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FCPorto – Dragões de Azul Forte
Retalhos da história, conquistas e vitórias memoráveis, figuras e glórias do
F. C. do Porto
Capítulo 4: 1931 a 1940 – À conquista do futuro; Bicampeão! (Parte VII)
Campeonato Nacional 1934-35 (Continuação)
5.ª jornada
17-2-1935: União de Lisboa 0 – FC Porto 2
Regresso às vitórias, em Lisboa, perante o União de Lisboa. E, enfim, a redescoberta do caminho da felicidade, do brilho, da glória. “A primeira vintena de minutos teve brilhantismo do melhor que podem proporcionar grupos portugueses. Tudo a sair bem de parte a parte, paradas e respostas sucessivas, a bola ora sobre uma baliza ora sobre outra, no comportamento e na limpeza das entradas... Os guarda-redes foram as figuras salientes desses vinte minutos: Figueiredo, do União, e Soares dos Reis, do Porto, em autêntica competência um com o outro...
Na segunda parte, com golos de Artur Alves e Lopes Carneiro, o FC Porto adiantou-se e ganhou com brilhantismo”.
6.ª jornada
24-2-1935: Académico FC 0 – FC Porto 3
No Porto, 3-0 ao Académico, com tentos de Pinga, com “um remate formidável, quase de meio campo”, e de Carlos Nunes (2). Nas camisolas do FC Porto, cores vivas de esperança.
7.ª jornada
3-3-1935: FC Porto 4 – Sporting 2
Em jogo no Amial, no fecho da primeira volta, o FC Porto bateu o Sporting, por 4-2. Para esse desafio organizaram os de Lisboa um comboio especial, tendo sido de 50 escudos o custo da viagem. Mas os seus adeptos, cerca de mil, quase se perderam naquele mar eufórico de azul-e-branco, raramente se ouvindo os seus incitamentos. Tumulto e animação de gente eufórica, que enchia as bancadas de ruído e cor — como se o azul-e-branco das bandeiras que tremulavam ao vento fossem, outra vez, as cores vivas e quentes da esperança e do júbilo.
A crónica:
“A primeira parte do encontro deve ter compensado sobejamente as centenas de entusiastas que se deslocaram ao Porto. Foram 45 minutos de jogo rápido, enérgico, por vezes muito bem conduzido. O primeiro tempo teve beleza e emoção e, se cansou um pouco os jogadores — o andamento da segunda parte ressentiu-se do esforço inicial — não deixou também de cansar os espectadores que tiveram de viver a partida minuto a minuto, na incerteza do resultado.
O jogo iniciou-se de feição para os portuenses. Dois golos seguidos, quando passavam apenas cinco minutos de luta, pareciam o prelúdio duma vitória copiosa. O Sporting, que soubera suportar os azares da luta, conseguiu também dois golos em cinco minutos. Depois do empate, uma ligeira desorientação que poderia ter custado a derrota aos Campeões do Norte. Mas um terceiro golo, marcado por Pinga, levantou de novo o grupo, pondo um freio oportuno à subida do Sporting.
No segundo tempo, o andamento do jogo baixou. A rapidez e energia do início não podiam viver os 90 minutos. E a luta perdeu brilhantismo. No entanto, o FC Porto, nesta segunda parte, teve vantagem, mesmo com dois elementos magoados. Avelino Martins e Carlos Pereira não consentiram que o Sporting voltasse a ter ascendente. Depois do quarto golo, aos 20 minutos, por Pinga, numa jogada de boa execução — toda serenidade e inteligência — o resultado não oferecia dúvidas. Neste jogo, a máquina do FC Porto trabalhou afinada e o seu volante no jogo de ataque (aquele que demonstra a eficiência da máquina) foi o excelente jogador que ocupa o lugar de interior-esquerdo: Pinga!”.
8.ª jornada
10-3-1935: (FC Porto 5 – Belenenses 4) Jogo que iria ser repetido entre a 11.ª e 12.ª jornadas
Depois de ganharem ao Sporting, os portistas tinham cada vez mais candente o sonho. Que se acentuaria no arranque da segunda volta, quando o FC Porto bateu o Belenenses, por 5-4, numa partida brilhantíssima, com emoção, fulgor e entusiasmo! Um desafio que teve de tudo: a auréola romântica do imprevisto, energia, frequentes pedaços de bom jogo, erros a justificar a marcação de bolas e, pairando sobre estas e outras coisas que reflectem, no campo e em volta, confiança, desilusão, entusiasmo e alegria, aquele factor que sempre acompanha o volta-face, que se chama emoção.
Na primeira parte, 3-1 para o Belenenses, com o único golo portista marcado por Pinga. O quarto de hora final do primeiro tempo fora efectivamente aterrador para o FC Porto, que se deixou manobrar, dando, por vezes, impressão de reacção impossível. E, em face disso, ao intervalo, a possível vitória dos lisboetas era aceite de um modo geral. As esperanças desfeitas, a angústia nos rostos dos adeptos portistas e no olhar frio com que os seus jogadores saíram para a cabina. Como se da atmosfera assomasse mais que melancolia, angústia, na iminência da esperança atraiçoada.
A clara diferença dos estados de espírito das duas equipas, ao terminar o primeiro tempo, serviu, afinal, para valorizar de forma brilhantíssima o primeiro quarto de hora da segunda parte, findo o qual o FC Porto tinha marcado três golos, transformando o 3-1 do adversário em 4-3 a seu favor. Esta recuperação empolgou. Não houve, decerto, ninguém no campo que se tivesse abstraído da emoção que o jogo teve às mãos-cheias, nesse curto período, que ainda pareceu mais curto pelo sem-número de coisas julgadas pouco antes incríveis e que se verificaram.
Os jogadores portistas, com os rostos cobertos de suor e de coração quente, continuaram, apaixonados, a liça. Difícil descrever o ambiente e espectáculo dentro e fora do terreno. O Belenenses empatou já no quarto de hora final e, aos 83 minutos, o golo da vitória do FC Porto...
Mas, para que o dramatismo se estendesse ainda mais, a um minuto do fim, o árbitro, António Palhinhas, assinalou penalti contra os portistas, por alegada mão de Waldemar. Caiu Tróia! A atitude do árbitro foi, porém, incerta e, acabando por ir perguntar ao seu juiz de linha se fora ou não penalti, deu o dito por não dito, reatando o jogo com bola ao ar. Brados e gritos, blasfémias praguejadas pelos lisboetas e muitos dos seus adeptos (que se tinham deslocado ao Porto em comboio especial, pagando 40 escudos pela viagem), intervenção policial com a guarda a cavalo amainando a tempestade à força de bastão.
Os dirigentes do Belenenses não calaram o desafio: protestariam o jogo. Dito e feito…
[In "Glória e Vida de Três Gigantes", 1995 - Adaptação]
9.ª jornada
17-3-1935: Académica 2 – FC Porto 4
Uma semana volvida, jogo em Coimbra e nova vitória do FC Porto, por 4-2. Num encontro ardoroso e que voltou a ter lamentável final. O cronista escreveu: “O desafio decorreu num ambiente de paixão intensa. Parece que entre conimbricences e portuenses havia contas antigas a pôr em ordem e o encontro, naturalmente, ressentiu-se desses desejos de desforra. Tavares da Silva (árbitro-jornalista) dirigiu o encontro. O ambiente apaixonado do desafio prejudicou o seu trabalho, que foi muito irregular. Mas os deslizes que teve não justificam as lamentáveis agressões de que foi vítima por parte do público”.
10.ª jornada
24-3-1935: Benfica 3 – FC Porto 0
A quatro jornadas do fim, tropeção portista. Que poderia ter sido fatal.
Benfica e FC Porto encontraram-se pela primeira vez em Lisboa para disputar um jogo da Liga. A equipa portista ia muito moralizada à capital, fruto de cinco vitórias consecutivas que lhe garantiram a liderança da prova. O jogo, que criou enorme expectativa no país, foi presenciado por 20.000 pessoas, entre as quais mais de mil portistas que tinham chegado em dois comboios especiais, pagando 50 escudos cada qual.
E vitória do Benfica, por 3-0. “Os portuenses não responderam à chamada no seu encontro vital com o Benfica. Por mau dia, falta de ânimo, caso psicológico ou fosse pelo que fosse, o grupo do FC Porto não se exibiu como exigiam as suas necessidades, não esteve à altura da situação e do seu próprio valor. Jogou muito mal, abaixo nitidamente das suas possibilidades...”. Joseph Szabo, o técnico húngaro do FC Porto, queixou-se no final do jogo do ambiente hostil criado pelos adeptos dos três grandes clubes lisboetas, mas garantiu que o título não escaparia ao FC Porto…
BENFICA: Augusto Amaro; Gatinho, Gustavo Teixeira; Francisco Albino, Lucas, Gaspar Pinto; Torres, Fernando Cardoso, Vítor Silva, Rogério Sousa, Alfredo Valadas.
Treinador: Vítor Gonçalves.
FC PORTO: Soares dos Reis; Carlos Pereira, Jerónimo Faria; João Nova, Álvaro Pereira, Raul Castro; Waldemar Mota, António Santos, Lopes Carneiro, Pinga, Carlos Nunes.
Treinador: Joseph Szabo.
GOLOS: 32' Gaspar Pinto (1-0); 40' Rogério Sousa (2-0) ; 78' Vítor Silva (3-0).
11.ª jornada
FC Porto 7 – União Football Lisboa 4
Vitória contra jogada de secretaria…
Apesar de ter batido o União de Lisboa, por 7-4, parecia que o céu desabara sobre a cabeça dos portistas. Surpreendentemente, a FPF dava provimento ao protesto apresentado pelo Belenenses, no jogo emotivo do Porto. Era talvez um processo (ou uma habilidade saloia?) para tentar entravar a marcha ascensional do FC Porto na disputa do Campeonato da Liga.
Jogo de repetição relativo à 8.ª jornada
FC Porto 1 – Belenenses 0
Contra os poderes de Lisboa…
Não surtiu o efeito desejado a manobra da Federação sediada em Lisboa. Porquanto, em novo jogo, os portistas mantiveram a sua posição de líder da competição, ao vencer, outra vez, o Belenenses. “O FC Porto ganhou com justiça, por um golo apenas, mas com uma superioridade que podia ter maior expressão no segundo tempo”.
12.ª jornada
FC Porto 7 – Académico FC 0
Vitória inapelável sobre o outro representante da cidade do Porto. Os azuis-e-brancos embalavam para o triunfo final no Campeonato.
13.ª jornada
FC Porto 3 – Vitória de Setúbal 2
A jornada 13 não foi de azar para o FC Porto. Vitória difícil a vingar a derrota em Setúbal na primeira volta.
14.ª e última jornada
12-5-1935: Sporting 2 – FC Porto 2
Campo Grande de sonhos azuis
E, a 12 de Maio, no Campo Grande, a grande decisão. Sporting e FC Porto eram os candidatos que restavam. Aos portistas bastava um empate. E foi com um empate (2-2) que regressaram ao Porto. Apoteoticamente. “O estado de espírito com que os dois grupos encaravam o encontro era absolutamente diferente. FC Porto entrava já a ganhar por 2-0 (da primeira volta) e com essa vantagem podia adoptar uma táctica em que arriscasse pouco, preocupando-se mais em salvar o resultado que em construir uma vitória que desse brado. A circunstância de não poder utilizar Pinga, que se encontrava doente, deve ter levado a equipa a encarar mais ainda a partida sob esse aspecto de preocupação exclusiva de manter o resultado. Pinga é o verdadeiro cérebro do ataque portuense, o inspirador das suas jogadas de conjunto”.
Nesse último jogo, o da consagração, o FC Porto alinhou com:
Soares dos Reis; Avelino Martins e Jerónimo Faria; João Nova, Álvaro Pereira e Carlos Pereira; Lopes Carneiro, Waldemar Mota, António Santos, Carlos Mesquita e Carlos Nunes.
Golos do FC Porto: Carlos Nunes e Lopes Carneiro.
[In "Glória e Vida de Três Gigantes", 1995 - Adaptação]
O primeiro Campeão Nacional (Liga)!
A equipa brilhante vencedora do primeiro Campeonato Nacional (Liga), 1934-35.
De pé: Lopes Carneiro, Valdemar Mota, Carlos Mesquita, Artur de Sousa "Pinga", Carlos Nunes, Acácio Mesquita, Assis e Raul; ao meio: Álvaro Pereira e Jerónimo; em baixo: Avelino Martins, João Nova, Soares dos Reis, António Santos, Carlos Pereira e Francisco Castro.
Campeonato e tradição
O FC Porto ganhou a primeira edição do Campeonato da Liga. Apesar dos empecilhos que o “poder de Lisboa” lançou para o seu caminho, mandando repetir um jogo porque o árbitro dera o dito por não dito.
E cumpriu-se a tradição. O FC Porto, que ganhara a primeira edição do Campeonato de Portugal, venceu, igualmente, a edição de arranque do Campeonato da I Liga (Campeonato Nacional). De forma fulgurante. Apesar das jogadas de bastidores, das artimanhas e habilidosas decisões administrativas, triunfo final brilhantíssimo!
8 equipas, 14 jogos, 10 vitórias, 2 empates, 2 derrotas, 43 golos marcados e 19 sofridos. O FC Porto terminou a prova com dois pontos de vantagem sobre o Sporting. Ganhou todos os jogos em casa, fora ganhou 3, empatou 2 e perdeu outros 2. O treinador húngaro Joseph Szabo e o jogador Pinga foram, sem dúvida, os “responsáveis máximos” pelo título. Pinga e Carlos Nunes, os melhores marcadores da equipa com 12 golos cada.
Recepção triunfal
A chegada ao Porto dos jogadores consagrou o brilhantismo com que o FC Porto conquistara o Campeonato da I Liga – o primeiro realizado. Milhares de pessoas aclamaram os vencedores, que foram conduzidos em triunfo desde a estação de S. Bento até à sede da Associação de Futebol. POOOORTO! POOOOORTO!
A homenagem de uma revista ao campeão FC Porto
Ouro por subscrição pública e projecto do Estádio Distrital abandonado
A 19 de Maio, por iniciativa de Bento Correia e de Sebastião Ferreira Mendes, foi iniciada uma subscrição pública entre os associados do FC Porto destinada a oferecer medalhas de ouro a todos os jogadores que conquistaram o Campeonato da I Liga.
Por essa altura, sabia-se que estava depositada na Caixa Geral de Depósitos a quantia de 209.079 escudos para construção do Estádio Distrital, sonho que os portistas acalentavam, mas em Junho o projecto foi abandonado porque Herculano Ferreira, o Governador Civil, deixara o cargo, pelo que a verba foi distribuída por instituições de caridade.
20 Mai.1935 – Foi atribuída ao FC Porto a Medalha de Ouro de Mérito Desportivo da Cidade do Porto, como homenagem pela conquista do 1.º Campeonato da Liga.
João Nova (n. 1 Abr.1907 – m.??), médio de ataque, jogava no Boavista antes de ingressar no FC Porto na época 1932-33. Obteve a titularidade na temporada seguinte e, em 4 Jan.1934, participou no célebre jogo ante o First de Viena que o FC Porto bateu por 3-0 e em que se revelaram os “três diabos de meio dia” (Waldemar Mota, Acácio Mesquita e Artur de Sousa “Pinga”).
• Em 1934-35 conquistou com o FC Porto o primeiro Campeonato Nacional/Liga. Na época que se seguiu não atingiu nenhum título nacional, mas pode honrar-se de estar associado à retumbante vitória dos Dragões sobre os “Leões”, por 10-1! Também foi Campeão de Portugal, no 4.º título do FC Porto na prova (1936-37).
• João Nova fez parte de grandes equipas do FC Porto, jogando ao lado de, entre outros, Soares dos Reis, Avelino Martins, Jerónimo Faria, Álvaro Pereira, Carlos Pereira, Lopes Carneiro, Waldemar Mota, Acácio Mesquita, Pinga, Carlos Nunes, Carlos Pereira, Manuel dos Anjos, António Santos, Reboredo e Gomes da Costa.
• Logrou 1 internacionalização no encontro de 11 Mar.1934, em Madrid, com a Espanha, a contar para a qualificação para o Mundial; com uma copiosa derrota da Selecção Nacional por 0-9.
• Deixou o FC Porto no final da época 1936-37, mas não há notícias de que tenha continuado a jogar.
Carreira no FC Porto
1932-33 a 1936-37
Palmarés
1 Campeonato Nacional/Liga (1934-35)
1 Campeonato de Portugal (1936-37)
5 Campeonatos do Porto
Retalhos da história, conquistas e vitórias memoráveis, figuras e glórias do
F. C. do Porto
Capítulo 4: 1931 a 1940 – À conquista do futuro; Bicampeão! (Parte VII)
Campeonato Nacional 1934-35 (Continuação)
5.ª jornada
17-2-1935: União de Lisboa 0 – FC Porto 2
Regresso às vitórias, em Lisboa, perante o União de Lisboa. E, enfim, a redescoberta do caminho da felicidade, do brilho, da glória. “A primeira vintena de minutos teve brilhantismo do melhor que podem proporcionar grupos portugueses. Tudo a sair bem de parte a parte, paradas e respostas sucessivas, a bola ora sobre uma baliza ora sobre outra, no comportamento e na limpeza das entradas... Os guarda-redes foram as figuras salientes desses vinte minutos: Figueiredo, do União, e Soares dos Reis, do Porto, em autêntica competência um com o outro...
Na segunda parte, com golos de Artur Alves e Lopes Carneiro, o FC Porto adiantou-se e ganhou com brilhantismo”.
6.ª jornada
24-2-1935: Académico FC 0 – FC Porto 3
No Porto, 3-0 ao Académico, com tentos de Pinga, com “um remate formidável, quase de meio campo”, e de Carlos Nunes (2). Nas camisolas do FC Porto, cores vivas de esperança.
7.ª jornada
3-3-1935: FC Porto 4 – Sporting 2
Em jogo no Amial, no fecho da primeira volta, o FC Porto bateu o Sporting, por 4-2. Para esse desafio organizaram os de Lisboa um comboio especial, tendo sido de 50 escudos o custo da viagem. Mas os seus adeptos, cerca de mil, quase se perderam naquele mar eufórico de azul-e-branco, raramente se ouvindo os seus incitamentos. Tumulto e animação de gente eufórica, que enchia as bancadas de ruído e cor — como se o azul-e-branco das bandeiras que tremulavam ao vento fossem, outra vez, as cores vivas e quentes da esperança e do júbilo.
A crónica:
“A primeira parte do encontro deve ter compensado sobejamente as centenas de entusiastas que se deslocaram ao Porto. Foram 45 minutos de jogo rápido, enérgico, por vezes muito bem conduzido. O primeiro tempo teve beleza e emoção e, se cansou um pouco os jogadores — o andamento da segunda parte ressentiu-se do esforço inicial — não deixou também de cansar os espectadores que tiveram de viver a partida minuto a minuto, na incerteza do resultado.
O jogo iniciou-se de feição para os portuenses. Dois golos seguidos, quando passavam apenas cinco minutos de luta, pareciam o prelúdio duma vitória copiosa. O Sporting, que soubera suportar os azares da luta, conseguiu também dois golos em cinco minutos. Depois do empate, uma ligeira desorientação que poderia ter custado a derrota aos Campeões do Norte. Mas um terceiro golo, marcado por Pinga, levantou de novo o grupo, pondo um freio oportuno à subida do Sporting.
No segundo tempo, o andamento do jogo baixou. A rapidez e energia do início não podiam viver os 90 minutos. E a luta perdeu brilhantismo. No entanto, o FC Porto, nesta segunda parte, teve vantagem, mesmo com dois elementos magoados. Avelino Martins e Carlos Pereira não consentiram que o Sporting voltasse a ter ascendente. Depois do quarto golo, aos 20 minutos, por Pinga, numa jogada de boa execução — toda serenidade e inteligência — o resultado não oferecia dúvidas. Neste jogo, a máquina do FC Porto trabalhou afinada e o seu volante no jogo de ataque (aquele que demonstra a eficiência da máquina) foi o excelente jogador que ocupa o lugar de interior-esquerdo: Pinga!”.
8.ª jornada
10-3-1935: (FC Porto 5 – Belenenses 4) Jogo que iria ser repetido entre a 11.ª e 12.ª jornadas
Depois de ganharem ao Sporting, os portistas tinham cada vez mais candente o sonho. Que se acentuaria no arranque da segunda volta, quando o FC Porto bateu o Belenenses, por 5-4, numa partida brilhantíssima, com emoção, fulgor e entusiasmo! Um desafio que teve de tudo: a auréola romântica do imprevisto, energia, frequentes pedaços de bom jogo, erros a justificar a marcação de bolas e, pairando sobre estas e outras coisas que reflectem, no campo e em volta, confiança, desilusão, entusiasmo e alegria, aquele factor que sempre acompanha o volta-face, que se chama emoção.
Na primeira parte, 3-1 para o Belenenses, com o único golo portista marcado por Pinga. O quarto de hora final do primeiro tempo fora efectivamente aterrador para o FC Porto, que se deixou manobrar, dando, por vezes, impressão de reacção impossível. E, em face disso, ao intervalo, a possível vitória dos lisboetas era aceite de um modo geral. As esperanças desfeitas, a angústia nos rostos dos adeptos portistas e no olhar frio com que os seus jogadores saíram para a cabina. Como se da atmosfera assomasse mais que melancolia, angústia, na iminência da esperança atraiçoada.
A clara diferença dos estados de espírito das duas equipas, ao terminar o primeiro tempo, serviu, afinal, para valorizar de forma brilhantíssima o primeiro quarto de hora da segunda parte, findo o qual o FC Porto tinha marcado três golos, transformando o 3-1 do adversário em 4-3 a seu favor. Esta recuperação empolgou. Não houve, decerto, ninguém no campo que se tivesse abstraído da emoção que o jogo teve às mãos-cheias, nesse curto período, que ainda pareceu mais curto pelo sem-número de coisas julgadas pouco antes incríveis e que se verificaram.
Os jogadores portistas, com os rostos cobertos de suor e de coração quente, continuaram, apaixonados, a liça. Difícil descrever o ambiente e espectáculo dentro e fora do terreno. O Belenenses empatou já no quarto de hora final e, aos 83 minutos, o golo da vitória do FC Porto...
Mas, para que o dramatismo se estendesse ainda mais, a um minuto do fim, o árbitro, António Palhinhas, assinalou penalti contra os portistas, por alegada mão de Waldemar. Caiu Tróia! A atitude do árbitro foi, porém, incerta e, acabando por ir perguntar ao seu juiz de linha se fora ou não penalti, deu o dito por não dito, reatando o jogo com bola ao ar. Brados e gritos, blasfémias praguejadas pelos lisboetas e muitos dos seus adeptos (que se tinham deslocado ao Porto em comboio especial, pagando 40 escudos pela viagem), intervenção policial com a guarda a cavalo amainando a tempestade à força de bastão.
Os dirigentes do Belenenses não calaram o desafio: protestariam o jogo. Dito e feito…
[In "Glória e Vida de Três Gigantes", 1995 - Adaptação]
9.ª jornada
17-3-1935: Académica 2 – FC Porto 4
Uma semana volvida, jogo em Coimbra e nova vitória do FC Porto, por 4-2. Num encontro ardoroso e que voltou a ter lamentável final. O cronista escreveu: “O desafio decorreu num ambiente de paixão intensa. Parece que entre conimbricences e portuenses havia contas antigas a pôr em ordem e o encontro, naturalmente, ressentiu-se desses desejos de desforra. Tavares da Silva (árbitro-jornalista) dirigiu o encontro. O ambiente apaixonado do desafio prejudicou o seu trabalho, que foi muito irregular. Mas os deslizes que teve não justificam as lamentáveis agressões de que foi vítima por parte do público”.
10.ª jornada
24-3-1935: Benfica 3 – FC Porto 0
A quatro jornadas do fim, tropeção portista. Que poderia ter sido fatal.
Benfica e FC Porto encontraram-se pela primeira vez em Lisboa para disputar um jogo da Liga. A equipa portista ia muito moralizada à capital, fruto de cinco vitórias consecutivas que lhe garantiram a liderança da prova. O jogo, que criou enorme expectativa no país, foi presenciado por 20.000 pessoas, entre as quais mais de mil portistas que tinham chegado em dois comboios especiais, pagando 50 escudos cada qual.
E vitória do Benfica, por 3-0. “Os portuenses não responderam à chamada no seu encontro vital com o Benfica. Por mau dia, falta de ânimo, caso psicológico ou fosse pelo que fosse, o grupo do FC Porto não se exibiu como exigiam as suas necessidades, não esteve à altura da situação e do seu próprio valor. Jogou muito mal, abaixo nitidamente das suas possibilidades...”. Joseph Szabo, o técnico húngaro do FC Porto, queixou-se no final do jogo do ambiente hostil criado pelos adeptos dos três grandes clubes lisboetas, mas garantiu que o título não escaparia ao FC Porto…
BENFICA: Augusto Amaro; Gatinho, Gustavo Teixeira; Francisco Albino, Lucas, Gaspar Pinto; Torres, Fernando Cardoso, Vítor Silva, Rogério Sousa, Alfredo Valadas.
Treinador: Vítor Gonçalves.
FC PORTO: Soares dos Reis; Carlos Pereira, Jerónimo Faria; João Nova, Álvaro Pereira, Raul Castro; Waldemar Mota, António Santos, Lopes Carneiro, Pinga, Carlos Nunes.
Treinador: Joseph Szabo.
GOLOS: 32' Gaspar Pinto (1-0); 40' Rogério Sousa (2-0) ; 78' Vítor Silva (3-0).
11.ª jornada
FC Porto 7 – União Football Lisboa 4
Vitória contra jogada de secretaria…
Apesar de ter batido o União de Lisboa, por 7-4, parecia que o céu desabara sobre a cabeça dos portistas. Surpreendentemente, a FPF dava provimento ao protesto apresentado pelo Belenenses, no jogo emotivo do Porto. Era talvez um processo (ou uma habilidade saloia?) para tentar entravar a marcha ascensional do FC Porto na disputa do Campeonato da Liga.
Jogo de repetição relativo à 8.ª jornada
FC Porto 1 – Belenenses 0
Contra os poderes de Lisboa…
Não surtiu o efeito desejado a manobra da Federação sediada em Lisboa. Porquanto, em novo jogo, os portistas mantiveram a sua posição de líder da competição, ao vencer, outra vez, o Belenenses. “O FC Porto ganhou com justiça, por um golo apenas, mas com uma superioridade que podia ter maior expressão no segundo tempo”.
12.ª jornada
FC Porto 7 – Académico FC 0
Vitória inapelável sobre o outro representante da cidade do Porto. Os azuis-e-brancos embalavam para o triunfo final no Campeonato.
13.ª jornada
FC Porto 3 – Vitória de Setúbal 2
A jornada 13 não foi de azar para o FC Porto. Vitória difícil a vingar a derrota em Setúbal na primeira volta.
14.ª e última jornada
12-5-1935: Sporting 2 – FC Porto 2
Campo Grande de sonhos azuis
E, a 12 de Maio, no Campo Grande, a grande decisão. Sporting e FC Porto eram os candidatos que restavam. Aos portistas bastava um empate. E foi com um empate (2-2) que regressaram ao Porto. Apoteoticamente. “O estado de espírito com que os dois grupos encaravam o encontro era absolutamente diferente. FC Porto entrava já a ganhar por 2-0 (da primeira volta) e com essa vantagem podia adoptar uma táctica em que arriscasse pouco, preocupando-se mais em salvar o resultado que em construir uma vitória que desse brado. A circunstância de não poder utilizar Pinga, que se encontrava doente, deve ter levado a equipa a encarar mais ainda a partida sob esse aspecto de preocupação exclusiva de manter o resultado. Pinga é o verdadeiro cérebro do ataque portuense, o inspirador das suas jogadas de conjunto”.
Nesse último jogo, o da consagração, o FC Porto alinhou com:
Soares dos Reis; Avelino Martins e Jerónimo Faria; João Nova, Álvaro Pereira e Carlos Pereira; Lopes Carneiro, Waldemar Mota, António Santos, Carlos Mesquita e Carlos Nunes.
Golos do FC Porto: Carlos Nunes e Lopes Carneiro.
[In "Glória e Vida de Três Gigantes", 1995 - Adaptação]
O primeiro Campeão Nacional (Liga)!
A equipa brilhante vencedora do primeiro Campeonato Nacional (Liga), 1934-35.
De pé: Lopes Carneiro, Valdemar Mota, Carlos Mesquita, Artur de Sousa "Pinga", Carlos Nunes, Acácio Mesquita, Assis e Raul; ao meio: Álvaro Pereira e Jerónimo; em baixo: Avelino Martins, João Nova, Soares dos Reis, António Santos, Carlos Pereira e Francisco Castro.
Campeonato e tradição
O FC Porto ganhou a primeira edição do Campeonato da Liga. Apesar dos empecilhos que o “poder de Lisboa” lançou para o seu caminho, mandando repetir um jogo porque o árbitro dera o dito por não dito.
E cumpriu-se a tradição. O FC Porto, que ganhara a primeira edição do Campeonato de Portugal, venceu, igualmente, a edição de arranque do Campeonato da I Liga (Campeonato Nacional). De forma fulgurante. Apesar das jogadas de bastidores, das artimanhas e habilidosas decisões administrativas, triunfo final brilhantíssimo!
8 equipas, 14 jogos, 10 vitórias, 2 empates, 2 derrotas, 43 golos marcados e 19 sofridos. O FC Porto terminou a prova com dois pontos de vantagem sobre o Sporting. Ganhou todos os jogos em casa, fora ganhou 3, empatou 2 e perdeu outros 2. O treinador húngaro Joseph Szabo e o jogador Pinga foram, sem dúvida, os “responsáveis máximos” pelo título. Pinga e Carlos Nunes, os melhores marcadores da equipa com 12 golos cada.
Recepção triunfal
A chegada ao Porto dos jogadores consagrou o brilhantismo com que o FC Porto conquistara o Campeonato da I Liga – o primeiro realizado. Milhares de pessoas aclamaram os vencedores, que foram conduzidos em triunfo desde a estação de S. Bento até à sede da Associação de Futebol. POOOORTO! POOOOORTO!
A homenagem de uma revista ao campeão FC Porto
Ouro por subscrição pública e projecto do Estádio Distrital abandonado
A 19 de Maio, por iniciativa de Bento Correia e de Sebastião Ferreira Mendes, foi iniciada uma subscrição pública entre os associados do FC Porto destinada a oferecer medalhas de ouro a todos os jogadores que conquistaram o Campeonato da I Liga.
Por essa altura, sabia-se que estava depositada na Caixa Geral de Depósitos a quantia de 209.079 escudos para construção do Estádio Distrital, sonho que os portistas acalentavam, mas em Junho o projecto foi abandonado porque Herculano Ferreira, o Governador Civil, deixara o cargo, pelo que a verba foi distribuída por instituições de caridade.
20 Mai.1935 – Foi atribuída ao FC Porto a Medalha de Ouro de Mérito Desportivo da Cidade do Porto, como homenagem pela conquista do 1.º Campeonato da Liga.
João Nova (n. 1 Abr.1907 – m.??), médio de ataque, jogava no Boavista antes de ingressar no FC Porto na época 1932-33. Obteve a titularidade na temporada seguinte e, em 4 Jan.1934, participou no célebre jogo ante o First de Viena que o FC Porto bateu por 3-0 e em que se revelaram os “três diabos de meio dia” (Waldemar Mota, Acácio Mesquita e Artur de Sousa “Pinga”).
• Em 1934-35 conquistou com o FC Porto o primeiro Campeonato Nacional/Liga. Na época que se seguiu não atingiu nenhum título nacional, mas pode honrar-se de estar associado à retumbante vitória dos Dragões sobre os “Leões”, por 10-1! Também foi Campeão de Portugal, no 4.º título do FC Porto na prova (1936-37).
• João Nova fez parte de grandes equipas do FC Porto, jogando ao lado de, entre outros, Soares dos Reis, Avelino Martins, Jerónimo Faria, Álvaro Pereira, Carlos Pereira, Lopes Carneiro, Waldemar Mota, Acácio Mesquita, Pinga, Carlos Nunes, Carlos Pereira, Manuel dos Anjos, António Santos, Reboredo e Gomes da Costa.
• Logrou 1 internacionalização no encontro de 11 Mar.1934, em Madrid, com a Espanha, a contar para a qualificação para o Mundial; com uma copiosa derrota da Selecção Nacional por 0-9.
• Deixou o FC Porto no final da época 1936-37, mas não há notícias de que tenha continuado a jogar.
Carreira no FC Porto
1932-33 a 1936-37
Palmarés
1 Campeonato Nacional/Liga (1934-35)
1 Campeonato de Portugal (1936-37)
5 Campeonatos do Porto
- No próximo post.: Capítulo 4, 1931 a 1940 – À conquista do futuro; Bicampeão! (Parte VIII) – Campeonato de Portugal 1934-35; uma equipa de internacionais; época 1935-36; 4-2 ao Campeão de Espanha! Szabo de chicote na mão!
“Apesar das jogadas de bastidores, das artimanhas e habilidosas decisões administrativas, triunfo final brilhantíssimo!” Ontem como hoje.
ResponderEliminarContinua esta bela obra. E o livro?
Amanhã há mais, sem os trapaceiros da nossa praça (leia-se Lisboa).
Um beijo.
Ontem como hoje, nada muda neste pobre, melhor, falido país.
ResponderEliminarValha-nos o F.C.Porto e valham-nos estas belas histórias, para termos a ideia, concreta, do que foi preciso passar para aqui chegar.
Um abraço
Que post delicioso, emocionante este 1º campeonato nacional (da liga) 34/35.
ResponderEliminarPORTO CAMPEÃO mesmo com jogos repetidos para nos tramarem.
Abraço
Mais um grande post. Para ler e reler, convenientemente. Com mais histórias desta epopeia que nos entusiasma, a vencer desde 1893 e, oficialmente, com a 1ª competição a ter sido vencida faz precisamente 100 anos este sábdo, dia 9 - a 1ª edição da Taça José Monteiro da Costa, já aqui muito bem descrita anteriormente, também.
ResponderEliminarUm abraço.
O 1º de muitos campeonatos que temos festejado, e com as mesmas habilidades a que já estamos habituados...;)
ResponderEliminarObrigado Dragão Azul Forte, pela excelente descrição!
BIBÓ PORTO
Olá Fernando,
ResponderEliminarVi-o na excelente reportagem do Ricardo Amorim e vim ao vosso blog conferir a cronologia das camisolas até que me dei de caras com este belo post acerca do meu avô. Ele faleceu em 1989, era um portista confesso, qualidade por mim herdada e pelo meu pai também. Um homem de poucas palavras, de inegável elegância, lembro-me de o ver sempre sentado e de não lhe conhecer pernas que não estivessem pretas (o futebol antigamente deixava marcas, outras).
Um pesado e imponente emblema do nosso Porto figurava na parede da casa onde o meu pai cresceu, um emblema de um metal precioso, um que não me deixou ser que não Porto.
O meu pai conta que depois foi jogador/impulsionador/dirigente/treinador de um clube chamado Sport da Póvoa, do qual - como o Fernando também partilho do prazer pela pesquisa exaustiva por tudo futebol e especialmente Porto - não encontro grandes fontes informativas, também foi treinador e dirigente do Varzim.
Com os melhores cumprimentos,
Gonçalo da Silva Nova