18 agosto, 2009

Um silêncio sepulcral no pavilhão da Luz...

Confessou-me, há uns anos atrás, um meu familiar, fã de hóquei em patins, e benfiquista, hoje em dia, pouco entusiasta, que uma das derrotas mais amargas de que tem memória foi a da final da Taça dos Vencedores das Taças da época 1982/83 em hóquei em patins, quando o Benfica perdeu em pleno pavilhão da Luz a possibilidade de conquistar o seu primeiro troféu europeu da modalidade (8 anos depois os encarnados ganhariam a taça Cers, sendo até hoje a sua única conquista internacional no hóquei em patins).

Curiosamente, essa amargura toda também se deverá, por certo, ao facto de, nessa final da taça das taças, o Benfica ter como opositor o FC Porto, vencedor da edição do ano anterior quando os Dragões se estrearam em absoluto como vencedores de uma competição nesta modalidade (final da edição 81/82 ganha pelo FC Porto ao Sporting, com uma histórica goleada de 13-4 nas Antas, com 9 golos de Vítor Hugo, título já recordado por mim, aqui).

O FC Porto, treinado por Vladimiro Brandão, iniciava a época 82/83 à procura do seu 1º título no campeonato (acabou por o conseguir) confiante na valia do seu plantel mas também tinha noção da grande qualidade de Sporting e Benfica, sendo que os encarnados nesta temporada contavam até com Cristiano Pereira (as duas fotos anexas são relativas à época 83/84 quando Cristiano já havia regressado ao FC Porto, clube do seu coração), no entanto, os Dragões possuíam, de facto, uma jovem e valiosa equipa que iria dominar o hóquei nacional na década seguinte. Domingos, Alves, Fanã, Vítor Hugo e Vítor Bruno constituíam o cinco base, com o plantel a compor-se ainda dos nomes de António Vale (cap.), David Reis, Rui Coelho e Castro.

Na Taça das Taças desse ano o FC Porto desembaraçou-se facilmente dos Suíços do Vevey (9-3 em casa e 5-1 fora) mas nas meias finais frente ao poderoso Liceo da Corunha (Espanha) os Dragões perderam a 1ª mão fora por 5-4 e viram-se obrigados a dar a volta em casa, o que conseguiram, após uma bela exibição e uma clara vitória por 6-2.

Encontravam-se assim na final, o F.C.Porto pelo segundo ano consecutivo, depois de ter conquistado o seu primeiro troféu no ano anterior, e o Benfica tricampeão Nacional de 1979 a 1981, tendo perdido por 1 ponto para o Sporting o título da época anterior (1981/82).

Depois do 2-2 no pavilhão das Antas na primeira-mão, os encarnados pensavam que tinham tudo para conquistar o troféu. Nesse jogo nas Antas o ambiente era irrespirável mas a baliza do Benfica parecia abençoada e no final a injustiça do empate deixou os Portistas algo apreensivos para a 2ª mão, a jogar em ambiente adverso. Mas a felicidade com que os Benfiquistas ouviram o apito final do árbitro também demonstrava o respeito pela valiosa equipa da Cidade Invicta.

Na 2ª mão num sábado à noite, com o antigo pavilhão da Luz a rebentar pelas costuras, e com transmissão televisiva pelo canal 2 da RTP, o Benfica entrou de rompante, e já na segunda parte chegou aos 4-1 (Vítor Hugo chegou a reduzir para 3-1), parecendo ter ao triunfo na mão. O ambiente era de festa total, com os Benfiquistas a exultarem e a darem já a vitória na competição como certa, mas a verdade é que o F.C.Porto de forma fria e cruel foi reduzindo distâncias com Vítor Hugo a fazer o 4-2 e Fanã o 4-3. Quando o capitão Vale fez o empate a quatro golos já nos últimos segundos do tempo regulamentar fez-se um silêncio sepulcral na Luz, o mesmo silêncio a que se habituaram nos anos seguintes não só no hóquei, mas principalmente no futebol, onde receber o FC Porto para essa gente, é como todos sabemos, actualmente, uma grande dor de cabeça... De rostos fechados os Benfiquistas nem queriam acreditar no que estava a acontecer...

Seguiu-se o prolongamento, com o F.C.Porto, compreensivelmente, a procurar surpreender, apenas, em contra-ataque. O Benfica chegou aos 5-4 mas logo de seguida o genial Vítor Hugo voltou a empatar a 5 golos para desespero do público da casa... Não houve mais golos e tudo se decidiria no desempate por grandes penalidades.

Não havia forma de se apurar o vencedor, uma vez que os guarda redes defendiam tudo mas, na última penalidade quando Vítor Bruno acariciava a bola antes do remate fatal sentiu-se o pior nas bancadas da Luz. Os rostos de desespero, o suor bem explícito nas faces dos adeptos encarnados faziam antever uma tragédia. Vítor Bruno olhou para as bancadas e sorriu apreciando todo aquele drama... Levantou o stick, cheio de convicção, e de forma decidida atirou a contar!!! Foi como se uma bomba tivesse explodido naquele pavilhão!!!

O FC Porto arrecadou a Taça das Taças pelo 2º ano consecutivo (ganhando por 5-6 esse jogo) perante um silêncio absoluto e muitas lágrimas de quem já tinha dado a vitória por garantida. Os jogadores Portistas festejaram exuberantemente em pleno pavilhão da Luz e no regresso à Invicta "uma pequena multidão" vitoriou a equipa que acabara de ganhar a sua 2ª taça Europeia em 2 anos consecutivos...

Uma equipa verdadeiramente fantástica onde já se notava claramente o génio de Vítor Hugo, ele que foi verdadeiramente decisivo noutra vitória dramática dessa temporada (82/83) quando o FC Porto ganhou a final da taça de Portugal ao Benfica (outra vez!) ganhando em casa por 8-3 e perdendo na Luz por 7-4 (final que o amigo Ricardo Vara recordou aqui).

Ainda nesta memorável época o FC Porto haveria de ganhar o seu 1º campeonato Nacional fazendo o pleno de vitórias, campeonato, taça de Portugal e taça das taças! Relativamente ao campeonato de salientar que este de 82/83 foi o 1º de 5 consecutivos sempre com festa azul e branca!!! Espero que tenham gostado de mais esta viagem ao passado em mais um capítulo de ouro da nossa brilhante história. Um agradecimento especial ao Vítor Hugo e ao leitor Armando Pinto que me facultaram algumas informações de que necessitei para a elaboração desta crónica.

Um abraço do Lucho.

14 comentários:

  1. Caro Lucho, recordo-me perfeitamente dessa conquista muito bem retratada, mas onde falta um pormenor importante: quando da entrega da Taça chuveram cadeiras e os jogadores do F.C.Porto na saída para o balneário levaram com tudo que estava à mão...foi o início da nossa superioridade, mal aceite, que viria ter continuação com consequências mais graves, quando das agressões à equipa no autocarro que só não causaram a morte de Filipe santos por acaso.

    Um abraço

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  2. Que post maravilhoso! :)

    Em 1983 tinha apenas 2 anos, por isso não tenho qualquer recordação deste jogo. :)

    No entanto, ao ler este post, senti-me como se estivesse no pavilhão a assistir a esta bela conquista da nossa querida secção de hóquei em patins.

    Obrigado Lucho, por nos trazeres estas fantásticas viagens ao passado glorioso do nosso FC Porto!

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  3. Carlos Costa18 agosto, 2009

    Muito bem. Simplesmente a "ajuda" do outro blog, de R. Vara, desajudou, porque, segundo já li noutro sítio, o hóquei do Porto começou muitos anos antes.

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  4. Clap clap para o Lucho! Mais uma notável crónica!

    Vítor Hugo, mas que grande jogador, um Dragão eterno, daqueles que ficam na memória de todos nós!

    Quanto à tão importante conquista, desconhecia, e por isso é tão bom ir acompanhando as tuas crónicas por aqui, conhecer a fundo a história do FC Porto.

    O apontamento do Vila Pouca também é "priceless"! Com que então, já na altura os galináceos treinavam o desporto que sabem melhor o "atira a cadeira" :) enfim! ele continuam a ladrar e nós a passar ;)

    Saudações

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  5. É óptimo ler estas histórias!
    Meu Deus imagino a satisfação dos portistas...épico!
    A mística azul e branca tem destas coisas =)

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  6. Dois jogos de suspensão para Hulk

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  7. Obrigado pelas vossas palavras, Vila Pouca (desconhecia essa situação q falaste mas não me admira), sevilha03, Carlos Costa, Dragon Soul e orgulho azulebranco.

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  8. Grande post Lucho... Momentos para ficar para sempre na nossa memória..

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  9. Belíssima evocação, Lucho!!!

    Soberba epopeia essa, que conhecia já, apesar das memórias esbatidas pelo tempo.

    Adorava rever o jogo final, na Luz. A emoção, o nervosismo, o final com enorme suspense e o drama dos penaltys.

    Caramba, assim se construiu este nosso clube. Com vitórias épicas!

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  10. hoje é dia de votação do melhor em campo,não é?

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  11. Uiii... medo... o "João pode ser", que arbitrou o particular dos galináceos contra o ac milan, vai arbitrar o FC Porto-Nacional! Aí está mais uma bela nomeação, quem irá ser expulso desta vez?!

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  12. Excelente crónica do enorme Lucho. Ninguém arranja esses jogos que nos deram importantes títulos internacionais?

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  13. Seria fantástico alguém arranjar imagens destes jogos!

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  14. adorei ler sobre o hóquei neste país,pois embora seja das poucas modalidades que nos dá alegrias, pouco se fala. F.C.Porto grande clube.a minha família adora este CLUBE excepto a minha mãe que é do Académico de Coimbra. por favor fale de Domingos Carvalho que também contribuiu e muito para as grande vitórias do Hóquei Portista, principalmente os golos em Itália na Taça das Taças.obrigada e continue.

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