Dissecando o plantel - parte I

Vamos lá falar de futebol. Do sério. Daquele que nos faz sonhar com feitos heróicos ou sofrer com derrotas inesperadas. O futebol dentro do relvado. Das multidões enlouquecidas, barulhentas. Dos cânticos que nos fazem arrepiar, quando milhares de vozes convergem para o mesmo objectivo: o do apoio incondicional à equipa amada. O defeso é sempre uma época sensaborona, animada de quando em vez por contratações sonantes, mas pouco satisfatória no que toca ao que interessa. O couro a rolar no relvado. As camisolas azuis e brancas entrando no recinto. E aquele impacto que se sente, sempre, de emoção, paixão incondicional. Esse futebol tarda a chegar. Está quase…

Com o Porto em estágio, num local paradisíaco e de reminiscências saborosas, pois foi lá o local de arranque em 2004, antes da epopeia europeia, importa analisar a constituição do plantel, depois das habituais saídas e entradas típicas de cada época.

- baliza

Na baliza, o mesmo de sempre. Helton, veterano de inúmeras batalhas, continuará a ser o guardião dos sonhos, o último obstáculo às investidas adversárias. De pedra e cal na titularidade, o brasileiro de sorriso fácil e dos acordes em guitarras folionas tem tudo para realizar [mais] uma temporada onde a segurança será a palavra-chave do seu dicionário. Como fiel escudeiro, o profissional Nuno.

Nunca o termo profissional terá sido tão bem aplicado. Eternamente relegado para o banco, os queixumes típicos de futebolistas melindrados não fazem parte do reportório do lusitano guarda-redes, continuando a primar pelo afinco nos treinos, aguardando com uma paciência exemplar a sua oportunidade. E, quando ela surge, como na recente final da Taça, Nuno diz presente. E honra aquele símbolo colado na camisola, orgulhando todos os antigos titulares daquelas redes.

Finalizando o trio de guarda-redes, Ventura continuará a sua aprendizagem, bebendo da influência e experiência dos companheiros veteranos. Jovem a quem se augura um futuro promissor, dono de uma estampa física apreciável, Ventura sabe que, um dia, aquelas luvas serão suas. Felino entre os postes, seguro nas saídas aos cruzamentos, elástico na demanda do esférico, o produto das camadas jovens sabe o que se espera de si. Ele é o Eleito. Resta-lhe aguardar…

- defesa

A defesa tem uma história própria, dentro da própria história do clube. Rostos conhecidos, símbolos vivos do clube, fazendo parte da lenda, as defesas portistas são tradicionalmente sinónimo de coesão, segurança e intrepidez. Com a perda do supersónico Bosingwa, seduzido pelas libras inglesas e pela cosmopolita vida de Londres, o clube viu-se na contingência de se reforçar nas laterais. Fucile será, provavelmente, o substituto natural do Zé, habituado a jogar em ambos os flancos. Contará com a concorrência de um promissor lateral romeno, que traz musicalidade no nome. Sapunaru, quase como se fosse um protagonista daqueles desenhos animados japoneses, nome desconhecido para o adepto comum, mas com referências que obrigam a encarar a sua contratação como mais do que um mero capricho. A sua juventude permite-lhe uma margem de progressão interessante. E, bem vistas as coisas, como comentei a um amigo meu, “daqui a 3 anos será vendido por 20 milhões”. Não é essa a sina dos nossos defesas-direitos?

No flanco oposto, Cech recebeu guia de marcha, ficando a incógnita Lino e uma das contratações da temporada, Nelson Benitez, para o reforço do flanco. Desde a saída de Nuno Valente que o Porto tem tido sucessivos flops na escolha para o posto específico. O lado esquerdo da defesa tem visto uma rápida sucessão de caras, provenientes de vários continentes, fracassando estrepitosamente. Será desta, ao ritmo dengoso e lento do tango, que Benitez acaba com a aparente maldição?

Diz-se que no meio está a virtude. Seja. É que será mais fácil atravessar uma auto-estrada em hora de ponta do que ultrapassar os defesas-centrais portistas. De betão. Imagino apenas o medo que provocará a qualquer avançado sentir-se perseguido por alguém da estirpe de Bruno Alves. Autoridade. Imponência. Temeridade. Tudo serve para ilustrar e elogiar uma das defesas menos batidas da Europa. Ao já falado Bruno Alves, o xerife da defensiva, junta-se o capital de experiência de Pedro Emanuel, coração de dragão pulsando no peito, raça indómita na defesa dos ideais do seu clube. Uma dupla ainda para durar. Coesa. A necessária competição interna contará com mais dois nomes. Stepanov, sérvio ainda à procura da total integração, com o rótulo dos 4 milhões que custou a ser difícil de digerir. A seu favor, depois da insipiência do ano de estreia, apenas a memória que nos recorda que tanto Pepe como Bruno Alves tiveram um ano de estreia, de dragão ao peito, pouco conseguido e contestado pelos adeptos.

Foi nesta posição que o Porto foi ao mercado. Bem, na minha opinião. Escolha certeira, acrescento ainda. Rolando tem estampa física. Tem qualidade. É jovem. Internacional pela selecção das quinas. E muito ainda para aprender, é certo. Mas que melhores professores se poderia desejar, para o reforço oriundo do Belenenses, do que aqueles que ele vai encontrar, no dia-a-dia?

As camadas jovens portistas têm sido alvo de comentários, na imensidão do espaço virtual. Nem todos elogiosos. A falta de títulos recentes ajudará à impaciência costumeira dos que apenas querem vitórias, a qualquer custo. Mas os projectos vencedores não nascem do nada. Necessitam de tempo. De maturação. De estratégia. E de muita paciência. Lenta, mas inexoravelmente, as portas do plantel principal abrir-se-ão à qualidade existente na cantera. Nomes não faltam, desejosos de ocupar os lugares dos seus ídolos de adolescência. Tengarrinha vive, para já, esse sonho. Produto das escolas azuis e brancas, faz da polivalência uma das suas principais armas. Central ou médio são os comprovativos da eficácia do antigo júnior, numa aposta que estará por certo inserida no prjecto Visão 611. Depois de Castro e Rui Pedro terem feito parte do plantel 2007/08, Tengarrinha recebeu a sua prenda de Natal. Bem antecipada. Que faça por a merecer.

...continua na próxima semana