14 setembro, 2013

O FC Porto e a Selecção Nacional

http://bibo-porto-carago.blogspot.pt/

Disse Licá depois da sua estreia coma a camisola das quinas que se sentia “diferente”. É justo. Acabadinho de chegar do Estoril, o homem de Castro D’Aire tem protagonizado um arranque fulgurante de Dragão ao peito, que lhe valeu a chamada à Selecção. Contudo, Licá não percebeu bem o problema. Não é ele que está diferente, a camisola é que mudou. Só um distraído não poderia ver a qualidade que este extremo passeava nos relvados portugueses. E se isso se admite num qualquer treinador de bancada que não tenha tempo ou paciência para ver os jogos do Estoril, do Gil Vicente ou do Paços de Ferreira, já não se admite a um seleccionador ou a uma estrutura federativa.

Os seleccionadores estão lá exactamente para seleccionar, escolher, distinguir entre muitos aqueles que se destacam. Se apenas servem para chamar os Cristianos Ronaldos, os Nanis e os Pepes, para isso demitam o seleccionador, poupem um (chorudo) salário e passem a fazer a convocatória através de voto por SMS. Fazer até, quem sabe, um reality show. Daí que não surpreenda que esta Selecção “de todos nós” só consiga ganhar jogos às habituais Irlandas, Coreias, Cazaquistão e Israel. Com tamanha falta de visão e de trabalho de campo, é fácil de perceber a continuidade de jogadores como João Pereira, Ruben Amorim, entre outros, na lista de seleccionáveis.

E o que se disse sobre Licá, vale para Varela, Josué, Neto, etc. Enquanto “penam” pelos clubes pequenos, são praticamente invisíveis, desprezados. Quando chegam a um grande ou a um famoso clube europeu, tornam-se escolhas óbvias. Até João Moutinho, por exemplo, que nem sequer foi convocado para o Mundial na África do Sul, teve que vir para o FC Porto para se torna um indiscutível nacional.

Vai daí que não se percebam as palavras de Paulo Bento nos últimos dias. Diz esse grande treinador da bola que “alguns iluminados” não são agradecidos para com Scolari. Bento, pelo seu lado, tem “muito a agradecer ao treinador brasileiro”, segundo o próprio, por ter sido “o seleccionador nacional mais vitorioso”. Todos percebemos onde quer chegar Bento com os iluminados. A crescente agressividade manifestada por Bento para com o Presidente do FC Porto e, consequentemente, para com os portistas, soa a insultuosa para quem tem dado tanta matéria-prima ao longo dos anos à Selecção Nacional. Trazendo à colação as sábias palavras do capitão português, “não se deve cuspir no prato onde se come”.

TTalvez convirá recordar o Sr. Paulo Bento que o tal “seleccionador mais vitorioso” só chegou à Final do Euro 2004 quando, depois do desaire inaugural frente à Grécia, lá se decidiu a colocar em campo os Campeões da Europa de Clubes. Nos lugares de Couto, Rui Jorge, Petit e Rui Costa, surgiram, para alegria dos inteligentes e tristeza dos outros, Carvalho, Valente, Costinha e Deco. Porque os Maestros, apesar de bons, não são Mágicos. E assim se criou uma Selecção quase vencedora. Quase... porque infelizmente não se pôde naturalizar um Alenitchev, um Carlos Alberto, um McCarthy e um... Baía.

Convém também dizer ao Sr. Bento, que se sentiu tão orgulhoso por ser a segunda escolha da FPF depois de Mourinho, que o brasileiro que nos treinou mais não fez do que servir-se do trabalho do Special One. O Sr. Bento, aliás, não tem que fazer vénias nem que dar graxa a esse brasileiro. No fundo, são de qualidade equivalente. Quer com Portugal, quer no Chelsea, quer nas Arábias, Scolari mais não fez do que quase ganhar alguma coisa. O mesmo que Bento no Sporting. A não ser que deva ser dado mérito muito grande a alguém que ganhou um Campeonato do Mundo com Roberto Carlos, Kaká, Rivaldo, Ronaldinho e Ronaldo na melhor forma de sempre. Bento não tem, por isso, de ser o lambe-botas de ninguém.

Se a troca de palavras entre Seleccionador e a estrutura portista se compreendeu após o tristemente célebre jogo no Gabão, onde Moutinho foi forçado a um esforço sobre-humano e o nosso Presidente mostrou a sua indignação, as palavras do Sr. Bento desta feita surpreendem pela dureza e agressividade, tendo em conta que ninguém lhe apontou ou criticou fosse o que fosse. Se o Seleccionador incutisse nos seus jogadores a mesma agressividade que incute quando se refere ao FC Porto, talvez tivéssemos saído de Boston de cabeça erguida. Mas como assim não é, e porque o País Irmão não é tão irmão assim e tem Neymar, viemos mais uma vez com três no saco, bico calado e “a derrota foi o melhor que nos aconteceu”. Cabecinha baixa e voltemos ao nosso campeonato, contra as Irlandas, os Lichtensteins, os San Marinos e os Luxemburgos. As tais equipas a quem CR7 tantos golos marca, deixando Eusébio triste com as comparações e gerando um aceso debate de Estado, com jornalistas a perguntarem a notáveis qual deles o melhor, sondagens em jornais de grande tiragem, dúzias de colunistas a esmiuçarem o tema, nenhum dizendo claramente o óbvio: faltou a Eusébio o poder de encaixe para assumir a ultrapassagem por parte de Cristiano Ronaldo; ficou-lhe mal o amuo e a tristeza; não foi elegante como Maradona e como Platini que, com declarações inteligentes, disseram que Messi e Zidane eram melhores, mesmo que no seu intímo não o achassem.

A falta de trabalho de campo e de visão periférica não é pecha apenas da FPF. Também a CBF, pelos vistos, sobre do mesmo mal. Se o Brasil não quiser ter no Campeonato do Mundo laterais a e dar golos de bandeja (Maicon a Meireles), talvez possa dignar-se a dar uma oportunidade a Danilo e a Alex Sandro. Mas todos sabemos, como é óbvio, que isso jamais vai acontecer. Ter que convocar o Hulk já deve doer muito àquele senhor...

É caso para dizer... E o burro sou eu?

Completaram-se 25 anos que Baía se estreou nas balizas nacionais, num Vitória de Guimarães – FC Porto. O melhor guarda-redes português de sempre teve um carreira ímpar, sendo ainda hoje o futebolista com mais títulos conquistados, distribuídos entre FC Porto e Barcelona. Dele disse um dia Valdano que “até a frangar tem estilo”. E tinha razão.

Odiado por uns, amados por outros, Baía deixou sempre uma marca de classe por onde passava.

Passou por Barcelona na altura errada, quando ainda não havia Ronaldinhos nem Messis e Van Gaal ditava as suas leis. Exímio nas saídas a cruzamentos, fantástico a fazer a mancha, reflexos suficientes para reagir rapidamente debaixo dos ferros, jogo de pés aceitável para a época, brilhante no comando da defesa, símbolo do FC Porto, inspirador de respeito perante os rivais, Capitão em todas as horas.

Também teve os seus maus momentos: a lesão no joelho, a discussão com Mourinho no Bessa, os frangos que às vezes dava, a terrível injustiça e traição de que foi alvo por parte da FPF, o desmaio em Yokohama. Mas tinha uma característica ímpar. Nos jogos a sério tranformava-se. De negro equipado, na Champions ou pela Selecção, a sua áurea crescia, a sua classe inundava o relvado e fazia defesas do outro mundo.

Essas defesas deram-nos Sevilha e Gelsenkirchen. Da minha parte, escolho o jogo de Manchester como aquele que mais nos marcou. Até ao mítico golo de Costinha, foi ele quem segurou a eliminatória até aos últimos minutos. Saídas a cruzamentos, manchas fantásticas, reflexos entre os postes. Em Old Trafford ascendeu, para mim, ao Olimpo. Afinal de contas, já não era um grande guarda-redes. Era um mito. Uma lenda, mas ainda em acção. E até na saída, com a passagem de testemunho para o então jovem Helton, mostrou o que nele era inato: classe e elegância.

Obrigado, Vítor Baía!

2 comentários:

  1. Mais uma análise plena e estupidamente bem escrita.Parabéns ao seu autor.Estou de acordo com tudo o que refere.

    ResponderEliminar
  2. 100% de acordo.

    Parabéns pelo artigo!

    Abraço

    ResponderEliminar