Foi você que pediu um calcanhar colombiano?

assistência: 37.609 espectadores.

árbitros: Nicola Rizzoli (Itália), Cristiano Copelli e Renato Faverani; Daniele Orsato.

FC PORTO: Helton; Fucile, Rolando, Bruno Alves «cap» e Alvaro Pereira; Belluschi, Tomás Costa e Raul Meireles; Mariano, Falcao e Hulk.
Substituições: Tomás Costa por Guarín (67m), Falcão por Farías (88m) e Mariano por Valeri (90m).
Não utilizados: Beto, Maicon, Sapunaru e Dias.
Treinador: Jesualdo Ferreira.

ATLÉTICO MADRID: Roberto; Ujfalusi, Pablo Ibañez, Juanito e Perea; Paulo Assunção; Jurado, Cleber Santana, e Simão; Forlán e Aguero.
Substituições: Roberto por De Gea (25m), Simão por Maxi Rodriguez (70m) e Jurado por Reyes (79m).
Não utilizados: Antonio López, Pongolle, Ruben Pérez e Sergio Rodríguez .
Treinador: Abel Resino.

disciplina: cartão amarelo a Paulo Assunção (36m) e Perea (48m).

golos: Falcão (75m) e Rolando (81m).

“Onde é que eu já vi isto?”, exclamarão alguns, quando os colchoneros subirem ao relvado. Este grupo em que o Porto se encontra inserido, na Champions, parece ter sido arranjado de propósito, para ajustes de contas pendentes.

Primeiro foi o Chelsea, velho conhecido dos tempos de Mourinho, em que as visitas a Londres nos deixavam, tal como agora, um travo amargo de desilusão. Agora, depois de um confronto titânico na temporada passada, numa célebre reedição do “mata-mata”, novamente pela frente a segunda equipa de Madrid.

Dizer-lhes isto – a 2ª equipa de Madrid – é ferir-lhes o orgulho. Alfinetar-lhes a honra. O Atlético tem-se na conta de uma equipa altiva, digna e honrada. Gosto deles, desde os saudosos tempos das gincanas efectuadas por Paulo Futre, incendiando de loucura as bancadas do decrépito estádio madrileno. Gabo-lhes a resistência fiel da massa adepta, verdadeiramente canina na sua devoção às cores amadas.

Mas, desde que aquela relva começou a ser pisada por dois espécimes abomináveis, confesso que comecei a desejar mal aos homens das camisolas listadas. Simão, primeiro, e o renegado Assunção, depois, colocam-me a bílis bem junto da boca, num enraizado ódio que vegeto a esses dois pseudo-profissionais da bola.

Por isso, mais do que o aspecto meramente desportivo, estes embates com o Atlético revestem-se de desusada importância. Quero vencer. Gritar de alegria. Festejar desvairadamente. E, ao fazê-lo, assistir ao semblante carregado de frustração do duo referido.

Champions é champions. Competição única, com magia própria. Jogos intensos, carregados de pedaços de dramatismo. Antes da subida ao relvado, o que é o imenso tabuleiro verde, transformado numa arena gigantesca de xadrez, nos poderia trazer?

Do lado dos da casa, uma incógnita. A ausência de Fernando, após a expulsão em terras de Sua Majestade, colocando um verdadeiro problema a Jesualdo. A isso, acrescia as já conhecidas ausências de Varela e Rodriguez (logo ele, hoje em dia de aniversário), encolhendo drasticamente o rol de opções do treinador portista.

O adversário aterra na Invicta debaixo de fogo intenso, quer por parte da sempre exigente imprensa desportiva do País vizinho, mas sobretudo por parte de esperançosos adeptos que não perdoam o facto de, uma equipa recheada de estrelas, ainda não ter vencido em 5 jornadas da liga espanhola.

Jogo fácil em perspectiva, para os Dragões? Não, obviamente.

Basta a menção do nome de Forlan e Aguero para colocar uma nota de ansiedade no embate. E, posto isto, vamos ao que interessa. A bola a rolar.

19.45. Hora do encantamento. É sempre essa a hora de partida, para uma jornada de sonhos ou, em alternativa, de amargura em doses industriais.

Os azuis e brancos no esquema táctico habitual, apresentado no clássico do fim-de-semana passado. Hulk e Mariano nos extremos, com Falcao solitário lá na frente, procurando uma nesga para marcar. Tridente do meio-campo composto por Meireles, permanecendo de pedra e cal na função, pese o mau momento de forma que atravessa, Belluschi e o compatriota Tomas Costa, disposto a fazer esquecer, durante 90 minutos, o trabalho de sapa de Fernando.

E assim se iniciaram as hostilidades. O Porto, jogando em casa, desde logo iniciando o jogo ao ataque. Cedo se percebeu que, tal como frente aos leões, os trabalhos de casa tinham sido feitos. Com uma dupla de centrais forte pela frente, formada por dois internacionais espanhóis – Juanito e Pablo Ibanez – os Dragões optaram pelas alas, entregues a Ufjalusi [direita] e Perea [esquerda], colombiano polivalente, capaz de assegurar a função no centro e na direita da defesa. Optaram pelas alas, no plural, é um eufemismo. Os azuis e brancos viveram, ao longo da primeira metade, literalmente coxos, só existindo, a nível de ataque, o flanco direito, quase sempre dinamizado por Hulk e Belluschi.

Foi por aí que se criaram os únicos embaraços a uma aparentemente sólida equipa espanhola. A velocidade e repentismo do brasileiro com nome de super-herói permitiram, esporadicamente, o aparecimento de alguns lances de perigo, junto da baliza adversária. O Porto, mesmo vivendo órfão de um organizador de jogo, lutava com as armas disponíveis. Com uma anormal taxa de passes falhados, as transições portistas eram sempre feitas da mesma forma: bola em Belluschi e este a procurar avidamente Hulk, para lhe endossar o esférico.

Se o Porto atacava pouco, mal e com manifesta falta de gente [contam-se pelos dedos de uma mão as subidas no terreno dos laterais, com destaque negativo para Alvaro Pereira], no plano defensivo as coisas também não corriam de feição.

O meio-campo, incapaz de uma pressão agressiva, deixava os médios espanhóis, com destaque para Cleber Santana e Jurado, totalmente à vontade para municiarem os velozes e perigosos avançados – Forlan e Aguero. Era um Atlético que fugia dos dogmas habituais. Abdicando de dois extremos puros e do habitual 4-4-2, por um mais comedido 4-1-3-2, com o meio-campo contando com o habitual trabalho de sapa de Assunção, espécie de guarda-costas do trio que o precedia – Jurado, Santana e Simão.

A ausência de Fernando, quase de certeza, passou pela cabeça de todos os presentes no estádio, vendo um esforçado mas inconsequente Tomas Costa a [não] fazer o papel do jovem trinco.

Assim se viveram 45 minutos, quase inócuos, de parte a parte. Destaque apenas para a defesa de recurso de Helton, após um disparate de T.Costa ter isolado Aguero, e para o golo invalidado a Mariano, numa das poucas vezes em que o Porto optou por jogar… pelo centro.

A segunda metade ameaçava ser uma cópia fiel da primeira. Uma confrangedora nulidade. Um Porto sem expressão atacante, continuando a viver de espasmódicos episódios, com Hulk enredando-se em excessos de individualismo, e um Atlético amorfo, vivendo contente com o que lhe saia em rifa. Pareceu, por momentos, que os azuis e brancos se perderiam, enredados nos próprios receios. Helton ia-se opondo com sucesso e classe às investidas contrárias. Até que…

Jesualdo mexeu na equipa. Saiu um pouco inspirado Tomas Costa, entrou Guarin, descendo Meireles para funções mais defensivas. As melhoras foram significativas. Maior capacidade de choque, superior clarividência no ataque, uma capacidade de pressão até então desconhecida. O campo inclinou-se, com os lances de perigo [finalmente] a sucederem-se junto da baliza do neófito Gera.

A 15m minutos do final, a cereja no topo do bolo. E que bolo tão adocicado, permitindo, por momentos, viajar no tempo até a uma noite de Maio, ano de 1987, na cosmopolita Viena. Se lá, frente aos bávaros do Bayern, um argelino tinha colocado o Mundo inteiro de boca aberta de espanto, o Dragão pode também ficar estupefacto, quando um colombiano de cabelo comprido imitou o mágico. Momento sublime, com Falcao correspondendo com enorme classe a uma assistência de Hulk.

Finalmente, o Porto passava para a frente no marcador. Daí até final, só deu mesmo azul e branco. Falcao podia ter bisado, num magnífico centro de Hulk, com a cabeçada correspondente a fazer brilhar o guarda-redes contrário. Mas foi Rolando a sentenciar um jogo que, durante longo tempo, pareceu muito longe de poder ser ganho.

Melhor do Porto: Hulk. O único, na 1ª metade, a conseguir esticar o jogo, criando calafrios na defesa oposta. Na 2ª parte ligou, a espaços, o “complicador”, nas já habituais e inócuas iniciativas individuais. Recompôs-se a tempo, após a entrada de Guarin, para terminar em grande. Assistência para o golo inaugural e um cruzamento magnífico, para nova oportunidade soberana.

Helton, com uma série de intervenções seguras, denotando grande tranquilidade, Fucile, enorme no plano defensivo, não permitindo qualquer veleidade a Aguero, Forlan ou Simão, e Belluschi, preciso no passe e com notável espírito de entreajuda, completam o poker de jogadores mais destacados.

Arbitragem: Sem grandes problemas, no capitulo disciplinar, cometeu um pecadilho, ao validar a indicação do seu fiscal de linha, impedindo que Meireles marcasse, no final do primeiro tempo, quando se encontrava totalmente isolado. As imagens são elucidativas, com o médio portista a furtar-se de forma exemplar aos defesas contrários, dentro da legalidade.

Nota: E, como num passe de mágica, os Dragões têm o passaporte para os oitavos na mão. Se matematicamente nada ficará decidido na próxima jornada, vitórias do Porto e Chelsea colocarão ambos os clubes numa situação de anormal desafogo. Nesse cenário, os pupilos de Jesualdo ficarão com 5 pontos de avanço, a 3 jornadas do final.