15 julho, 2009

O tetra, jornada a jornada - fim

26ª jornada
[porto, 2 – setúbal, 0]

Agora que as luzes se foram
Só o tango ficou
Desenhado no chão.
E a gardénia esquecida
repete, em surdina, o último verso.

Relembrava-se Gardel, em homenagem ao seu compatriota Lisandro, incontinente fazedor de golos. Mais um degrau ultrapassado, na ascensão rumo ao tetra, num jogo de cariz especial. Não pelo adversário, inócuo e lutando desesperadamente contra o espectro da descida. Mas pelo simbolismo que o mesmo acarretou, realizado poucos dias após o desaparecimento de um dos grandes vultos portistas. Virgílio Mendes, cognome de “o leão de Génova”, tinha a bravura de um indomável soldado de campanha, tenaz defensor do emblema que lhe decorava o peito.

Os golos de Lisandro, o “man of the match”, foram o corolário lógico de um conjunto que, nesta fase, sobrepunha as fileiras cerradas ao deslumbramento estético. Não se jogava bem, no Dragão, mas somavam-se pontos vorazmente.

Nota de destaque, em toda a blogosfera azul e branca, o nascimento de mais um projecto, acompanhado a par e passo, com evidente nervosismo, quase como se de um filho se tratasse. As amadoras tinham a sua casa pronta. Finalmente. O “Dragãozinho” abriu portas, cativando os felizardos presentes na inauguração. Um clube eclético tinha que ter um espaço assim. E lá vigora também a máxima do clube. A vencer, desde 1893…

27ª jornada
[marítimo, 0 – porto, 3]

Maio. Mês de todas as decisões. 4 jogos para o final, numa altura em que a imprensa abanava o fantasma da possível não renovação de Jesualdo. Cirurgicamente, na altura crucial da temporada, os mesmos de sempre procuravam lançar o descrédito, a confusão, o caos. O Jogo titulava que este seria o “mês da verdade”. E ela, tal como o algodão, não enganava. Enquanto a Europa abria a boca de espanto, descobrindo um defesa-esquerdo raçudo, sem cáries, o título era praticamente oferecido, numa bandeja de prata, aos comandados de Jesualdo. O empate leonino em Coimbra, aliado a uma contundente derrota encarnada na Madeira, no feudo do Nacional, faziam os portistas acariciarem o Tetra. Igualmente na pérola do Atlântico, o Porto vencia o Marítimo, sobrevivendo de forma esplendorosa às lesões nucleares de Lucho e Hulk. Com Meireles e Fernando em plano de destaque, soberbos pilares do meio-campo, os adeptos portistas preparavam o arraial, programado para dali a uma semana. Um ano intenso, de lutas e perseguições, de jogadas de bastidores e ódios acumulados, aprestava-se a chegar ao fim. Uma semana. Uma mísera semana para coroar a melhor equipa lusa, aquém e alem fronteiras.

28ª jornada
[porto,1 - nacional, 0]

Com a defesa menos batida da Europa, o 24º titulo deixou de ser uma miragem, transformando-se numa doce realidade. O Primeiro de Janeiro, deliciosamente, colocava em letras garrafais: “Só faltam seis”. E é esse número redondinho que, a partir de agora, assombrará os sonhos dos Neandertais de vermelho. Mais seis anos. Mais seis títulos. E cairá por terra o mito do clube “mais grande” de Portugal. Já falta pouco.

Mas, para abrir as rolhas do precioso champanhe, foi necessário suar e sofrer, em doses industriais. O Nacional foi um adversário notável, provavelmente o mais perigoso a pisar o relvado do Dragão, na temporada finda.

Coube-me a mim o privilégio de escrever a crónica da partida decisiva. E, como sempre faço nas ocasiões históricas, aproveito os momentos que antecedem o inicio das hostilidades para uma revisão. Uma espécie de hibernação reflexiva. Saboreio os passos todos da caminhada, de forma introspectiva, desde as provações e noites de desespero, sustendo a frustração de resultados menos conseguidos, até aos momentos ímpares de felicidade e alegria.

Bastou um golo, para soltar a torrente de contentamento no vulcão humano em que se tinha transformado o Estádio. Todo ele imbuído de enorme carga emocional. Carimbado pelo transportador da mística draconiana, flamejante na sua estampa física, Adónis esculpido em ferro, resistindo indómito a tudo. Bruno Alves, o primeiro a dar a cara e a aconselhar calma, no naufrágio da Figueira, aquando da derrota frente à Naval. E nesse gesto simples, de apaziguamento do descontentamento dos fiéis seguidores portistas, estava encerrada a chave do triunfo. Foi ali, naquele momento, numa derrota, que se forjou o caminho do êxito.

E pronto. Soltou-se o ansiado grito. O “CAMPEÕES, CAMPEÕES, NÓS SOMOS CAMPEÕES”, ouviu-se por toda a Invicta, essa cidade perene, cantada por poetas. No Estádio, que me atrevo a designar pelo mais belo palco à face da terra, estavam 50.000. Mas no Mundo inteiro, transformado em hora e meia num anfiteatro de emoções, estavam milhões. Pessoas anónimas, de todos os credos, raças e religiões, com aquele ponto de ligação. A fé inquebrantável no Porto. A diáspora portista, independentemente do fuso horário, resplandecente de felicidade. O palmarés tinha agora mais um pontinho. O 24º!

29ª jornada
[trofense, 1 – porto, 4]

Do Tetra emergia uma figura, tornada consensual na hora da vitória. Jesualdo Ferreira conseguia, finalmente, o reconhecimento merecido. De postura “low-profile”, avesso a mediatismos bacocos, com a sisudez a ser a imagem de marca, o técnico português atingia um patamar apenas ao alcance dos eleitos. Reconstruindo sabiamente um plantel sempre sangrado por necessidades de tesouraria, o decano treinador atingiu um patamar de maturidade que o tornam a personagem principal de um filme ainda sem fim.

Comprovando que a semana de festa não tinha ensombrado a capacidade futebolística, os Dragões atingiram outra marca notável. A 11ª vitória consecutiva, fora de portas, praticamente condenando à descida de divisão o seu opositor. A equipa, mantendo a bitola da seriedade competitiva, dizimou literalmente o adversário, com golos a dobrar da dupla argentina, Farías e Lisandro, numa clara demonstração de classe e vontade contínua de vencer. Os campeões crónicos são assim. Profissionais até à medula. Sem relaxamentos.

30ª jornada
[porto, 1 – braga, 1]

Ainda não tinha terminado a temporada, e já se preparava cuidadosamente a próxima. Maicon, defesa-central brasileiro e titular do Nacional, era anunciado como o mais novo reforço do ataque…ao Penta. Antes do jogo final da Superliga, os adeptos portistas tiveram novo motivo de celebração. A Liga Intercalar foi vencida, com mérito, pelos jovens azuis e brancos, numa final nervosamente decidida na lotaria das grandes penalidades. Mais uma prova inequívoca de que, longe das luzes da ribalta, se trabalha denodadamente e com qualidade nas camadas jovens. O jogo final, de consagração, recebeu o Braga de Jesus, um treinador na altura em bolandas, com os média a fazerem eco do interesse de vários grandes (Porto incluído) na sua contratação. O resultado, o menos importante num dia de festa, não fez justiça ao melhor jogo azul e branco, com mais um golo do inevitável Farías, sôfrego aproveitador de todos os minutos concedidos para deixar a sua marca. O fecho da competição foi celebrado, com a devida pompa e circunstância, provando que os novos empossados campeões “never walk alone”. Caia o pano no Dragão, deixando logo um rasto de nostalgia, pelo período sabático que se seguiria, sem a bola a rolar.

A comemoração do título foi quase coincidente com a enxurrada de parabéns, provenientes de vários quadrantes, pelo aniversário do blogue. O terceiro, num mês de Maio pródigo em festejos. Cada vez mais imprescindível para quem acompanha o quotidiano do Dragão, o Bibó Porto Carago apagou as velas num clima de festa, rodeado de amigos. Para o ano há mais!



NOTA - finalizada hoje a viagem do TETRA, é hora de nos centrarmos definitivamente no trajecto a caminho do PENTA e esse, começa já daqui a pouco, pelas 21:15, no Estádio Municipal de Aveiro, onde o FC Porto irá defrontar o Leixões, no primeiro jogo de preparação mais a sério, onde a malta do BiBó PoRtO estará em peso e força... aos que não possam estar presentes, e porque as boas tradições devem ser mantidas, passem por cá a partir das 20h30 e deleitem-se a "VER" esse jogo em (mais uma) transmissão em directo.

12 comentários:

  1. Bom post.
    O jogo nos Barreiros foi revelador de uma maturidade enorme.
    É um estádio sempre difícil para o enorme PORTO, mas nesse jogo, com Mariano em grande plano, demos uma lição de futebol, uma lição de tactica.

    Quanto à nota, o que estou desejoso de ver os nosso pupilos novamente em acção! Que saudades de ver um joguito!
    Que role a bola!
    O jogo tem trasnmissão televisiva?

    Abraço
    http://carregaporto.blogspot.com/

    ResponderEliminar
  2. Ricardo de Sousa,consta-me que é na Sporttv..

    E quanto ao texto,já não tenho mais adjectivos para qualificar não só este post como também todo o blog.
    Comecei a acompanhar o blog em finais de Janeiro,se a memória nao me falha,mais tarde,passei a comentar com mais assiduidade e desde há muito tempo que é o primeiro site que visito quando ligo o PC.

    Em frente Porto,rumo ao Penta!

    ResponderEliminar
  3. espero que, daquia 1 ano, posso estar a ler "o penta, jornada a jornada - fim" . :)
    cumprimentos

    ResponderEliminar
  4. Arrumada e bem arrumada, diga-se, a questão do Tetra, viremo-nos para o Penta, que pelo que tenho ouvido e lido, já tem dono. Mais uma vez, eles deitam os foguetes, fazem a festa e depois, lá para fins de Abril, princípios de Maio, apanham as canas da festa no Dragão.

    Um abraço

    ResponderEliminar
  5. O Penta, jornada a jornada, vai ser difícil pq, como o Vila Pouca diz, a histeria disparou e o slb já tem outra vez uma equipa maravilha e já todos a qualificam de imparável...

    Mas com mt trabalho e união de todos os adeptos Portistas tenho esperança q a festa no final surpreendentemente seja azul e branca! Outra vez!

    PS- O Falcão já é nosso.

    ResponderEliminar
  6. Mas havia dúvidas sobre o Falcão?!

    Agora vamos a ver se é ou não, o jogador que precisamos. Como já anda a ser seguido há mais de 1 ano e foi visto por muita gente que percebe de futebol, acredito que seja.

    ResponderEliminar
  7. Deliciei-me a ler este post! Parabéns! :)

    Desta série de 5 jogos, destaco os jogos com Setúbal e Marítimo. Com o Setúbal, parecia que a bola não queria entrar, e na Madeira demos o passo decisivo rumo ao tetra, numa jornada em que beneficiamos do empate do sporting em Coimbra.

    Uma semana depois, no Dragão, foi a festa tão desejada! Grandioso!

    Que comece a luta pelo PENTA!

    ResponderEliminar
  8. Excelente post, mais um! Boa vitória com o setúbal, mas o meu destaque vai para a vitória nos barreiros, jogo tradicionalmente difícil!
    Nacional em casa, finalmente o TETRA com um golo do ENORME Bruno! Estive na Trofa, deu goleada e depois um empate com os bracarenses num jogo já inclinado para a festa que se seguiria.

    ResponderEliminar
  9. Vai uns ovos moles? :) Tou mortinho que chegue a hora, vamos lá ver esses reforços carago! :)

    ResponderEliminar
  10. Está anunciado para a sportv, logo as 21.10. vou ver no café onde imperam as gaivotas, mas que ficam sempre caladinhos que nem “morcões” nos jogos do Porto. De quando em vez uns remoques entre dentes a falarem dos árbitros a nos beneficiarem. Coisas de quem tem uma azia daquelas.
    Estou em pulgas para ver as novas aquisições. Já agora qual é a doença da “escritora”.

    ResponderEliminar
  11. Viva !

    Grandioso resumo da época passada.

    Gostei imenso de ler!

    E Viva o Porto !

    ResponderEliminar
  12. Paulo Pereira,

    Como sempre, o dom da "escrita" em todas as tuas prosas, onde acabas a emprestar sublimes toques de mágica linguistica que são d'encantar.

    Sortudos aqueles que têm o prazer de ler os teus escritos... eu, sou um desses.

    3 momentos de destaque neste período:

    1- inauguração do Dragãozinho, onde fui um dos felizardos a poder assitir in-loco a mais um momento inesquecivel e para sempre recordar;

    2- carimbo do TETRA num jogo em que perante toda aquela moldura humana presente no Palco dos (nossos) Sonhos, mereceria um melhor recital de bola... salvou-se o carimbo definitivo do TETRA e pela cabeça d'um dos mais recentes Sr Porto, um tal de Bruno Alves. Depois, foi hora de descomprimir de todos os anseios ao longo da época... e dar largas a mais uma alegria indescritivel.

    3- o aniversário, mais um, o terceiro, deste nosso espaço de tertúlia... se uns são TETRA's... outros, são TRI's... desde o nascimento deste espaço que não sabemos o que é... ficar a ver navios! Somos uns sortudos, carago!

    ps - fabulástica, mais uma, a referência: "E é esse número redondinho que, a partir de agora, assombrará os sonhos dos Neandertais de vermelho" ;)

    ResponderEliminar