01 fevereiro, 2013

"Antes que fales, vê o que dizes"

http://bibo-porto-carago.blogspot.pt/


“Não fui sempre feliz no FC Porto. Nesse clube os jogadores dão muito e recebem pouco.”
Rabah Madjer, entrevista à Onze Mondial em Fevereiro de 1988 (aquando do empréstimo ao Valência)

Sim, jogadores que mandam “bolas ao poste” com o microfone à frente não são moda recente... Lembrei-me de destacar esta “pérola” do homem do Calcanhar de Ouro, cuja entrevista à Onze Mondial de que acima falo é simplesmente demolidora para com o Clube que o resgatou ao exílio e lhe deu a oportunidade de conquistar o Mundo. Na altura o nosso Rabah pensava que iria directo para Munique no final da época mas, ironia das ironias, acabou mesmo por voltar ao FC Porto! E o tempo tudo curou e hoje é um caso mais que encerrado.

Assim de memória também poderia relembrar outras novelas mediáticas que foram acontecendo com outros grandes nomes da nossa história, como o Vítor Baía e a sua entrevista ao “proibido” jornal Record em pleno caso com Mourinho ou o António Oliveira a pedir desculpas em directo ao João Vieira Pinto e ao Benfica no pós clássico de 1998. Ou ainda as novas versões, que envolvem papás e empresários, cujas menções honrosas no nosso passado recente iriam sem dúvida para o sr. Washington Alves e para o Marcelo “até ia a nado para Valência desde a Venezuela” Simonian.

Portanto estas coisas tem sempre de levar o devido desconto, basicamente sempre foi assim, mas lá que custa ter de aturar algumas mimalhices e parvalheiras lá isso custa...

Obviamente que esta crónica surge na sequência das infelizes declarações de um mais do que provável futuro jogador de seu nome Hector Herrera e também da concretização do empréstimo do rei do “twitter de intervenção”, Juan Manuel Iturbe.

Apesar destes casos incómodos, hoje os jogadores estão quase isolados dos Media tradicionais, sendo impossível vê-los num “Domingo Desportivo” ou numa entrevista sem guião como há 10 ou 15 anos e participando apenas em flash interviews e conferências de imprensa pontuadas por um conjunto enervante de lugares comuns absolutamente vazios de interesse. Percebe-se o porquê, infelizmente a maioria não acrescenta nada e é um risco para a "normalidade institucional". Se todos fossem como por exemplo o Xavi do Barcelona, cuja entrevista absolutamente fantástica ao Guardian em 2011 nunca mais me saiu da memória, as coisas seriam mais fáceis de gerir, mas com tanto em jogo os clubes preferem jogar pelo seguro e controlar o máximo possível, o que se acaba por entender.

No entanto e não obstante todo este controlo, sob a forma de entrevista a órgãos de comunicação do país natal, twitter, facebook, instagram, empresário ou progenitor, existem sempre formas de “meter a pata na poça”, o que me leva a considerar o seguinte: mais do que a mera imposição de regras, os dirigentes e treinadores têm de ser profiláticos e capazes de elucidar os nossos profissionais (muitos deles bastantes jovens, pouco “batidos” e demasiado mimados pelo excesso de dinheiro e protagonismo) do que é o FC Porto e qual é a “cultura organizacional” dos seus associados e adeptos.

Será possível que quem foi contratar o Herrera não sabe o que os Portistas esperam de um reforço e não o soube aconselhar para não dizer disparates logo à primeira entrevista? Não quero acreditar nisto, espero que estejamos melhor servidos de Portismo, mas já que estou lançado a escrever dou uma pequena ajuda para casos futuros. Longe de mim pretender falar por todos nós, membros da família azul e branca, mas a mim bastavam-me ouvir coisas minimalistas como as seguintes, aqui “encenadas” a título de exemplo:

Cenário 1 – Jovem promessa estrangeira que assina pelo FC Porto
“Estou muito contente por dar este passo e juntar-me a um clube com tanta história e com tantas conquistas, o melhor de Portugal e um dos clubes de top na Europa. Sei que será um grande desafio ganhar o meu espaço numa equipa que tem conquistado tantas coisas mas acredito no meu valor e quero ajudar a mais vitórias. Se espero seguir os passos do Falcao, Pepe, Deco e tantos outros? Claro que gostava de ter o percurso que todos eles tiveram no FC Porto, onde cresceram como jogadores e participaram de tantas vitórias… Se depois o clube puder fazer um grande negócio comigo tanto melhor, mas para já tenho é de estar à altura deste grande clube, que joga sempre para ganhar em todas as competições.

Cenário 2 – Jogador que tem estado “encostado” entre o banco e a bancada
“De facto gostava de jogar mais, obviamente que sim, mas tenho que entender as escolhas do treinador e respeitar os meus colegas, que tem valor e estão a jogar muito bem. A mim cabe-me dar o máximo diariamente, a época é longa e temos de estar todos preparados para poder render quando formos chamados. O colectivo é o mais importante, uma equipa não são só 11 e sinto-me contente por fazer parte deste grupo campeão e dar o meu contributo todos os dias. Fala-se que há interesse de outros clubes? Fico contente que se lembrem de mim mas quero muito ser bem-sucedido aqui e conquistar muitas coisas. Além disso, essas decisões cabem em primeiro lugar ao clube e não a mim.”

Cenário 3 – Vedeta consagrada, com meia Europa atrás
“Fala-se de muita coisa mas eu continuo tranquilo, estou num dos melhores clubes da Europa, que me permite lutar por todos os troféus e sou muito bem tratado por todos. Se não está na hora de sair e entrar para a lista dos negócios milionários do FC Porto? Não sei, isso tem de ser o clube a decidir, obviamente que o FC Porto luta com os maiores porque tem a capacidade de potenciar jogadores e fazer grandes negócios, agora não me cabe a mim tomar essas decisões. Contratos milionários à espera? Felizmente não posso dizer que ganho mal por aqui, até seria pecado dizer uma coisa dessas por isso não me preocupa!”

Portanto, eu não espero gente a “bater no peito”, de lágrimas nos olhos a jurar amor eterno, só gente minimamente inteligente e um ambiente mais saudável e racional em torno do nosso futebol. Para romantismos já tivemos o outro, estamos vacinados... Se até aquele que podia ser considerado como “um de nós” se pós a milhas à primeira oportunidade, como poderia exigir que a malta de Buenos Aires, Montevideo, São Paulo e coisas parecidas fossem diferentes?

Agora uma coisa é certa, mesmo que ao entrar no Dragão já vejam o Santiago Bernabéu, que o banco e a bancada metam nojo ou que tenham um cofre cheio de notas e um harém à espera numa Premier League qualquer, o respeito pelo jogo e pelos adeptos tem de sempre o mais importante. Seja onde for, é o símbolo que está na parte da frente da camisola que mais importa, não o nome atrás… E para isso não bastam regras e guiões, quem tem de se assumir e liderar pelo exemplo, guiando e educando estes jovens são mesmo os dirigentes e técnicos, mesmo que o acto de “cultivar espírito FC Porto” não seja objecto de distribuição de dividendos ou prémios de produtividade! E se precisarem de ajuda não precisam de ir muito longe, basta atravessar a rua e ir até ao Dragão Caixa, onde com bem menos se vive muito mais!

Boa sexta-feira e desde já os votos de um bom fim de semana!

8 comentários:

  1. Excelente artigo, muito bem expresso o sentimento do adepto que vive e se orgulha com as vitórias do seu clube e que, não raras vezes, mitifica e endeusa o (apenas?) mercenário. A HISTÓRIA e a MEMÓRIA de uma agremiação ou clube faz-se daqueles que souberam primeiro interpretar e viver o sentir das massas de apoiantes e, só depois, cuidar dos seus interesses!
    Uma vez mais, as minhas felicitações pelo texto com que nos brinda;

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  2. Uma verdadeira delicia de texto....

    Parabéns!

    FCPORTO !!!!

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  3. Isto é o Porto e era o que se passava até há bem pouco tempo no F.C.P. o porquê de deixar de ser assim é que me intriga...

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  4. Um aplauso enorme ao texto que aqui nos deixas. Concordo em absoluto.

    Os tempos são outros dirão porventura os profissionais que nos dirigem. Mas o nosso Portismo, a forma como tu bem o descreves se algum dia morre na totalidade, estamos perdidos.

    Abraço!

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  5. Extraordinária lição de portismo! É isso mesmo e mais nada!

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  6. Nós não queremos recém-chegados a dizer que “são portistas desde pequeninos”. Mas também não queremos que alguém chegue a dizer que já é do… Real Madrid. Nem 8 nem 80! O que tem de haver, como o autor do texto bem explica, é a capacitação para quem chega que vem para um Clube cujos valores são inalienáveis e indestrutíveis. E para envergar a amada camisola do nosso Clube, tem de respeitar esses valores.

    Excelente texto! Parabéns MM. Abraço AZUL FORTE.

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  7. Silva Pereira02 fevereiro, 2013

    Boa tarde,
    Excelente texto estou cem porcento de acordo.
    Mas meu caro MM (se me permite trata-lo assim) como sabe os profissionais (especialmente jogadores os de futebol) são uma espécime muito singular, praticam um desporto coletivo onde se evidencia o individualismo e por vezes se ultrapassa o interesse coletivo para se evidenciar o ego. Não conheço nenhuma outra atividade (coletiva) em que os seus intervenientes ao falarem deles (próprios) falem na terceira pessoa.
    Acho excelente esses exemplos de entrevista que plasmou no seu texto, espero que os mentores do FCP consigam cada vez mais aproximar os atletas do FCP da excelência do XAVI.
    Mais uma vez os meus parabéns pelo seu texto é destes exemplos e contributos que faz engrandecer o FCP.

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