Corados de vergonha

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assistência: --- espectadores.

árbitros: João Ferreira (AF Setúbal), Luís Ramos e Nuno Roque; João Capela.

SPORTING: Rui Patrício; Abel, Tonel, Daniel Carriço e Grimi; Pedro Mendes, Izmailov, Miguel Veloso e João Moutinho; Yannick e Liedson.
Substituições: Daniel Carriço por Polga (74m), Miguel Veloso por Adrien (77m) e Izmailov por João Pereira (90m).
Não utilizados: Tiago, Saleiro, Matías Fernández e Pereirinha.
Treinador: Carlos Carvalhal.

FC PORTO: Helton; Fucile, Rolando, Bruno Alves e Alvaro Pereira; Tomás Costa, Raul Meireles e Ruben Micael; Varela, Falcao e Mariano.
Substituições: Raul Meireles por Belluschi (46m), Mariano por Rodriguez (57m) e Ruben Micael por Guarín (57m).
Não utilizados: Nuno, Valeri, Nuno André Coelho e Miguel Lopes.
Treinador: Jesualdo Ferreira.

golos: Yannick (6m), Izmailov (45m) e Miguel Veloso (47m).

disciplina: cartão amarelo para Miguel Veloso (12m), João Moutinho (16m), Bruno Alves (17m), Yannick (30m) Belluschi (73m), Helton (76m), Izmailov (77m), Liedson (78m) e Alvaro Pereira (90m).

E pronto. Como dizem os franceses, na sua musical língua, “c’est fini”. Acabou, e em grande. Entenda-se o grande como o modo que melhor caracteriza o descalabro a que se assistiu, no relvado leonino. A posição portista, depois da perda dos dois pontos em Matosinhos, era periclitante. Os azuis e brancos estavam obrigados a vencer todos os seus jogos, esperando pacientemente por benesses alheias, para que o duo que o precede perdesse a vantagem da independência.

Por momentos, ainda vivemos nas asas do sonho. A vitória frente ao Arsenal insuflou o ego de confiança. E essa, qual combustível necessário para façanhas homéricas, deu efeitos imediatos. Que o diga o Braga, seviciado em pleno Estádio do Dragão, com um correctivo inesquecível, aquecendo de esperança os corações dos apaniguados portistas.

E assim, antes de o rolar da bola em mais um clássico, as cartas estavam na mesa. Aquele palco, transformado em hora e meia num ringue onde a batalha a travar não teria tréguas, tinha dois contendores com estados de espírito bem diferentes. Do lado dos da casa, trajando de verde e branco, um pugilista repleto de nódoas, tantas têem sido as batalhas perdidas. Alguém à procura de uma dose cavalar de ousadia, ainda hesitante e inseguro, temendo represálias do outro lado. E quem estava do outro lado?

Nós. Fortes, Ancorados em quatro campeonatos vencidos de forma consecutiva. Conscientes do nosso valor. Poderosos animicamente. Que raio, tínhamos dado 5 “áqueles gajos”. Haverá melhor separador de águas do que esse peso no subconsciente leonino? Terem sido enxovalhados na Invicta?

Alguns ainda poderão tartamudear que os comandados de Carvalhal, sôfregos, estavam pujantes depois de despachar o Everton. Mas nem isso poderia, de nenhuma forma, retirar o favoritismo aos Dragões.

Felizmente, quando escrevo, faço-o adoptando as novas tecnologias. Computador ligado, página em branco do Word aberta, e pensamentos e sentimentos desnudados, de forma febril Escrevesse eu à antiga, numa daquelas máquinas de escrever manuais, e já várias folhas se amontoariam, no chão, rasgadas pela frustração.

Existem derrotas que doem. Esta não é, por incrível que pareça, uma dessas. O que a torna singular. Com ela, perdemos qualquer possibilidade de vencer a prova máxima do futebol português. Com ela, aliás, vegetaremos até final num modesto e impensável terceiro lugar, longe dos holofotes da Liga dos Campeões, nossos velhos conhecidos. E mesmo assim não me dói. Pareço anestesiado. Mas recordo, depois de matutar seriamente neste assunto, que isto é algo pior que a frustração. É conformismo.

O jogo provou várias coisas. A primeira é que eles quiseram vencer. Nós, nem por isso. A segunda coisa comprovada é que Carvalhal, causticado violentamente nas últimas semanas, não perdeu o tino. Estudou o adversário. Provavelmente, de forma obsessiva. Sabia que o perigo portista vinha de vários lados. E secou-os, de forma exemplar.

1. Se Varela e Mariano – mais o 1º do que o 2º - são autênticos inimigos públicos das defesas contrárias, o treinador leonino sopesou as suas opções para a partida. Terá sido tentado a recuar Miguel Veloso para o lado esquerdo da defesa, procurando eliminar as ameaças de Fucile e Mariano. Optou por outra, que não lhe roubaria o talento, a capacidade táctica e o remate pronto do médio sportinguista. Deu a titularidade a Grimi, verdadeiro sinónimo de permeabilidade, mas agrilhoou o jogo do opositor, com as instruções conferidas a Miguel Veloso. Este, desde cedo, tornou-se uma espécie de anjo da guarda do lateral leonino, cerceando qualquer iniciativa atacante pelo lado direito. No flanco oposto, mais do mesmo. A explosividade de Varela não encontrava o seu aliado tradicional. Espaço. Sem ele, o extremo portista sufocava, pela impiedosa marcação de que era alvo.

2. Com os extremos estrangulados, o perigo azul e branco só poderia vir de Ruben Micael, o novo maestro do ataque do campeão. Para isso, a vantagem numérica, na zona do meio-campo, começou a dificultar a tarefa portista. A combatividade e agressividade leoninas colocaram em sentido o triângulo de Jesualdo. Sem o seu habitual pêndulo, lesionado, o controlo do jogo esvaiu-se, desde cedo. Meireles e Tomas Costa viam-se sistematicamente ultrapassados pela velocidade imprimida nas transições defesa-ataque, por parte do Sporting. As marcações, estilhaçadas pela mobilidade dos médios leoninos, permitiam ofensivas rápidas, ora por Izmailov, na direita, ou por Djaló, na esquerda.

E assim, de forma submissa, foi-se assistindo ao impensável. À construção de um resultado pesado, humilhante e inteiramente justo. Uma equipa sempre à deriva, incapaz de assumir as despesas do jogo, de lutar indomitamente. Simplesmente, incapaz de reagir. E era tão pouco o que se pedia.

A defesa, intranquila, perdia segundas bolas, aliviava de forma nervosa, agia por impulsos. Mais vitimas do que réus, perante a avalancha de futebol que lhe aparecia pela frente, Bruno Alves e Cª estiveram irreconhecíveis. Se o golo madrugador apenas auxiliou a intranquilidade, o golpe fatal do destino desenhou-se à beira do intervalo. O segundo golo, antes de um retemperador hiato, sentenciou o inevitável. A derrota. À imagem do técnico, incapaz de reagir, a segunda metade escarneceu dos vãos intentos. Novo golo madrugador, amputando uma previsível reacção, e o mesmo de sempre. As substituições sem qualquer essência. Como se efectuadas de forma mecânica, utilizando os conhecimentos adquiridos em manuais empoeirados.

Pouco mais haverá a escrever. É, espero, o fim de um ciclo. Com tempo para preparar outro. Acomodados, não vimos os sinais de perigo. Deixamos que os outros se fortalecessem. Continuou-se a contratar, sem critério, deixando nas mãos de um técnico pouco dado a rasgos de brilhantismo um plantel desequilibrado. E assim, só nos resta engolir o orgulho e passar por um momento de verdadeira tormenta. Assistir à festa dos outros.

Análise final: Falta dizer alguma coisa? Penso que não. Eles correram mais do que nós. E venceram. Bem.

Melhor do Porto: Os adeptos. Todos aqueles que enfrentaram a intempérie que se tem abatido sobre o País, calcorreando centenas de quilómetros, gastando preciosos euros, com provável influência no orçamento familiar, para dar apoio. Para gritar o orgulho de ser portista. A esses bravos junta-se uma imensa maioria, sofrendo em casa, sentindo a alma dilacerada. Mas todos sabendo que perdemos uma batalha. Perdemos igualmente a guerra. Mas não perdemos a identidade. Aquilo que somos. E somos bem mais do que aquilo que foi mostrado dentro do campo.

Arbitragem: Sei quem é o João “pode ser” Ferreira. Mais do que o árbitro predilecto do Orelhas, ele é um juiz competente. E digo-o sem ponta de ironia. A sua presença, hoje, em Alvalade, constituiu apenas mais um atentado à credibilidade do futebol português. Culpa dele? Evidentemente que não. Envolvido na polémica do túnel, tendo sido o seu relatório a base usada no castigo aplicado a Sapunaru e Hulk (e, em abono da verdade, João Ferreira apenas escreveu o que viu), o juiz deveria ter sido protegido, evitando repercussões de erros que acontecessem no clássico. Pisando uma panela de pressão, o juiz safou-se. Com nota positiva. Conseguiu cercear a agressividade dos jogadores leoninos, pródigos em entradas duras. Ajuizou quase sempre bem, cometendo apenas alguns pecadilhos em questões secundárias. Não foi por ele que perdemos.