-se quaresma. E provavelmente daqui a muitos anos, quando um miúdo num qualquer recreio de escola de um país rematar ou cruzar assim uma bola, alguém dirá: “que grande quaresma!”
Da segunda passagem de Quaresma pelo nosso clube sobram coisas boas e coisas menos boas, como em tudo. Mas há algo que não pode ser esquecido: quando muitos diziam que estava morto para o futebol, que estava gordo, que estava cheio de lesões, Quaresma reergue-se das trevas e mostrou que não fica a dever nada, bem pelo contrário, às novas “estrelas” Brahimi e Tello. Mais: conseguiu ser mais regular que eles, o que no caso de Quaresma acaba por ser curioso.
Episódios para lembrar há para todos os gostos: a estreia na Luz e, no primeiro toque na bola, uma finta desconcertante e uma desmarcação em trivela para Jackson; o golo pleno de raiva ao Athletic Bilbao; a obra-prima de Nápoles; a trivela desconcertante ao Paços de Ferreira; a exibição portentosa (talvez a melhor da sua carreira) e os dois golos – um deles de trivela – frente ao Bayern de Neuer.
Nesta (talvez) sua última aparição pelo futebol português, Quaresma saldou todas as dívidas e dúvidas que sobre ele pendiam. Mostrou que continua a ser, depois de Cristiano, o melhor extremo nacional. E eliminou de uma vez por todas os seus fantasmas, mostrando nos jogos grandes, em dias de Champions, o verdadeiro craque que é. Fica por isso difícil de entender esta saída. Antigamente, o Porto era a cidade onde todo e qualquer jogador irreverente despertava para a alta competição e para a obrigação de ter que ganhar todos os jogos. Foi assim com Futre, com Madjer, com Carlos Alberto, Maniche, entre muitos outros jogadores que só no Porto conseguiram atingir o seu pico de forma. A saída de Quaresma representa o momento em que o nosso clube assume que já não é mais esse clube, que já não consegue ser diferente, que já não consegue pegar naqueles que são diferentes e difíceis e fazê-los voar sob o dorso do Dragão. Na prática, o Porto desistiu de Ricardo Quaresma.
Mas o Cigano quase parece ser como os gatos, possuidor de 7 vidas e por isso será prematuro fazer-lhe o funeral. Conquistou de novo a plateia azul e branca, tendo até surgido uma espécie de FC Quaresma, que se critica, é certo, mas que tem que ser vista à luz do que é o FC Porto actual: órfão de referências, depois da saída algo envergonhada de Lucho Gonzalez, o número 7 portista surgia como o ídolo dos sócios, o jogador mágico, o artista, o vadio indomável que vestia de azul e branco e que se declarava morto de amores pelo clube, o homem cujo estilo de jogo se assemelha mais aos recreios e às ruas da nossa infância do que ao moderno futebol de força, atletismo e potência. Quaresma mais não faz do que nos recordar sempre, em cada lance, dessa criança que vive dentro de nós a fintar tudo e todos no recreio da escola.
Quaresma representa isso. A magia. A imprevisibilidade. A espontaneidade. A irreverência. A arte dentro do desporto. Pode não chegar para ter lugar no FC Porto de Lopetegui, mas terá certamente lugar no panteão dos imortais do futebol português.
Até sempre, Harry Potter!
Rodrigo de Almada Martins
É difícil ficar do lado de Quaresma depois de tantas e tantas asneiras que o próprio sabe que cometeu. Expulsões várias, indisciplinas perante o treinador, abraços a Jorge Jesus, elogios ao homem da Reboleira em detrimento de Mourinho, comentários sobre a mística do balneário portista, auto-proclamações do que é o Ser Porto, etc. Num clube onde por hábito e vocação os jogadores devem falar pouco à comunicação social, Quaresma sempre fugiu à regra, dando entrevistas fora do óbvio e do politicamente correcto. A capa à revista Cristina é também disso maior exemplo.
E, assim mesmo, Quaresma merece uma palavra em sua defesa e valorização. E merece, acima de tudo, gratidão e não um qualquer desinteresse e alheamento face à sua saída, como se se tratasse de um qualquer ou de “mais um”.
Na Faculdade de Direito sempre ensinam a “trata igual o que é igual e diferente o que é diferente”. E Quaresma é, de facto, diferente. Especial. Único. Irrepetível. Inimitável.
Quaresma provavelmente terá conseguido dar nome a um gesto técnico. Picar a bola num penalty não é picar a bola, é antes uma Panenka, em homenagem ao génio checo. A trivela, para mim, deixou de ser um remate de 3 dedos. A trivela agora chama-se quaresma. E provavelmente daqui a muitos anos, quando um miúdo num qualquer recreio de escola de um país rematar ou cruzar assim uma bola, alguém dirá: “que grande quaresma!”
Da segunda passagem de Quaresma pelo nosso clube sobram coisas boas e coisas menos boas, como em tudo. Mas há algo que não pode ser esquecido: quando muitos diziam que estava morto para o futebol, que estava gordo, que estava cheio de lesões, Quaresma reergue-se das trevas e mostrou que não fica a dever nada, bem pelo contrário, às novas “estrelas” Brahimi e Tello. Mais: conseguiu ser mais regular que eles, o que no caso de Quaresma acaba por ser curioso.
Episódios para lembrar há para todos os gostos: a estreia na Luz e, no primeiro toque na bola, uma finta desconcertante e uma desmarcação em trivela para Jackson; o golo pleno de raiva ao Athletic Bilbao; a obra-prima de Nápoles; a trivela desconcertante ao Paços de Ferreira; a exibição portentosa (talvez a melhor da sua carreira) e os dois golos – um deles de trivela – frente ao Bayern de Neuer.
Nesta (talvez) sua última aparição pelo futebol português, Quaresma saldou todas as dívidas e dúvidas que sobre ele pendiam. Mostrou que continua a ser, depois de Cristiano, o melhor extremo nacional. E eliminou de uma vez por todas os seus fantasmas, mostrando nos jogos grandes, em dias de Champions, o verdadeiro craque que é. Fica por isso difícil de entender esta saída. Antigamente, o Porto era a cidade onde todo e qualquer jogador irreverente despertava para a alta competição e para a obrigação de ter que ganhar todos os jogos. Foi assim com Futre, com Madjer, com Carlos Alberto, Maniche, entre muitos outros jogadores que só no Porto conseguiram atingir o seu pico de forma. A saída de Quaresma representa o momento em que o nosso clube assume que já não é mais esse clube, que já não consegue ser diferente, que já não consegue pegar naqueles que são diferentes e difíceis e fazê-los voar sob o dorso do Dragão. Na prática, o Porto desistiu de Ricardo Quaresma.
Mas o Cigano quase parece ser como os gatos, possuidor de 7 vidas e por isso será prematuro fazer-lhe o funeral. Conquistou de novo a plateia azul e branca, tendo até surgido uma espécie de FC Quaresma, que se critica, é certo, mas que tem que ser vista à luz do que é o FC Porto actual: órfão de referências, depois da saída algo envergonhada de Lucho Gonzalez, o número 7 portista surgia como o ídolo dos sócios, o jogador mágico, o artista, o vadio indomável que vestia de azul e branco e que se declarava morto de amores pelo clube, o homem cujo estilo de jogo se assemelha mais aos recreios e às ruas da nossa infância do que ao moderno futebol de força, atletismo e potência. Quaresma mais não faz do que nos recordar sempre, em cada lance, dessa criança que vive dentro de nós a fintar tudo e todos no recreio da escola.
Quaresma representa isso. A magia. A imprevisibilidade. A espontaneidade. A irreverência. A arte dentro do desporto. Pode não chegar para ter lugar no FC Porto de Lopetegui, mas terá certamente lugar no panteão dos imortais do futebol português.
Até sempre, Harry Potter!
Rodrigo de Almada Martins