27 fevereiro, 2009

Dimensão Europeia

Se dúvidas houvesse em relação à capacidade deste FC Porto versão 2008-09, elas ter-se-ão dissipado terça-feira, em Madrid, em pleno Estádio Vicente Calderón. Não obstante todas as vicissitudes e adversidades ocorridas ao longo da temporada, que não importa estar agora a enumerar, o FC Porto vai na frente da Liga Sagres, está nas meias-finais da Taça de Portugal, apenas foi eliminado da Taça da Liga a pedido e, melhor que tudo isso, está a um pequeno passo dos quartos-de-final da Liga dos Campeões. Por muito respeito que as provas nacionais nos mereçam - e devem ser todas para ganhar, até para calar as vozes dos habituais invejosos e difamadores -, o verdadeiro desafio deste clube prende-se, há já vários anos, com a conquista de bons resultados internacionais e consequente crescimento cada vez mais sustentado do seu prestígio além-fronteiras.

É por isso que o jogo de Madrid constituiu, na minha opinião, o momento mais marcante da temporada até ao momento. O resultado foi curto e injusto para tanto caudal ofensivo, oportunidades de golo desperdiçadas e contrariedades surgidas. Mas o que há a reter da partida é a forma personalizada e ambiciosa como o FC Porto se exibiu na casa de uma das mais representativas equipas espanholas, que não está a passar por um bom momento, mas cuja qualidade do plantel está acima de qualquer suspeita. Com aquela atitude e categoria, podemos estar confiantes no futuro e convictos de que o trabalho que está a ser feito é competente e vai no bom caminho. Fiquei feliz por perceber que esta equipa continua com a dimensão europeia que conquistou ao longo das últimas décadas, algo que me parece vital preservar. E convém lembrar que o técnico madrileno Abel Resino errou, não sei se por desconhecimento ou para desculpabilizar o resultado negativo, ao dizer que os jogadores portistas já jogam juntos há muito tempo. Do onze inicial azul e branco que defrontou o Atlético, seis elementos chegaram esta época ao clube.

Campeonato e Taça já não chegam. Só nos devemos contentar se abraçarmos também carreiras europeias à altura da nossa grandeza actual, que faça jus ao nosso estatuto de clube português mais reconhecido e respeitado internacionalmente. Por perceber que estes jogos são os mais significativos, a adrenalina esteve sempre no máximo durante aqueles intensos 90 minutos e chegou a ser angustiante ver o FC Porto a dominar e a não conseguir marcar.

Já muito de discutiu acerca do modelo preconizado para esta temporada pelo técnico Jesualdo Ferreira, de descurar a posse de bola e o domínio constante do jogo, para apostar na objectividade das transições ofensivas rápidas. De certa forma, pode dizer-se que este é um modelo de equipa pequena adaptado às exigências de uma equipa grande. A opção de Jesualdo é discutível e, quiçá, até contra-natura. Uma equipa como o FC Porto deve sempre assumir o jogo, dominar o adversário, apostar no ataque continuado, ter jogadores capazes de efectuar posse de bola constante, possuir engenho para abrir defesas porfiadas, dirão alguns. Assim ao estilo do FC Porto de Mourinho, de tão boa memória, ou do actual Barcelona de Guardiola, ressalvando as devidas proporções. É uma ideia que faz sentido. Mas se o nosso desafio maior é o europeu e se na Europa não funcionámos como colosso mas como 'outsider', talvez o rumo tomado também seja defensável com argumentos sólidos. É verdade que esta nova mentalidade da equipa, mais explosiva e menos paciente, mais letal e menos talentosa, já nos causou alguns dissabores, no Dragão, diante de adversários menores, que chegam e estacionam o 'autocarro'. No entanto, também é um facto que fora de casa temos sido intratáveis, inclusivamente na Liga dos Campeões (exceptuando o desastre de Londres), algo que antes era mais difícil acontecer.

Jesualdo Ferreira definiu uma estratégia e assumiu o risco. Com dois campeonatos no bolso e sabendo que na Champions fomos eliminados duas vezes consecutivas nos oitavos-de-final, importava tentar detectar as razões do insucesso externo. Se pensarmos no modo como saímos da máxima competição de clubes, adoptando um modelo de equipa grande, talvez cheguemos a algumas respostas. Em 2006-07, o Chelsea era melhor que nós, tinha jogadores com mais qualidade. Ora, não conseguindo assumir o jogo como queria e era da sua natureza, dada a maior valia do opositor, especialmente em Londres, a nossa equipa não se sentiu cómoda, foi obrigada a actuar contra os seus princípios de jogo. Se estivesse configurada tal como está actualmente, talvez José Mourinho tivesse caído aos nossos pés. Quem sabe? Em 2007-08, vergamos perante um inferior Schalke 04, porque, primeiro, em Gelsenkirchen, nunca nos encontramos diante da pressão ofensiva dos alemães e nunca conseguimos responder em contra-ataque e, segundo, no Dragão, fomos competentes em ataque contínuo mas tivemos pela frente um guarda-redes que realizou a exibição da vida. Imaginemos este FC Porto de raides supersónicos contra aquele Schalke. Ninguém sabe, mas talvez a desilusão não tivesse acontecido.

Então, por que não correr riscos internamente para lutar por um ideal maior? Por que não atacar a Velha Europa com um modelo de 'sniper'? Por aquilo que vimos em Madrid, em Kiev, em Istambul (e até em Alvalade, na Luz e em Braga), até que pode ter a sua lógica. Defendendo bem e com a transição ofensiva rápida como arma letal, fica a sensação que poderemos surpreender qualquer rival, mesmo mais poderoso, sensação essa que não existia nas duas temporadas anteriores. Não há verdades absolutas. Confesso que, por vezes, gostava de ver este FC Porto a ter maior capacidade de posse de bola, a mostrar mais talento para ultrapassar defesas cerradas, a denotar maior propensão para pressionar o portador da bola mais longe da sua baliza, enfim, a comportar-se como grande equipa que é. Mas ninguém contesta que é um autêntico regalo ver a forma devastadora como o FC Porto contra-ataca, contando para isso com o quarteto ofensivo ideal para traduzir essa forma de jogar em golos. Lucho é o cérebro, o lançador dos ataques. Hulk e Rodríguez são as balas apontadas à cabeça do adversário. Lisandro é o 'serial-killer', leia-se melhor marcador da Champions League.

Estas exibições como a que realizámos na capital da prepotente Espanha revestem-se de um valor incalculável. Quem está acostumado a ler o que se escreve no país vizinho acerca do futebol luso, sabe perfeitamente que Portugal continua a ser uma espécie de província castelhana e que estamos para eles, como a Grécia ou a Turquia, por exemplo, estão para nós. Não nos dão muita expressão. É norma evidenciarem um sentimento de superioridade e arrogância relativamente aos portugueses. Vê-los dizer que o Atlético Madrid só não foi goleado por milagre, vê-los admitir que o FC Porto foi muito superior, vê-los tecer rasgados elogios a jogadores como Hulk e Lisandro, é sintomático. É assim que se cresce, se granjeia respeito, se adquire fama e se ridicularizam vozes que dão conta do maior reconhecimento internacional do clube dos 6 (ou serão apenas 2,2??) milhões. Mais reconhecido só se for a tentar entrar na enorme Champions League pelo outro lado, porque fazê-lo a jogar futebol, estamos conversados...

Talvez seja um sonho impossível a breve prazo, talvez seja pensar demasiado grande, mas eu quero ver o FC Porto campeão europeu pela terceira vez. E esta equipa, a jogar desta forma 'assassina', faz-me acreditar que é possível. Um sonho muito difícil, mas possível. E a nossa vida compõe-se de sonhos!

7 comentários:

  1. Quanto ao presente e próximo Porto-Sp.: Os mouros lagartos já estão a inventar desculpas e a fomentar odioso com aquelas bocas da antecipação... A nossa Direcção tem de se deixar de panos quentes e pôr os pontos nos iis!
    E têm de ver o que estão a fazer... Consta que dos convites distribuídos pela SAD, os quais depois têm subdistribuição posterior a particulares, há bilhetes a serem dados a sportings ferrenhos... Afinal como é?

    ResponderEliminar
  2. Amigo Bruno este é um grande trabalho de analise, muito e bons pontos focados, mas muitos outros de natural enfoque por dizer...como p.ex..é um facto que kd a s transiçoes sao fortes e eficazestudo parece ouro sobre azul a verdade é k numa equipa que controla e toma pouco a bola faz mal a gestao do curso de jogo o poe-se muito a jeito defensivamente...e para mim mais que os dissabores que ja tivemos esta epoca sao fruto nao dos autocarros que muitas equipa utilizam no Dragão mas sim de um deficit defensivo evidente...ainda ontem ouvia que uma ekipa ataca melhor tanto quanto melhor defende..eu eu concordo significativamente...Talvez muitos estao esquecido do Porto de IVIC ou outros , um dos pontos fortes dos Dragões sempre foi o seu ultimo reduto hoje tal nao se passa..feitos como inviolabilidade das redes por enormes minutos e jogos a fio...melhore defesa este ano o Braga é por exemplo um bom exemplo disso e veja o bom futebol k joga...
    Ainda assim os resultados permitem-nos um caminho mais sofrego mas onde os objectivos se vao cumprindo.

    ResponderEliminar
  3. Nem tanto ao mar, nem tanto à terra. ESte Porto, defensivamente sujeita-se muitas vezes dando espaço e parecendo recuar as linhas demasiado dando-me cabo do coração.

    Mas compreendo q com os jogadores q temos à frente a equipa tenha q ter alguns princípios aqui defendidos e explicados.

    Mas tb te digo uma coisa, Bruno, tu q tanto defendes Jesualdo e nisso tens sido coerente:

    Se amanhã para defesa direito a escolha recair em Pedro Emanuel, o Jesualdo vai voltar a sujeitar-se e muito. Sem lateral a única solução válida passa por tomás costa.

    ResponderEliminar
  4. Já satirizaram o Paulo Hi5 Bento. Ver aqui:

    http://www.fhqhosting.com/ui/1paulobento.jpg

    ResponderEliminar
  5. Concordo que a falta de pressão ao adversário e a forma como, por vezes, se o deixa avançar sem grande oposição, é um aspecto que pode e deve ser melhorado, já o disse diversas vezes por aí na caixa de comentários.

    No entanto, não se pode ter tudo ao mesmo tempo. Se o FC Porto quer fazer das transições o seu ponto forte, não pode pressionar sempre alto, pois assim não disporá do espaço necessário nas costas para as explosões de Hulk e Rodríguez. Mas é verdade que o FC Porto, às vezes, recua muito e é pouco agressivo. Um exemplo disso é o 2º golo do Atlético, em que Forlán avança metros e metros e ninguém lhe sai ao caminho.

    Mas a ideia fundamental é que o grande desafio é o europeu. E atendendo às características dos jogadores que temos, não tenho dúvida que, na Europa, o modelo de transições rápidas é o que nos pode garantir maior sucesso.

    Por outro lado, bato na mesma tecla. O FC Porto perdeu 3 jogadores fundamentais. No onze de Madrid, actuou com 6 jogadores que chegaram esta época. E enquanto Sporting e Benfica andam a formar equipas há não sei quanto tempo com os resultados que se conhecem, Jesualdo só precisa de um ano para formar uma equipa quase nova e pô-la a alcançar resultados superiores aos rivais. Tendo em conta todas as circunstâncias, o trabalho de Jesualdo nesta temporada, não tem sido bom, nem muito bom, tem sido EXCEPCIONAL.

    ResponderEliminar
  6. Eu preferia um Porto que fosse competente em ataque continuado, como fazia com Robson, Santos ou Mourinho, do que este de contra-ataque. Mas o Bruno Pinto se calhar tem razão quando diz que assim é mais fácil bater o pé aos poderosos da Europa. Com mais acerto na finalização, o Porto podia ter dado 5 ou 6 à vontade ao At.Madrid. Embora também ache que a equipa nos provoca muitos calafrios quando defende tão atrás e sem agressividade.

    Concordo que Pedro Emanuel não pode nunca jogar a lateral e aí Jesualdo inventou bastante. O Fórlan passou por ele com uma facilidade que até meteu dó. Se não houver Sapu nem Fucile, tem de ser o Tomás Costa. Também acho que Cissokho tem muitas limitações tácticas ainda, principalmente a defender, e isso viu-se no 1º golo em Madrid. De resto, acho que a equipa está agora bem definida e o onze está bem estabilizado, o que é bom. Só acho que Lisandro devia jogar no meio e Hulk na direita e não o contrário como tem acontecido. Lisandro, como se viu em Madrid, é um goleador nato, tem de jogar no centro do ataque para poder ser efectivo como foi na época passada. Na direita, marca poucos golos e desgasta-se muito sem necessidade. E mesmo para o Hulk acho que partindo da direita, o seu futebol pode sair beneficiado, quando flecte para dentro e remata de pé esquerdo.

    Com o Sporting é para ganhar. Vukcevic de fora é uma boa notícia.

    ResponderEliminar
  7. Óptima análise, lançando vários temas para debate.

    Aquele que, nesta fase, me parece mais pertinente, tem no seu epicentro Jesualdo Ferreira. Alvo cíclico de críticas, o técnico portista tem no entanto conseguido amealhar títulos internos para o palmarés do clube, sendo ao mesmo tempo a única voz que se levanta contra a barragem de ódio e mesquinhice lançada contra nós.

    Trabalhar assim, nestas condições, não será fácil, sobretudo se pensarmos que foi o treinador dos azuis e brancos em pleno rebentamento do Apito Dourado. Um trabalho desgastante, sem a devida cobertura das chefias, mas provando que é um técnico que merece os encómios da massa adepta portista.

    A questão europeia tem sido, no entanto, o calcanhar de Aquiles, sendo notório que este ano, se ultrapassarmos os colchoneros, a equipa poderá sonhar...

    É uma equipa claramente com lacunas, mas que tem potenciado os seus pontos fortes, como o demonstram as brilhantes vitórias fora de portas conseguidas. Se a finalização, desastrada na maioria das vezes, for calibrada, teremos uma equipa coesa, série, digna, podendo ombrear competitivamente com qualquer outro interveniente na Champions.

    Agora vou-me, assistir à inauguração da 109ª casa do Porto, em Mira, com a presença de Pinto da Costa.

    ResponderEliminar