13 dezembro, 2008

Contos de uma Familia Portista em 1987

- Ó Bu, conta outra vez aquela história quando quase tiveste de bater na mãe e no Ico, quando eles se portaram mal ao ver o Porto…
- Outra vez ?!!
- Siimmmmmmmmmmmmmmm !!!
(respondem ambas em uníssono)
- Hoje, vou-vos contar outra história.
- E é da mãe ?
- É!
- E o Ico também entra?
- Também
- E o Porto ? O Porto também entra?
- Claro que sim.
- Então está bem, podes contar.
- Nevava, nevava como nas histórias de Natal. E num país muito, muito longe, uma equipa de azul e branco preparava-se para fazer história…
- Era o Porto ? O Porto da mãe ?
- Era, era o Porto da mãe.
- E era no Polo Norte ?
(breve silêncio)
- Não, meninas. Não era no Polo Norte.
- Então ?
- Era no Japão. Do outro lado do mundo.
- Tão loooooonge…
- Era mais engraçado no Polo Norte…
(suspiro)
- Como eu dizia, nevava, e fazia imenso frio. O Porto era Campeão Europeu e estava no Japão para…
- Bu, não foi nesse jogo de Campeão Europeu que a mãe e o…
- Foi… foi nesse mesmo! A vossa mãe e o vosso tio fizeram-me perder a paciência.
- Ah ah ah ah… conta outra vez, Bu.
(silêncio)
- … e estava no Japão para jogar contra uma equipa Uruguaia que se chamava Peñarol de Montevideu, que era o vencedor da Taça Libertadores da América.
- Então este jogo era entre o campeão da europa e o da américa ?
- Precisamente…
- E depois…
- Como vocês sabem, no Japão a hora é diferente. Quando aqui é dia, lá é de noite. Era já muito tarde quando o jogo começou. O nevoeiro e a neve que teimava em cair, quase que não deixavam distinguir as caras dos jogadores…
- Quem eram eles, Bu?
- O Guarda redes era o Mlynarczyk. Na defesa estava o João Pinto, o Geraldão, o Lima Pereira e o Inácio; no meio o Jaime Magalhães, o André, o Sousa e o Rui Barros; lá na frente Madjer e Gomes.
- E o treinador ? Era o Jesualdo?
- Não percebes mesmo nada… era o Mourinho, não era Bu ?
- Não, nem Jesualdo, nem Mourinho.
Era um senhor chamado Ivic, Tomislav Ivic.
- A mãe contou-me uma vez que tinha um peixinho chamado Geraldão e o Ico tinha um chamado Vermelhinho. Era este Geraldão, Bu ?
- Era, era este.
- Que fixe. Eu também tive dois peixinhos, o Deco e o Derlei.
- Algo me diz que foi a vossa mãe que os baptizou, mas adiante. Vocês não querem saber quem ganhou ?
- Siiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiim!
- Onde é que eu ia?
- Nos jogadores, disseste que quase não dava para os ver por causa da neve.
- E já vos disse de que cor era a bola ?
- Não.
- Amarela.
- Porquê?
- Para os jogadores a conseguirem ver.
- E os jogadores não tinham frio ?
- Tinham, claro que tinham. Portaram-se como verdadeiros herois, correndo atrás da bola num relvado que teimava em não a deixar rolar. Estava quase a chegar o intervalo, e não havia golos para ninguem. De repente um jogador chamado Gomes recebe a bola do colega Madjer e marca golo para o Porto. Tive de festejar baixinho, porque a vossa mãe e o Ico estavam a dormir.
- A dormir ?!! Tens a certeza ?
- Com o Porto a jogar? Que estranho…
- Era mesmo muito tarde…
- E tu não lhes foste dizer ?!!
- Não! Queria ver o resto do jogo em paz.
(sorriso…)
- E depois?
- Depois do intervalo, o Porto aguentou o resultado. E quando já nada fazia prever o contrário, os jogadores do Peñarol marcaram um golo…
- Ficaste triste, Bu?
- Fiquei, faltavam apenas 10 minutos e eles tinham empatado o jogo.
- Então foi um empate! Deixa lá, Bu. Um empate entre o campeão da europa e da America não é assim tão mau…
- Era uma final. Um deles tinha de ganhar….
- Fomos aos penalties ? Eu gosto de penalties.
- Não, não fomos aos penalties.
- O árbitro deixou os jogadores descansar um bocadinho e depois chamou os jogadores e deram início ao prolongamento. De repente, o Sousa tira um adversário do caminho, e passa a bola ao Madjer, que conseguindo fintar um defesa adversário, levanta os olhos da bola e apercebeu-se que o guarda-redes Pereira estava adiantado… o resto é história minhas lindas. A bola passou sobre o guarda-redes e apenas descansou no fundo da baliza.
- E depois, Bu? E depois ?
- Fui dizer muito baixinho à mãe e ao Ico que éramos Campões do Mundo, e eles mesmo a dormir, sorriram.
- E eles sonharam com o Porto ?
- Isso, terão vocês de lhes perguntar …
(…)
- Ó Mãeeeeeeeeeeeeeeeeeeee ?!!

E, eu já respondi,
Heliantia.

7 comentários:

  1. Muito bonito o teu conto Heliantia.
    Se quiseres, já tens a primeira-parte dessa madrugada de sonho, feita de sacrifício e heroicidade, no Dragão até à morte.
    Beijinhos e parabéns

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  2. É delicioso recordar coisas assim !
    Eu tambem vi tudo, aqui donde moro tambem era de madrugada, eu nem me podia alvoraçar porque os vizinhos do edificio nem gostariam nada, ou seja até o som estava no minimo e o que dava era ese ruido de fundo que se escuta neste video . E, com a excitaçâo da vitoria já nem deu p'ra dormir. Foi mesmo uma linda noite branquinha de neve e sonito !

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  3. Lindo, heliantia.

    Uma das madrugadas mais belas da minha vida:)

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  4. Viva !

    Parabéns pela estória e pela memória !

    E Viva o Porto !

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  5. Este comentário foi removido pelo autor.

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  6. Vi esse jogo fantástico em casa de um amigo e às 5 da manhã ainda fomos até à baixa festejar.

    Uma das páginas mais belas do Futebol Clube do Porto escrita com letras muito branquinhas cheias de vontade e sacríficio.

    Tínhamos uma equipa fantástica mas um jogador destacava-se dos demais como já tinha sido em Viena: RABAH MADJER, um argelino fenomenal contratado na 2ª divisão francesa.

    Magnífico Heliantia.

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  7. Heliantia, apenas uma palavra para descrever esta tua (mais uma) história d'encantar: SUBLIME!!

    Foi uma madrugada, tal como o final da outra manhã uns anos mais tarde, para SEMPRE RECORDAR!

    Venham mais, venham mais... porque estas, nunca cansam!!!

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