27 julho, 2009

Entrevista com Américo, o «guarda-redes suicida»...

Sexta-feira passada, freguesia de São Paio de Oleiros, concelho de Santa Maria da Feira, Clínica BOA-HORA, na hora previamente agendada, encontro com o guarda-redes, Américo Ferreira Lopes, uma referência e antiga glória da história do FC Porto, na década de 60.

A ideia deste diálogo, tinha já surgido há tempos bem atrás, mais propriamente, aquando de um comentário feito por um autor que agora sinceramente não me recordo, numa das caixas de comentário deste espaço de tertúlia, quando se referia ao próprio como actualmente a residir em São Paio de Oleiros, uma das freguesias pertencentes ao concelho de Santa Maria da Feira.

De imediato, procurei saber o máximo de informações possíveis que me pudessem levar ao encontro deste, até porque São Paio de Oleiros, dista apenas «1 minuto» de distância do meu local de emprego… qual não foi o meu total e completo espanto, quanto já conhecedor da sua residência, me dirigi ao local para o abordar e propor esta entrevista, surgindo-me uma pessoa que conheço, de vista, é verdade, já há cerca de 15/16 anos, pois diariamente me cruzo com ele a caminho ou no regresso do emprego. De facto, este mundo é pequeno, muito pequeno.

Depois de um breve diálogo de circunstância, e aceite que foi o convite formulado, combinamos dia e hora para a entrevista, o que foi para mim, um prazer especial, aliás, muito especial, pelos motivos (históricos) atrás expostos, mas porque de facto, o nosso guarda-redes, Américo, para além de ter sido uma das referências do FC Porto na sua época, é um Senhor na arte de bem receber, simpático qb, e onde me deliciei durante cerca de 60 minutos a ouvir 1001 histórias da sua vida futebolística, que, como lhe disse, "dariam um livro, e que livro, carago!".

Bem, resta-me agradecer mais uma vez, a especial simpatia e cordialidade com que fui presenteado pelo Sr. Américo Ferreira Lopes, o «guarda-redes suicida» da década de 60 do FC Porto, no seu local de actividade profissional, onde dirige magnificamente a clínica Boa-Hora, em São Paio de Oleiros… não sem antes, agradecer também a preciosa ajuda dos Amigos deste espaço de tertúlia, o VilaPouca e o Jorge Aragão, que fruto da sua vivência de vida, me ajudaram e muito a elaborar a condução desta entrevista, [actualização: mas também ao Amigo, Armindo Pinto, que conhecedor deste «furo», muito simpaticamente, me fez chegar uma série de 4 fotografias de enorme valia histórica e clubistica, que foram já obviamente adicionadas a este post; a todos vocês os 3, em nome do blog, o nosso muito obrigado!!] em mais um exclusivo do blog BiBó PoRtO, carago!!. Bem, leiam e deliciem-se…

    AMÉRICO FERREIRA LOPES
    guarda-redes do FC Porto na década de 60

  • CLUBE (na época)...

  • Ainda se recorda do dia em que assinou contrato com o FC Porto? O que sentiu naquele momento?

    Eu fui para o FC Porto muito cedo, de olhos fechados, com 16 anos. Naquela altura, com aquela idade, não se podia jogar, só com 17 anos feitos ou com autorização do Ministro. Mandaram-me embora, mas pediram-me para não assinar por nenhum clube, porque logo que fosse possível, vinham buscar-me… e assim foi. A data exacta não me recorda, mas sei que foi em 1949.

    Depois, fiz 2 anos de juniores, e no mesmo ano de juniores, passei para a reserva.

    O que é que senti? Repare, naquela altura, eu só via e pensava no FC Porto, portanto, imagine, foi uma coisa fora do normal.

    Naquela altura, ao FC Porto, ganhar campeonatos, era digamos quase que uma miragem. Na sua opinião, o que é faltava de facto ao FC Porto, para os conquistar? O clube era de facto mais fraco e menos organizado do que os outros?

    Eu tenho a impressão que, e ao longo do tempo chegamos a essa conclusão, o FC Porto, embora fosse já um «grande» nessa altura, faltava-lhe um estatuto a sério de força. Depois, havia a parte, que era a pior, a politica que existia fora do clube: Federação, Arbitragem, etc etc.

    Nós sentíamos muito dificuldade em vir cá para cima, perseguidos até, e quando estávamos quase a chegar lá, e fui até muitas vezes 2º classificado, mas sempre e sempre, com muita dificuldade. Parecia que não haviam condições para sairmos daquele «buraco».

    Estou precisamente convencido que foi no 25 de Abril de 1974, que as portas se abriram definitivamente.

    Sentia que o Benfica, nessa altura, controlava as arbitragens?

    Eu não sei de onde ela vinha, o que sei é que vinha, entende?

    Agora, dizer que era do Benfica, do Sporting ou de outro lado qualquer, não sei, mas o que é certo é que ela existia e era por demais evidente.

    Aliás, até lhe recordo uma taça de Portugal que perdemos com o Benfica, julgo que em 63 ou 64, onde insultámos o árbitro do principio ao final do jogo, até mesmo o Presidente da República que estava na tribuna, e o árbitro não expulsou ninguém… fomos de tal modo «roubados» que entre tantos e tantos insultos que lançamos ao árbitro de toda a maneira e feitio, perguntávamos-lhe muitas vezes, ao árbitro, “se não tinha vergonha na cara de estar a arbitrar daquela maneira”. Agora, esta foi uma delas, mas elas eram tantas e tantas que imagine, alguma coisa tinha que se passar.

    O que esteve na origem do seu afastamento, por José Maria Pedroto, numa altura decisiva da época 68/69 – eram líderes isolados – e que nos custou um título?

    Essa é uma história que me causa muita tristeza. Hoje, e até porque já falei muito nisso, não gostaria muito de estar a falar nisso, porque o José Maria Pedroto já morreu e por isso, não tem possibilidade de a contestar, entende?

    Foi um drama muito perigoso, porque embora muitas pessoas o digam, eu, enquanto ele foi nosso treinador, não gostei dele. Depois, eu sai do clube, ele também, regressou, tendo dito que modificou, não sei se sim ou não. Agora, enquanto «meu treinador», não gostei.

    Os problemas foram assim tão graves que através de um diálogo entre pessoas de bem, não pudessem ser sanados?

    Repare, há certas e determinadas coisas que eu não divulgo a ninguém, mas como ele já faleceu, não tenho moral algum para estar a falar em coisas que não possa haver o contraditório. Para onde eu for, se o lá encontrar, haverei de lhe dizer, mas agora, não queria muito falar nos detalhes.

    No entanto, não foi nada de muito grave. Aconteceu tudo por causa de um jogo, porque ele era demasiado ditador e o plantel, entre nós, procurávamos dialogar sobre o que correu mal, o porquê, como deveríamos fazer no próximo jogo, etc, mas com ele, este discurso, era complicado.

    Recordo-me perfeitamente de um treino, numa 3ª feira, depois de termos perdido o jogo no fim-de-semana, ele reuniu-nos no pavilhão e um a um, perguntou-nos o que pensávamos do que tinha acontecido no último jogo e o que estava mal. Cada um, sem medos, respondeu o que era a sua opinião. No final da palestra, sabe o que ele nos disse? Eu digo-lhe: "O que vocês acham não me interessa. O que se tem que fazer, sou eu que mando!".

    Depois, fomos jogar com o Benfica para o campeonato e se não me falha a memória, eles tinham perdido em França, para a Taça dos Campeões por 3 ou 4 a zero. Ele, na palestra, disse-nos que era fácil o jogo, que se tinham levado 3 ou 4, também iam levar de nós, os mesmos 3 ou 4… afinal, aconteceu o contrário. A partir dali, achou que deveríamos entrar em estágio até ao final do campeonato, e foi a partir desse momento, que a «bomba» estourou, mas não foi só comigo, mas sim com todos.

    Mas há muitas e mais histórias. Já tive há uns anos atrás, um Director do clube, que queria fazer um livro sobre a minha vida, mas eu disse logo que «não», porque não estava para fazer um livro como estes que aparecem, entende?

    Para aceitar isso, teria que dizer muitas e muitas verdades e acabaria por ferir muita gente. Assim, não faço livro algum, porque eu quero andar na rua de cabeça erguida e não ter medos de ir à cidade do Porto, e até mesmo ao clube, entende?

    O que representou para si, ter vencido a taça de 68?

    Todos os títulos são inesquecíveis, porque quem tem brio nesta profissão, quer alcançar qualquer coisa, e o que vier, é sempre bom. Um campeonato, uma taça, etc etc, e nós, sentimo-nos orgulhos desses troféus. Tenho muito orgulho nos 3 títulos que conquistei no FC Porto.

    Porque razão era muitas das vezes, apelidado de “guarda-redes suicida”?Não sei de onde veio essa alcunha. Eu tive muitas. Primeiro era o suicida, depois as mãos não sei de quê, depois o homem que tinha uma vaca em casa que tirava o leite para ter a sorte que tem, etc etc.

    Se havia coisa que nunca tive, foi medo… e durante os jogos, dizia isso muitas vezes aos adversários. Actualmente, os guarda-redes jogam muito dentro da baliza e eu não, jogava dentro e fora da baliza, muito fora mesmo.

    E então, quando encontrava jogadores altos, como o Torres, o Eusébio, e outros, eu dizia-lhes que “era matar para não morrer”. Não digo que eles tivessem medo, mas era uma questão de impor respeito. O Eusébio, nunca me marcou um golo isolado e muitas das vezes, ainda falamos disso.

    Que recordações guarda dos duelos com Eusébio?

    O Eusébio foi um enorme jogador. Tinha sempre que estar com uma atenção enorme com ele, porque para além disso, tinha um pontapé muito forte e rematava de qualquer jeito e feitio. Mas foi um jogador que foi sempre leal, não tenho nada que dizer dele. Somos amigos e falamos quando nos encontramos. Tenho até a impressão que o Eusébio eram bom demais, deixando-se muitas vezes ir na onda.

    Qual o jogador que mais apreciou nos tempos em que lá jogou?

    Eu tive vários jogadores que naquela altura, sobressaíam do lote do plantel… era o Hernâni, o Carlos Duarte, o Perdigão, o Pedroto, o Miguel Arcanjo, etc. Mas para mim, os dois principais, eram o Hernâni e o Carlos Duarte.

  • SELECÇÃO NACIONAL...

  • Em 1966, sentiu que deveria ter sido o nr. 1 dos Magriços?

    Sentia, até porque nessa altura, era o guarda-redes menos batido da Europa e não me impressionavam nem um pouco, os grandes jogos. Fiquei surpreendido quando os jogos começaram, não me colocavam, depois mete o José Pereira que praticamente não tinha sido internacional, e por curiosidade, diziam-me sempre que ia jogar, o que era ainda mais estranho.

    Acha que tal não aconteceu só porque era jogador do FCP (tal como o Pinto ou o Nóbrega)?

    Sim, acho isso claramente. Se eu fosse jogador de outro clube, se calhar, era capaz de ter jogado. A Selecção era constituída por um Senhor que já faleceu, que mais tarde, me pediu muitas desculpas, até mesmo na TV, por não me ter colocado a jogar, porque foi o maior erro da vida dele, mas que tinha que ser.

    Repare, o Otto Glória, que também já faleceu, foi treinador do Benfica e do Sporting, o Manuel Rodrigues Afonso, tinha sido director do Benfica, o Gomes da Silva era o coordenador da selecção, que era do Belenenses e portanto, os jogadores entravam a jogar com entorses, com isto e aquilo, e nós no banco a assistir ao «espectáculo».

    Como viu, no banco e no mundial de 66, a participação portuguesa e as prestações do GR titular?

    A equipa em si, esteve muito bem, no entanto, quanto a mim, o grande erro, foi no jogo contra a Coreia, porque nós conhecíamos muito bem a selecção da Coreia, que era muito fácil de ultrapassar e então, dava a possibilidade de outros jogadores jogarem e recuperar os que eram titulares a 100%, que era o caso do José Graça, o Simões e muitos outros.

    É lógico que ele como estava virado para jogar com o antigos jogadores dele, esqueceu-se de que os jogadores não são máquinas e precisam descansar, e depois, teve ainda uma particularidade muito triste, ou seja, no jogo com a Inglaterra, nós estávamos prontos para esse jogo, queríamos jogar, para ver se íamos ou não à final.

    O que acontece é que ele era uma pessoa muito nervoso e que se perdia muito quando falava, e na palestra antes do jogo, disse que íamos jogar com a Inglaterra, mas que não havia muito aquela coisa de se ganhar, porque já fizemos o nosso papel, etc, ou seja, antes de incentivar os jogadores para esse jogo, os meus colegas foram para o jogo cansados… e desmoralizados.

    Foi uma pena, porque poderíamos ter ido à final e ganhá-la, mas como uma final é sempre uma final, pelo menos, tínhamos lá ido… e na minha opinião, as coisas poderiam ter sido feitas de outra forma a criar outro grau de motivação, porque repare, um treinador quando diz ainda antes do jogo que se pode perder o jogo, porque já se tinha feito um brilharete, não faz sentido.

    Lembra-se daquele Itália-Portugal, a seguir ao mundial 66, em que fez uma exibição extraordinária?

    Lembro, muito bem. Vou-lhe dizer, na selecção, modéstia à parte, joguei sempre bem. Aliás, fui sempre um jogador da média para cima, sempre na mesma bitola, sem altos e baixos, onde nos jogos com o Sporting, nunca perdi (num dos jogos, até me pediram para eu me ir embora, porque defendia tudo; noutro, até no intervalo, pedi para ser substituído, porque eu disse que não aguentava mais, porque eram constantes bolas para cima da minha baliza)… já com o Benfica, aconteceu de tudo, mas sempre jogos muito renhidos.

    Nesse jogo com a Itália, foram 90 minutos de luta permanente, sempre a defender tudo e mais alguma coisa, onde ainda antes do jogo, os jornais italianos diziam que íamos levar meia-dúzia de golos, o que a mim pouco importava.

    Defendi tudo, sempre a ser massacrado, até que um erro do José Augusto, dentro da área, que começou a driblar, e eu a pedir-lhe para ele me dar a bola, veio um atacante italiano e roubou-lhe a bola e marcou golo. Empatamos 1 a 1, mas fiz um jogo brilhante. O seleccionador deles, numa resposta a uma pergunta de um dos jornalistas, disse que com o guarda-redes de Portugal na baliza de Itália, era Campeão do Mundo.

    Nessa altura, de Itália, telefonavam-me muitas vezes a pedir entrevistas, quanto ao jogo, mas também porque sem querer, acabei por partir uma perna a um dos avançados italianos que jogava não sei onde, mas que ia para o Milão (não o Inter), onde lhe lançaram a bola metida nas costas dos nossos defesas, e quando ele a está para receber, eu saio da baliza pelo ar e sem querer, parti-lhe a perna, que foi a tristeza que tive nesse dia, onde depois o fui até visitar ao hospital.

    Foi um jogo para nunca mais esquecer, mas este, foi apenas um deles, já que tive muitos outros.

    Por falar em selecção, o que achou da novela, Baía vs Scolari?

    Eu, não teria encarado a situação como o Vítor Baia o fez, onde ainda na inauguração do Estádio do Dragão, tive oportunidade de lhe dizer pessoalmente. Disse-lhe que se fosse comigo, esse Senhor teria que me dizer porque razão não me convocava. Aliás, na minha opinião, esse Senhor não é treinador de nada, que não percebe nada e nunca disse o real motivo para não convocar o Vítor Baia.

    Este processo Vítor Baia, foi um escândalo… eu disse-lhe algumas vezes que o que lhe estava a acontecer, era o mesmo que me aconteceu em 1966. Os dirigentes não são os mesmos, mas as estruturas, são capazes de ser as mesmas.

    Eu tenho a impressão que quando ele veio para a selecção, já vinha com os nomes marcados para riscar. Não é possível que um seleccionador que tem o melhor defesa-central da Europa (Ricardo Carvalho), um Maniche numa forma fantástica, e outros, e que só os coloca a jogar porque perde com a Grécia e os jornais lhe começaram a cair em cima, e ele então, sentiu a necessidade de os colocar, porque senão, nunca os iria colocar.

    Ele não sabe meter um jogador no decorrer do jogo, ele manda-os lá para dentro e eles que se desenrasquem… é o típico treinador brasileiro.

  • CLUBE (na actualidade)...

  • O que representa para si, de facto, o FC Porto?

    O FC Porto representa uma grande parte da minha vida, já que comecei muito cedo naquela vida, mas apesar de ser Portista, não sabia o que era o clube, porque só depois de lá estar, é que me apercebi do que aquilo era.

    O que aprendi, embora tenha tido muito sorte, obrigou-me a pensar, reflectir e arranjar um rumo para a minha vida, que felizmente, soube sempre bem conduzir na minha vida.

    É certo que o FC Porto deu-me muito a ganhar, mas eu também dei muito ao clube. Eu cheguei a jogar em situações totalmente incompreensíveis pelo clube. Partiram-me o menisco e mais qualquer coisa no principio de uma época na Luz e acabei a jogar o campeonato todo com essa lesão, que eram debelados com muito descanso e tratamentos consecutivos.

    Fiz-me homem no FC Porto, tive uma excelente escola, mas também dei muito de mim ao clube.

    Hoje, ainda segue o trajecto actual do clube com paixão?

    Eu não posso ter outra, então, se eu vivi toda a minha vida no FC Porto, aliás, vivi mais no clube do que na minha própria casa, porque chegava a entrar em estágio na 5ª feira, jogava ao domingo, muitas vezes ia para a selecção em Lisboa à noite, ou seguia com o FC Porto para as competições europeias, e chegava a estar 2 a 3 semanas sem vir a casa, sempre em estágio. A minha esposa estava semanas sem me ver, muitas vezes, 15 dias consecutivos.

    Era uma vida muito, muito complicada… no Campeonato do Mundo, estive 3 meses sem ir a casa; o campeonato acabou em Maio e só cheguei a casa em Agosto. No entanto, já naquela altura, ganhava-se muito dinheiro no futebol. Imagine que o meu empregado mais bem pago, na casa Magriço no Porto, ganhava por mês, 3 contos… isso, era quanto eu ganhava num prémio de jogo, muitas vezes até mais do que isso (4 a 6 contos).

    A casa onde eu moro, esta aqui logo abaixo (São Paio de Oleiros), foi construída e paga só com o prémio do Campeonato do Mundo. O primeiro dinheiro que ganhei no futebol, investi na construção de 6 casas, portanto, naquela altura, já era bastante dinheiro, mas era preciso ter os pés bem assentes no chão, porque quantos e quantos se perderam com a «boa vida» que o futebol nos proporcionava?

    Já que fala nos ganhos do futebol, lembra-se do fantástico carro Triumph Spitfire que tinha e que atraía o olhar dos jovens, mas sobretudo, das fãs?

    Sabe o que eu fazia? Atestava o depósito do carro e andava com uma única nota de 20 escudos na carteira porque as tentações eram tantas, que assim, tinha sempre forma de as «afugentar», porque dinheiro na carteira, não as tinha.

    Quanto ao carro, esse Triumph Spitfire, ficou-me praticamente de borla, porque foi-me proposto que eu andasse com ele para publicitá-lo… quando me fizeram a proposta, porque não aceitar? Nem hesitei. Troquei o Cinca que tinha, já muito antigo, e fiquei então com esse Triumph Spitfire, que era um carro maravilhoso, quase ninguém o tinha, e por isso, está a imaginar eu a andar nas estradas, a chegar ao Porto, com aquele carro? Imagine só as tentações que nos surgiam.

    De qualquer modo, a dada altura, acredite que é verdade, cheguei a «odiar» as mulheres pelos interesses que mostravam só por eu ser quem era ou ter o carro que tinha. Recebia dezenas de cartas de fãs e até as levava para casa para mostrar à minha esposa, para nos rirmos do que me escreviam.

    Tive até uma vez, uma senhora que num café, me disse na cara que eu não era homem, só porque recusei. Eu só lhe respondi: “olhe minha senhora, à minha beira, você, está no A, eu já estou no Z… portanto, imagine o quanto ainda tem que andar só para eu estar com a senhora!”.

    O que sentiu nas grandes vitórias internacionais do FC Porto em 1987, 2003 e 2004?

    Uma pessoa que é Portista, não pode ficar de outra forma, que não deslumbrado e alegre por essas conquistas, de certa forma até, quem como eu viveu por dentro o clube e sabe o que custou a chegar até à actualidade.

    Porque nunca aparece nos grandes momentos do FC Porto, já que foi um extraordinário guarda-redes e uma referência?

    Olhe, quando sou convidado pelo clube, dificilmente falho. Agora, o que eu não gosto, é andar a pedinchar, a mendigar para estar, onde não me convidaram. Ainda recentemente, me convidaram para estar presente na inauguração do pavilhão (Dragão Caixa) e eu fui, mas porque me convidaram, caso contrário, não teria ido. Ir por ir, para aparecer nos jornais, nas tvs ou nas rádios, não, não vou, porque não me interessa para nada esse espectáculo.

    O que me interesse de facto, é a minha vida pessoal e o meu trabalho aqui na clínica. Raramente vou ver jogos ao Porto, porque tenho as minhas obrigações profissionais, enquanto «patrão», entende? Agora, vejo os jogos todos na tv, quando não vou ao estádio, mas primeiro, está a minha vida pessoal e profissional, porque tudo isto que você vê, custou-me muito, muito a conquistar, porque se facilito, de um momento para o outro, tudo vai por água abaixo e depois, nessa altura, ninguém quer saber ou se recorda de mim.

    Quando sou convidado e entendo que devo estar presente, vou… não é por ser mais ou menos longe, ou meia-dúzia de trocos de custo de gasolina que vou morrer.

    Muitas das vezes, aqui na minha actividade profissional, sou confrontado por fornecedores que mais tarde, ao saberem quem sou, me perguntam porque é que já não tinha dito quem era. O que responde sempre é a mesma coisa: “isso interessa para o quê? se tenho dinheiro, vendem-me… se não tenho, não me vendem”. Tão simples quanto isto.

    Na actualidade, Hélton, Beto ou Nuno?

    Eu não queria falar muito nisso, porque não é justo dar a minha opinião. Na minha altura, eu jogava de uma forma. Hoje, eles jogam de outra forma e reconheço o seu valor, não é isso que está em causa. Dar a minha opinião, só poderia falar bem. Lembro-me de um antigo guarda-redes do FC Porto que costuma falar e dar algumas opiniões, mas que nem me lembra do nome dele, porque não me lembro de o ver a jogar sequer. Ele tanto falou e deu opiniões, que a uma certa altura, tive que deixar de falar com ele, entende? Eu não quero que aconteça com eles, o mesmo que fizeram comigo, entende?

    Se eles estão no FC Porto, é porque têm categoria, ponto final. Podem dar o seu frango, porque eu também os dei. Agora, falar mal deles, é o mesmo que falar mal do clube que eu adoro e por isso, não me pronuncio.

    Acredita na conquista do PENTA na próxima temporada?

    Acredito, mas já no ano passado, se dizia a mesma coisa. Portanto, eles só têm é que honrar o clube e o peso da camisola que envergam, que é a única preocupação que devem ter quando entram em campo, treinam, jogam particulares ou oficiais, torneios, etc. Aquela camisola do FC Porto, já na minha altura, tinha um peso enorme… e hoje, por tudo, tem um peso tremendo, muito maior, portanto, eles só têm é que a honrar e respeitar.

  • CONCLUSÃO...
  • Actualmente, o que faz?

    Durante a semana, estou aqui na clínica, de manhã à noite, quando fecha, só parando para almoçar das 13h às 14h. Saio pouco, mas quando saio, é para ir comprar isto ou aquilo aqui para a clínica.

    Aos fins-de-semana, tenho uma quinta, com muitas árvores de fruto e uma casa toda rústica e entretenho-me por ali nas lides da manutenção da quinta.

    Uma palavra final para os nossos leitores.

    O nome do blog, já diz tudo: “BiBó Porto, carago!!”. O que lhe digo, é que os Portistas a sério, aplaudem, apoiam, incentivam os jogadores quando eles precisam, ainda mais nas horas más, não é quando se está a ganhar e a jogar bem, que dê moral e força na transição do mau para o bom, isso é que é preciso. Todos da estrutura do FC Porto, precisam de apoio. Um abraço para todos vocês.

21 comentários:

  1. C'um carago Blue, os meus parabéns, absolutamente espectacular!! A ti, e a todos aqueles que propocionaram mais este exclusivo, fantástico!

    Américo Ferreira Lopes, um símbolo sem dúvida, do nosso historial!

    Abraço

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  2. Armando Pinto27 julho, 2009

    Ó Blue Boy, pregas-me assim uma... Sabes que o Américo foi o meu grande ídolo da minha meninice? Ainda recentemente, na inauguração do Dragão Caixa, foi dos momentos que mais me tocou, quando vi esse Américo dos meus inícios de Portismo... Parabéns por este grande momento editorial!
    Armando Pinto

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  3. Blue, meu caro, tirando o facto de te dirigires a mim como Vila Pouca e não como "presidente" do "dragão até à morte", tenho a dizer-te, que esta entrevista a Américo, que foi um dos melhores guarda-redes que vi jogar em toda a minha vida e que assinalou nesse Itália-Portugal, uma exibição, que se fosse nos tempos de hoje, batia o record do You tube, é um furo extraordinário e mais uma página brilhante do Bibó-PorTo.

    Parabéns, Blue, tu sim, és o verdadeiro presidente.

    Acho até, que devia ser copiada e colocada em comentário, nos blogs portistas com a referência ao Bibó-PorTo.

    Um abraço

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  4. Caros PORTISTAS

    Realmente meus caros esta entrevista é fenomenal até porque nos retrata para alem de uma grande gloria do nosso FCP dá-nos a conhecer fundamentalmente um ser humano como já poucos existem daquela velha guarda em que o que contava eram os valores. È realmente um homem com H grande o nosso grande Americo em personalidade dedicação Honestidade Humilde mas com uma personalidade indomavel Orgulhoso mas não vaidoso. Foi realmente um gosto ler estas linhas. Venham mais deste naipe especialmente nesta altura de treguas futebulisticas.
    Bem Haja
    276mqj

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  5. blue boy, parabéns pela entrevista, é incrível a forma simples como podemos tirar lições tão importantes se nos limitarmos a escutar o que as gerações anteriores nos tem para dizer...
    e ao Américo, se me está a ouvir, ele que foi um ídolo de infância do meu pai, que continue a ter a integridade que demonstra. é um exemplo para todos!

    Jorge (Porta19)

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  6. Nunca vi jogar este Campeão, este enormíssimo guarda redes que foi campeão pelo nosso clube em 59 e vencedor da taça em 68. Nunca o vi jogar porque ele abandonou a carreira 5 anos antes de eu ter nascido:)

    O que sei sobre ele é o que se lê nos livros que preservo em minha casa. E o que escreve sobre ele é uma história bonita no clube do nosso coração numa altura em que era mt complicado vencer longe da Capital. Era um pouco mais complicado, pq continua a ser hj em dia...

    Parabéns ao Blue Boy. O carácter de pessoas como Américo é o que espero ainda haja no plantel do FC Porto. É essa mística que não se pode perder e que ajudou a moldar o FC Porto como o maior clube Nacional.

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  7. Uau!

    Belo furo jornalístico, numa entrevista que se lê de um só fôlego. Grande Américo, homem com H grande, estereotipo do jogador qe hoje já está em vias de extinção. Um daqueles que faz parte do imaginário dos adeptos.

    Parabéns a ambos pelo belo momento!

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  8. FANTÁSTICO! MUITOS PARABENS BLUE BOY.

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  9. Que entrevista fabulosa!

    Nunca o vi jogar, mas pelo que o meu Pai me conta, era um guarda-redes espectacular!

    A humildade e os pés bem assentes na terra, deveriam servir de exemplo a alguns profissionais de hoje em dia, que vivem num mundo de "show off" absolutamente rídiculo.

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  10. Eu devo estar a ficar completamente FANÁTICO ...Adorei esta Entrevista!
    Grande AMÉRICO vitima do salazarismo (até com entorses jogavam!...)

    Recentemente com o golfista Coelho, (antes da VERGONHOSA CENA BAÌA)defesa/árbitro"que nos anos 60 bastava levantar a mão, por não ter pernas, para q os "lineres" assinalassem off-sides a favor do clube o REGIME, qualquer "Luis Carlos" pintado de encornado era convocado.

    Estas entrevistas servem para que não esqueçamos esse antigo glorioso clube Salazarista hoje "Asqueroso" e invejoso mas salazarista na mesma!

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  11. Grande guarda redes, quando me recordo do Américo, vejo-o a voar ao mesmo nível da barra e a sapatear uma bola para canto...Foi nas Antas, não sei em que ano, mas está cá dentro, inesquecível!
    E é uma pessoa com uma enorme simplicidade.
    Cinco estrelas, a juntar àquela estrela que figura com o seu nome na área do Dragãozinho...E esta foto a cores de 1968...Bernardo da Velha, Atraca, Rolando, Pavão, Valdemar e Américo, Jaime, Djalma, Custódio Pinto, Gomes(?) e Nóbrega...

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  12. Excelente entrevista e excelente post a recordar um grande jogador da nossa história.
    Espero que voltem a repetir brevemente.

    Abraço

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  13. Viva !

    Eu que vi jogar Américo só posso escrever o seguinte :

    Blue Boy : "Chapeau Bas, Monsieur" !

    Muito Obrigado e Obrigadão pelas suas palavras Américo !

    Acho que é uma entrevista muito pedagógica para os jovens. E também bem respeitadora das regras de deontologia.

    Para os mais novos : Festas, defesa lateral do Porto, só será chamado no jogo para o terceiro ou quarto lugar perante a extinta urss.

    A Selecção que se viu em Inglaterra
    foi uma selecção de clubes Lisboetas. O grande êxito dos ditos Magritos ( ou Magriços ? )foi terem partido uma perna a Pelé.

    Desde então, corre o mito, no mundo inteiro, que os jogadores Portugueses são caceteiros.

    Verdade ou não ?

    Não foi Fernando Pessoa que escreveu que o mito é o nada que é tudo ?

    Para mim, o campeonato do mundo de 1966 ilustrou o centralismo levado até ao absurdo. Felizmente que hoje há a blogesfera !

    Se me permitem e, saindo da entrevista :

    O treinador Italiano , da época, avançou a ideia que a Itália foi eliminada porque , como todos os Coreanos se parecem, os Coreanos utilizaram sósias / substitutos bem frescos fisicamente na segunda parte.

    Discurso paranóico !

    E é assim que o Futebol está morrer em Itália !

    Isto dito : Fica a memória do Porto !

    Não há rachado que corte a memória do Porto !

    E Viva o Porto !

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  14. Meireles não terá sido num Porto/Leixões a remate do Praia e na baliza do topo norte?

    Eu estava lá nesse jogo e lembro-me de uma defesa assim.

    Um abraço

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  15. Mais uma grande entrevista do blog .
    Só quando olhamos para o passado podemos ter fé no futuro .
    Nunca o vi jogar, porque nasci na década de 70,ouvia falar no Américo mas depois de ler esta magnifica entrevista fiquei com a melhor das impressões . Um homem frontal e directo ,sem papas na língua . E pelo que me contam também era assim na baliza .

    Meu caro Amigo BluE Boy muitos parabéns por mais uma grande entrevista !!!!

    Abraço

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  16. Não sei dizer Vila Pouca, mas ficou-me na retina para nunca mais desaparecer...Estava no velhinho peão -12 Escudos- e ele à minha esquerda, portanto baliza Sul. Lembro-me também do Guarda-Redes do Varzim, Benje, perna torta e muita negritude...Se calhar foram várias dessas defesas, eu lembro-me sempre de o ver voar e era um jogador não muito alto, não muito alto e bastante entroncado.


    -Mais uma vitória, em Huelva, com Hulk em destaque e com o "F.d.P" -Fiat.de.Punto- do árbitro a deixar dar no pau só para um dos lados, tasssssss que raio os parta!...Ficou bem patente hoje, Falcao é mais mexido que Farias e só não deu mais resultado, porque o Raul estava sem pernas na ponta final do jogo.Valeri -em 5 minutos- fez uma revienga a um Francês de lhe trocar os olhos por completo...
    Sem espinhas.

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  17. Os dois Guarda-Redes que actuaram em 1966 eram menores, Carvalho era forte fisicamente e José Pereira era mais fraquinho...Aliás, foi ele que ofereceu as meias-finais à Inglaterra, defendeu sem grande convicção um remate de longe, permitindo a recarga vitoriosa...Américo merecia ter jogado, Festas jogou na fase final e Custódio Pinto estava tapado pela linha média do Benfica, mais Jaime Graça e pela vontade do Otto Glória de formar um bloco coeso, composto por toda a linha média e avançada do Benfas...Jaime Graça, na época seguinte, já fez parte da equipa Lisboeta.
    Na baliza José Pereira -do Belenenses- Morais e Hilário -do Sporting- nas laterais, Alexandre Baptista -Sporting- e Vicente-Belenenses- no eixo da defesa...
    Jaime Graça -do Setúbal- e Coluna -do Benfica...
    José Augusto, Torres, Eusébio e Simões -do Benfica...
    Festas, entrou como disse, na parte final, penso que por lesão do Morais, senão...

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  18. Muito bom!! Os meus parabéns! É por estas e por outras que este blog está no top das minhas preferências. Um grande abraço!

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  19. Excelente post, excelente entrevista. Parabéns e obrigado por este bonito pedacinho da história gloriosa do nosso FC Porto.
    Américo foi o meu ídolo nos tempos de criança. Por causa dele rasguei muitos calções e... os joelhos também - as marcas perduram - pois eu ia para a baliza para o "copiar".
    Américo é uma grande e inesquecível figura do FC Porto. Américo é uma glória do Clube.
    Já o disse muitas vezes: se não fosse Vítor Baía, elegia-o como melhor guarda-redes de todos os tempos no FC Porto.

    Fernando Moreira - V. Real

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  20. Grande entrevista ao meu ídolo de sempre, Americo, um guarde redes fabuloso.
    Vi muitos jogos com ele, obrigado Blue pela entrevista.
    Só agora comento pois estive fora estes dias todos e sem computador.

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  21. Um muito obrigado por este momento de leitura magica. Amééériicoo, o punhos de aço, que ganda guarda redes pà,ao ler esta entrevista deparei comigo na porta do peao norte,angustiado,nao fosse o porteiro a repetir "outra vez pà,este senhor nao é o teu pai pà" mas depois de entrar dava o meu saltinho para o tribunal porque era ali,é que os jogadores salvavam os adeptos, em caso de falta deles, os assobios eram estrondosos. Foi aquele palco magnifico das ANTAS queme faz recordar sei la, M.Antonio,Valdir,Djalma,Flavio,Amaury,C.Pinto,Ivan,Lemos enquanto miudo sò gostava das camisolas e daqueles que marcassem muitos golos. Ganda Porto

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